02 março 2024

Raul Córdula opina

Coleção Artur Azevedo – Palácio dos Leões
Raul Córdula*

O acervo de gravuras e pinturas conhecido como Coleção Artur Azevedo (ou Acervo Azevediano, como chamam alguns) pertence ao Estado do Maranhão desde 1910, adquirido que foi, segundo Francisco Silva, seu curador, “... das mãos da viúva de Artur Azevedo, senhora Carolina Lecouflé”.

Essa importantíssima coleção está sob a guarda da Curadoria dos Bens Culturais que a mantem tecnicamente acondicionada, sendo parte dela exposta permanentemente no Salão Nobre do Palácio dos Leões, sede do Governo do Maranhão, onde se desenvolve um programa de visitas guiadas, e nos corredores e salas da parte administrativa.

O professor Francisco Silva, Doutor em Artes Visuais da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo e Mestre em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Mackenzie, autor da dissertação de mestrado “Coleção Artur Azevedo de gravuras: memória e patrimônio Cultural”, e do livro-catálogo da coleção “A Coleção Artur Azevedo” é, portanto, o maior especialista deste acervo. A coleção atualmente está composta por cerca 10.000 obras inventariadas pela Curadoria, que tem à frente o pintor e restaurador Ednilson Costa. Originalmente este acervo era composto por 23.130 estampas, sendo 22.677 gravuras, 360 desenhos e 93 pinturas. Francisco Silva diz no livro-catálogo da coleção que:

“No ano de 1977, a Biblioteca Benedito Leite realizou a catalogação e o restauro de parte do acervo Azevediano. No ano de 2006 foi feito um projeto de limpeza e acondicionamento dos livros, álbuns e gravuras, momento em que o acervo já se encontrava sob a gestão da Curadoria de Bens Culturais do Palácio dos Leões. Porém, a coleção não foi, até o momento, inventariada com o rigor técnico necessário nem pesquisada de forma integral. Passado mais de um século de sua compra pelo Governo do Maranhão, um volume significativo de itens foi perdido; centenas de obras foram mutiladas, recortadas, ou sofreram avarias diversas. (.....) Ainda assim, um volume notável de obras, cerca de 16.000, resistem às ações do tempo.”
Mas em sua dissertação de mestrado Francisco Silva corrige:

O acervo, hoje com aproximadamente 10 mil gravuras restantes da coleção original encontra-se na Curadoria de Bens Culturais do Palácio dos Leões (São Luís - MA), onde é feito o trabalho de preservação, catalogação e restauração das obras.

As pinturas formam a pinacoteca do Palácio dos Leões. Segundo Francisco Silva, “A coleção não foi inventariada com rigor técnico nem pesquisada de forma integral.”

Este acervo formado quase completamente por gravuras, também possui pinturas acadêmicas brasileiras e francesas, entre elas obras de Victor Meireles, Antônio Parreiras, Eliseu Visconti, João Batista Castagneto, Augusto Off, Aurélio de Figueiredo, Rodolfo Amoedo, Stefano Cavalaro, Henrique Bernadelli, João Ribeiro, Gastão Formenti, Gustavo Dall’Ara, Belmiro de Almeida, Teixeira da Rocha, dentre outros artistas brasileiros e estrangeiro que formam este conjunto de obras de arte de primeira linha da arte acadêmica.  Estas pinturas integram a pinacoteca do Palácio dos Leões e estão instaladas nas paredes das dependências do Salão Nobre. Francisco Silva informa ainda que o pintor pernambucano Euclides Fonseca restaurou as pinturas em 1930. 

A gravura, no entanto, foi a especialidade de seu colecionador que, além do escritor, teatrólogo e intelectual que se conhece, foi também desenhista e chargista na imprensa carioca na passagem do século XIX para o XX. 

Sob os cuidados técnicos da Curadoria a coleção se encontra em reserva técnica, acondicionado em mapotecas e escaninhos verticais em um prédio localizado numa área anexa ao edifício principal do Palácio, onde também fica localizado o Laboratório de Restauração e Conservação e o acondicionamento das gravuras e pinturas. Nos escaninhos, embora existam algumas pinturas da Coleção Artur Azevedo, encontram-se também obras de uma coleção à parte: pinturas, desenhos e gravuras de artistas modernos de São Luís. Quase todas as pinturas antigas expostas no Palácio estão intercaladas com as gravuras, todas emolduradas e protegidas por vidros contra reflexo.   

Nesta coleção está um panorama de gravuras estrangeiras, sobretudo da Europa, e do Brasil que cobrem um período que vai desde o Século XVI, com obras de pintores e desenhistas que quase sempre lançavam mãos do trabalho dos técnicos gravadores de metal ou pedra encontrados geralmente na Europa ou nos Estados Unidos, para realizarem o trabalho de impressão. É uma coleção valiosíssima que comporta segmentos como retratos, paisagens, cenas religiosas e de costumes, e cenas políticas, além de documentos especiais como livros e ilustrações.

Encontramos exemplares de gravuras dos séculos XVI, XVII e XVIII, de autoria artistas luminares das artes visuais, como Andrea Mantegna, Agostinho Carraci, Hendrick Goltzius, Nicolas Poussin, Charles-Nicolas Cochin, Audran Bonoit II, Charles Le Brun, Manuel Salvador Carmona, e ainda artistas cujas obras são reconhecidas como patrimônios da humanidade: Jean Honoré Fragonard, Jean Antoine Watteau, Peter Paul Rubens, Antoon Van Dick, Van Rijn Rembrandt, Francisco Goya, Nicolas Ponce, Francesco Barbazza, dentre outros.

Estas obras são gravadas em metal – talho doce, ponta seca, agua forte e água tinta – e em pedra – litografia – E xilogravuras, por gravadores reconhecidos internacionalmente, e por gravadores anônimos, que trabalhavam em oficinas europeias e americanas como mestres da gravura, como Rafaello Morghen, Alexandre de Bar, Jean Paul Laurens, Theodore Müller, August Carpentier. Grande parte das obras foram gravadas e/ou impressas em oficinas de edição internacionais, como as francesas Imprimerie Lemercier e Cadart, Chandon e Vignères, a belga Segers &Bouwens, as inglesas Artatia & Comp. e London Virtue & Co. e a americana Johnson, Wilson & Co. 

A procedência dessas gravuras, tendo passado pelas mãos desses artífices e por essas casas editoras são, além da qualidade intrínseca de cada estampa, valores agregados a elas pela qualidade e prestígio que lhes são inerentes.

Também existem gravuras de autoria de brasileiros como Henrique Bernadelli, Eliseu Visconti, Araújo Porto Alegre, Rodolfo Amoedo, Ângelo Agostini, Pedro Américo editadas no Brasil e em outros países.

Trata-se, certamente, do maior e melhor acervo de gravuras existente no Brasil, embora seja praticamente desconhecido dos aficionados da gravura em nossa terra e do público de arte, ou do público brasileiro em geral.

*Artista plástico, curador e crítico de arte

O mundo gira. Saiba mais  https://bit.ly/3Ye45TD

Nenhum comentário:

Postar um comentário