Junho: Lula deixará o CMN decidir pelo rentismo e contra o Brasil?
Luís Carlos
Paes*
Em
artigo publicado em 23 de setembro de 2014, citei o professor Luiz Gonzaga
Belluzzo que, poucos dias após o Comitê de Política Monetária (Copom),
constituído pelos nove diretores do Banco Central do Brasil (Bacen), ter
elevado a taxa Selic em 25 pontos, afirmara que “a política de juros altos é
uma circunstância da guerra entre a Faria Lima e o resto do país”.
A
afirmação estava correta e se somava à indignação de todos os economistas que
não se subordinam à Cartilha Neoliberal, milhares de empresários ligados à
produção de mercadorias e milhares de lideranças sindicais e do campo popular e
democrático, em todo o território nacional.
A
indignação e o protesto verbal de todos estava corretíssimo. O Bacen, àquela
época, com maioria indicada por Bolsonaro, continua seguindo, até hoje, com
maioria indicada por Lula, a ortodoxia monetária que alimenta o rentismo (de
setembro de 2024 até hoje, outras cinco reuniões elevaram a Selic em mais 400
pontos, atingindo 14,75% a.a.). Esta política, além de aumentar a fortuna de um
punhado de bilionários, resulta numa elevação absurda da dívida pública,
restringe o crescimento econômico, promove o desemprego e reduz a renda das
famílias das camadas médias e dos mais pobres, sabotando todo o esforço e todas
as iniciativas do governo Lula de reindustrializar o país, elevar o nível de
emprego e a renda do povo trabalhador.
É
como se estivéssemos em alto-mar em um barco à deriva, onde o governo, por um
lado, tenta tapar os buracos do casco, retirar a água e buscar um rumo seguro
e, por outro, o Banco Central, dependente do "mercado", produz
aceleradamente novos furos no casco da embarcação. É bom lembrar que nada é tão
ruim, que não possa piorar. Tramita no Senado a PEC 65/2023, urdida pelo
ex-presidente bolsonarista do Bacen, Roberto Campos Neto, que visa radicalizar
a independência da Instituição, transformando a atual autarquia federal em uma
empresa pública de direito privado.
Enquanto
vigorar a política macroeconômica receitada pelos agentes do rentismo nacional
e internacional, implementada no segundo governo de Fernando Henrique Cardoso,
de metas de inflação, superavit primário e câmbio flutuante o país não retomará
um ciclo virtuoso de crescimento como, por exemplo, faz a China há quase 50
anos.
Se a correlação de forças na sociedade e no Congresso Nacional ainda não permite uma mudança mais definitiva nesta política, é possível realizar alguns movimentos que possam criar condições minimamente favoráveis a que o Copom em suas próximas reuniões, mesmo influenciado pelo pensamento neoliberal, possa aliviar o atual arrocho da política monetária.
Trata-se da elevação da atual meta de inflação, totalmente fora de nossa realidade econômica, com o agravante da sabotagem da diretoria indicada por Bolsonaro em relação à desvalorização cambial em 2024 e as incertezas e instabilidade decorrentes da gestão Trump na Casa Branca a partir deste ano.
Ressalte-se
que a redução da meta de inflação já tem precedente. Este expediente já foi
utilizado pelo CMN no primeiro governo Lula (2003 a 2006). Durante largo
período, nas duas primeiras décadas deste século, tivemos uma meta de 4,5%, com
intervalo de tolerância de 2%.
A
atual meta de 3% ao ano, com intervalo de tolerância de +/- 1,5%, como já
afirmamos acima, é totalmente irreal e só reforça a imposição de uma política
austera por parte do Copom, que tem o mandato de buscar o cumprimento da meta
estabelecida.
Agora,
neste mês de junho, o Conselho Monetário Nacional (CMN), composto pelos
ministros da Fazenda, do Planejamento e o Presidente do Banco Central, todos
indicados pelo presidente Lula, pode alterar estes parâmetros.
É
uma excelente oportunidade para elevar a meta e o intervalo de tolerância.
Argumentos não faltam. É preciso coragem política para enfrentar a Faria Lima e
a pressão da grande mídia, grupo Globo à frente.
Os
empresários do setor produtivo, o conjunto do movimento sindical e dos
movimentos sociais organizados, além dos economistas do campo
desenvolvimentista e a mídia independente podem e devem ser mobilizados para
apoiar esta medida do governo e elevar a pressão sobre o Copom em suas próximas
reuniões.
Seria
um primeiro passo importante no combate à ortodoxia liberal que continua
garroteando o governo Lula.
Luís
Carlos Paes de Castro, engenheiro, analista aposentado do Banco Central do
Brasil, membro do Comitê Central e presidente do PCdoB no Ceará
[Ilustração: imagem gerada por IA]
[Se comentar,
assine]
Simpósio da Grabois debate desenvolvimento e desafios do Brasil no cenário global https://lucianosiqueira.blogspot.com/2025/04/fundacao-grabois-debate.html
Nenhum comentário:
Postar um comentário