25 agosto 2023

BRICS: ampliação e vantagens

O que ganham os países que entram para o BRICS

O BRICS se beneficia da ampliação de sua influência com Arábia, Argentina, Egito, Emirados Etiópia e Irã. Mas, quem ganha na loteria são os países que entram.
Cezar Xavier/Vermelho


 

Até 40 países cogitaram ou solicitaram adesão ao BRICS, o grupo que articula relações entre Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. No entanto, seis afortunados foram aceitos e serão membros plenos a partir de 1o. de janeiro de 2024. O anúncio ocorreu nesta quinta-feira (24), quando acaba a cúpula que ocorre em Joanesburgo, África do Sul. A adesão dos novos membros foi oficializada na Declaração de Joanesburgo, documento acordado entre os atuais integrantes do Brics

A costura do entendimento em torno de Arábia Saudita, Argentina, Egito, Emirados Árabes Unidos Etiópia e Irã, passou por uma distribuição geográfica dos novos países membros e teve um cunho essencialmente político.

Cada um desses países tem seus motivos para entrar no bloco, assim como vai se beneficiar disso. Embora haja uma predominância de nações de cultura árabe-islâmica, situados no hemisfério oriental do globo, o Brasil conseguiu colocar a Argentina na lista para contrabalançar. O fato é que tudo contribui para desagradar Washington, pois o BRICS também ganha influência e força para reduzir a força do dólar.

Veja abaixo o perfil de cada país que entra no bloco, incluindo a Indonésia, que recebeu o convite, mas adiou a entrada por motivos políticos:

Arábia Saudita

A adição ao BRICS da Arábia Saudita, um dos principais produtores de petróleo do mundo, acrescentaria influência econômica ao grupo e aumentaria suas chances de se posicionar como rival da ordem financeira liderada pelos Estados Unidos.

A adesão ao BRICS parece uma escolha cada vez mais natural para a Arábia Saudita, que cultivou laços com a China e – apesar da sua relação de segurança estreita e de longa data com os Estados Unidos – demonstrou claramente a independência dos interesses americanos nos últimos anos.

No ano passado, a Arábia Saudita cortou a produção de petróleo justamente quando a administração Biden pensava ter garantido um aumento. Em fevereiro, restaurou as relações diplomáticas com o Irã – assinando o acordo em Pequim. E apesar da pressão americana para apoiar a Ucrânia na guerra com a Rússia, o reino, como outros países árabes, permaneceu firmemente neutro.

O país com mais de 32 milhões de habitantes, muitos dos quais jovens, procura diversificar uma economia quase inteiramente dependente do petróleo. Com isso, pode ser bom negócio se articular com o bloco.

A Arábia Saudita é o maior parceiro comercial do BRICS no Oriente Médio, com o comércio atingindo US$ 160 bilhões no ano passado.

Argentina

Com quase 46 milhões de pessoas, a Argentina tem a terceira maior economia da América Latina, depois do Brasil e do México. Seus apoiadores no BRICS incluem a Índia; Brasil, seu maior parceiro comercial; e China, com a qual mantém laços financeiros cada vez mais estreitos.

A Argentina tem um histórico de crises econômicas e está no meio de uma das piores. A sua moeda despencou; a inflação oscilou em torno de 113% nos últimos 12 meses; e quase 40% da população está empobrecida. O país também está lutando para pagar uma dívida de US$ 44 bi ao Fundo Monetário Internacional, dominado pelo G7.

O presidente Lula disse na terça-feira que apoiava a candidatura da Argentina, mencionando as lutas do país com a falta de reservas estrangeiras. O presidente da Argentina, Alberto Fernández, foi convidado para uma reunião virtual das nações do BRICS no ano passado.

“Os BRICS são, para o meu país, uma excelente alternativa de cooperação face a uma ordem mundial que tem funcionado em benefício de poucos”, escreveu à organização em maio de 2022.

Ele chamou o Novo Banco de Desenvolvimento, criado pelos BRICS e do qual a Argentina quer fazer parte, “a institucionalização de uma nova ordem mundial focada no desenvolvimento e longe da especulação financeira que causou tantos danos aos nossos países. ”

Emirados Árabes

As monarquias do Golfo, outrora indiscutivelmente alinhadas com os EUA, embora ainda fortemente dependentes das garantias de segurança dos EUA, procuram agora maior autonomia estratégica em relação a Washington. Assim como os sauditas, os emirados também compartilham desses anseios.

O país já foi admitido no Banco do BRICS em setembro de 2021. A redução da dependência da região das receitas do petróleo é um desafio crítico, apoiados pelo investimento americano e cada vez mais chinês. Apesar disso, os EAU são um ator econômico significativo na região do Golfo e orgulham-se de uma economia robusta baseada em petróleo e gás, mas também em finanças, comércio, turismo e logística.

O principal parceiro de exportação dos EAU, por exemplo, é a Índia; a China é a terceira. Os seus principais parceiros de importação são a China e a Índia. 

Os Emirados Árabes Unidos também têm ligações profundas com a Rússia. No início de dezembro de 2021, a Mubadala Investment Company (MDC) adquiriu participação na Sibur, a maior empresa petroquímica integrada da Rússia e investiu mais de US$ 3 bi na Rússia desde 2010. 

Exemplos notáveis de como os EAU forjam relações desalinhadas com os EUA incluem o recente restabelecimento das relações diplomáticas entre a Arábia Saudita e o Irã, e a decisão da Liga Árabe de restabelecer a Síria, graças principalmente a uma iniciativa patrocinada pela Arábia Saudita e pelos Emirados Árabes Unidos. 

É evidente que os Estados do Golfo estão hoje empenhados em manter boas relações com os seus vizinhos imediatos, mesmo que isso signifique abalar as alianças tradicionais.

Em termos geoestratégicos, a adesão ao BRICS constitui outra faceta da diversificação da política externa do país, através da qual os EAU estão a forjar novos parceiros de diálogo que não são ocidentais, mas de uma forma que não é necessariamente anti-Ocidente. 

Etiópia

A adesão da Etiópia aos Brics é um “ponto alto” para o segundo país mais populoso de África, regozijou-se quinta-feira o seu primeiro-ministro, Abiy Ahmed. A narrativa de uma Etiópia emergente se fortalece com a novidade, assim como fortalece a liderança muito criticada de Ahmed no Ocidente, por violações de direitos humanos.

Tradicionalmente não-alinhada, a Etiópia mantém laços estreitos com a Rússia e a China – o seu principal parceiro comercial – mas também com a Índia e os Estados Unidos, mesmo que as relações com Washington tenham ficado tensas durante o conflito de dois anos na região de Tigray (norte da Etiópia), que terminou em novembro de 2022.

É exatamente esse tipo de crise militar que torna a entrada no bloco um trunfo para o governo central do país africano. O fortalecimento da articulação internacional do governo etíope com outros países dificulta a tentativa de golpes e desestabilizações e fortalece a democracia local.

A Etiópia foi uma das economias mais dinâmicas do mundo durante a década de 2010, mas o seu crescimento foi travado pela pandemia de covid-19, pelas calamidades climáticas, pelo conflito em Tigray e pela onda de choque global da guerra na Ucrânia. Apesar disso, a Etiópia continua a ser uma das economias de crescimento mais rápido da África, com mais de 5% ao ano.

O governo etíope está negociando um pacote financeiro com o Fundo Monetário Internacional. A adesão ao BRICS poderá dar-lhe maior alavancagem, pois as potências ocidentais poderão ser mais cautelosas em empurrá-la “para os braços” da China.

A economia da Etiópia, estimada em cerca de US$ 126,78 bilhões em 2022, é menos de metade do tamanho dos US$ 405,87 bilhões da África do Sul, que é de longe a menor economia dos BRICS. Mas, de certa forma, a Etiópia pode ser vista como um país africano mais representativo do que a África do Sul. A Etiópia acolhe a sede da União Africana e a Comissão Econômica das Nações Unidas para África. A sua capital, Adis Abeba, é por vezes descrita como a capital diplomática do continente. 

Irã

O Irã, que detém a segunda maior reserva de gás do mundo e um quarto das reservas de petróleo no Oriente Médio, candidatou-se a aderir aos BRICS em junho, como parte dos seus esforços para fortalecer os laços econômicos e políticos com potências não ocidentais.

“A cooperação do Irã com os BRICS tem benefícios mútuos”, disse o porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros, Nasser Kanaani, na segunda-feira.

A economia do Irã foi classificada como a 22ª maior do mundo no ano passado com um PIB de cerca de US$ 2 bilhões, tem sido atormentado pela inflação, pelo crescimento lento e pelas sanções econômicas dos EUA.

Mas o país manteve-se à tona vendendo petróleo com descontos à China, entre outras manobras. Também diversificou a sua economia longe do petróleo e aumentou o comércio com os membros do BRICS, com um aumento de 14% no comércio não petrolífero no ano fiscal de 2022-23 avaliado em US$ 38,43 bilhões, de acordo com notícias iranianas que citaram dados aduaneiros.

Politicamente, o Irã valorizaria a adesão aos BRICS como uma indicação de que as tentativas do Ocidente para isolá-lo falharam, consolidando o seu papel como potência regional.

O ministro das Relações Exteriores do Irã, Hossein Amir-Abdollahian, visitou Riad na semana passada e se encontrou com o príncipe herdeiro da Arábia Saudita, Mohammed bin Salman, no último passo para uma normalização pioneira dos laços entre os tradicionais rivais do Oriente Médio, mediados pela China.

Egito

O Egito é um dos principais beneficiários da ajuda americana, mas há muito que mantém uma forte relação com a Rússia e tem laços comerciais crescentes com a China.

O seu interesse em libertar-se da dependência americana fortaleceu-se ao longo do último ano e meio, à medida que o Egito aprendeu quão problemático pode ser depender do dólar. A invasão da Ucrânia pela Rússia desencadeou uma crise cambial e depois uma crise econômica. Os investidores retiraram bilhões de dólares do Egito em pânico, e as importações cruciais de trigo e de combustíveis, compradas com dólares, dispararam de preço. Algumas importações tornaram-se escassas e os preços subiram.

A escassez de dólares também tornou mais difícil para o país pagar as suas dívidas e forçou-o a desvalorizar acentuadamente a sua moeda, agravando a dor para os egípcios comuns.

Dentro dos BRICS, o Egito poderia negociar em moeda local, o que já está tentando através de acordos bilaterais. Espera também atrair mais investimento dos países membros, o que, por sua vez, poderá trazer mais dinheiro dos Estados Unidos, à medida que procura manter a sua influência.

Jogar em ambos os lados tendeu a beneficiar o Egito. A Rússia está construindo a primeira central nuclear do Egito e a China constrói parte da sua nova capital. O medo de perder influência fez com que os governos ocidentais ficassem relutantes em cortar laços por causa de abusos de direitos humanos ou outras questões.

“O Egito tem boas relações com os Estados Unidos e o Ocidente, bem como boas relações com o Oriente”, disse o presidente Abdel Fattah el-Sisi no domingo. “Se o equilíbrio atual continuar, seremos capazes de aderir ao bloco econômico BRICS.”

Sendo a segunda maior economia da África, o Egito tem grandes hipóteses de ser admitido. Já aderiu ao banco BRICS e tem relações comerciais ou políticas fortes ou crescentes com os membros.

Ampliação do BRICS sem critérios prévios? https://tinyurl.com/7ku94zm7

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