08 março 2025

Luta pela igualdade

Feminismo socialista e a luta de classes no Dia Internacional da Mulher
O Dia Internacional da Mulher surgiu da luta operária e foi impulsionado pela Revolução Russa. Feministas socialistas alertam para a mercantilização da data
Lucas Toth/Vermelho  

O Dia Internacional da Mulher tem suas raízes fincadas no chão de fábrica, na greve, na fome e na revolução. Nasceu das lutas operárias do início do século XX, cresceu com a Revolução Russa de 1917, atravessou o século como um símbolo da resistência feminina e, hoje, vê-se ameaçado pelos artífices do liberalismo. Transformaram o 8M em peça de marketing. 

O que nasceu como um dia de combate contra a opressão de gênero e de classe segue sendo um marco de luta, mas o capitalismo tenta transformá-lo em um festival de mensagens vazias, flores no escritório e discursos genéricos sobre “empoderamento”.

A cena se repete ano após ano: grandes corporações vestem suas redes sociais de roxo, influencers fazem postagens melancólicas, CEOs distribuem brindes às funcionárias. Tudo muito bonito – até que chega o dia 9 de março e as mesmas empresas seguem pagando salários menores às mulheres, abafando denúncias de assédio e perpetuando a exploração da força de trabalho feminina. 

A burguesia, que transformou o 1º de Maio num inofensivo “Dia do Trabalho”, agora tenta fazer o mesmo com o 8 de Março.

Mas o 8M nunca foi sobre isso. O dia remonta ao 2º Congresso Internacional de Mulheres Socialistas, realizado em 1910, na Dinamarca. Foi ali que Clara Zetkin, militante comunista, propôs uma data para unificar a luta das mulheres operárias. A reivindicação central? Direitos políticos e trabalhistas. 

O voto feminino era pauta, sim, mas sempre ligado à luta contra a exploração. Nada tinha a ver com a ascensão de “girlbosses” no mercado financeiro ou de executivas em bancos que seguem sugando o suor da classe trabalhadora.

A data só se consolidaria em 1917, quando as operárias de Petrogrado saíram às ruas exigindo “pão e paz”. Eram costureiras, tecelãs, trabalhadoras exaustas da guerra, da miséria e da fome. Foram elas que, no 23 de fevereiro do calendário russo (8 de março no Ocidente), incendiaram a revolta que derrubou o czar e abriu caminho para a Revolução de Outubro.

A União Soviética, ao contrário dos liberais que gostam de reescrever a história, não ignorou a luta das mulheres. Foi lá que o aborto foi legalizado pela primeira vez no mundo, que creches públicas foram criadas em massa e que as mulheres conquistaram avanços que no Ocidente só viriam décadas depois. Foi a Revolução Russa que fez do 8 de Março um dia oficial de luta da classe trabalhadora, e não um feriado corporativo.

Mas a história é seletiva. Quando a ONU oficializou a data em 1975, o fez já sob uma ótica esvaziada de seu conteúdo revolucionário. O discurso predominante passou a focar na “igualdade de gênero” sem tocar no capitalismo patriarcal que perpetua a desigualdade. Vieram os tapinhas nas costas, os eventos institucionais e o feminismo higienizado para caber nos discursos de CEO.

Clara Zetkin já alertava para esse risco. Em 1894, ela escreveu que “o feminismo burguês e o movimento de mulheres proletárias são fundamentalmente distintos.” Para as trabalhadoras, a luta é contra o patrão e contra o machismo, mas as feministas da burguesia querem apenas seu próprio espaço dentro do sistema – um lugar na mesa, mesmo que a mesa siga sustentada pelo suor de milhões de trabalhadoras invisíveis.

E aqui estamos. O 8 de Março chegou, preparado pelas grandes empresas e suas campanhas. Falarão sobre “empoderamento”, sobre “lugar de fala”, sobre “mulheres no topo”. Mas não falarão sobre as operárias que costuram suas roupas em Bangladesh por centavos, nem sobre as trabalhadoras precarizadas do Brasil, nem sobre as mulheres camponesas que seguem sendo assassinadas por defenderem a reforma agrária.

Resta saber: vamos resgatar a vocação revolucionária do 8M, ou vamos assistir, inertes, à sua conversão definitiva em um espetáculo publicitário?

A história já deu sua resposta. As operárias de Petrogrado não pediram flores. Pediram revolução.

Leia também: 8 de Março: a verdadeira origem da data que celebra as mulheres https://lucianosiqueira.blogspot.com/2022/03/8-de-marco.html 

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