04 julho 2025

Abraham b. Sicsu opina

Pernambuco e as inovações necessárias
Abraham B Sicsú  

Pernambuco apresenta uma base produtiva bastante diversificada e um setor de pesquisa e desenvolvimento robusto e bem estruturado. Essa realidade não deve ser ignorada.

Uma pergunta que surge, inquieta, é entender o porquê de não haver um avanço significativo da articulação entre o setor produtivo e o de desenvolvimento e inovação? Não se nega que houve avanços, mas, numa análise mais aprofundada, verifica-se que são bastante tênues essas ligações.

Daí surgem outros questionamento. Estamos preparados para os saltos que a manufatura 4.0 está gerando? Haverá dificuldades de outra grandeza que não apenas as tecnológicas?

Porchmann afirma que “após três décadas de vigência do Consenso de Washington, o mundo segue com limites significativos para a sustentação do crescimento das atividades econômicas e elevação do padrão de bem estar social. A dominância financeira tem impactado fortemente as decisões de produção e distribuição de bens e serviços”.

Mais adiante afirma que “mesmo com os avanços tecnológicos, as possibilidades de haver sustentabilidade ambiental subvertem-se diante dos interesses mais imediatos por parte das grandes corporações transnacionais. Sem a industrialização, a democracia não funciona adequadamente. Mas, para haver industrialização é necessário existir um Estado forte, o que contraria o Consenso de Washington e joga contra a construção de uma sociedade superior.”

No caso específico que aqui se trata o termo Estado Forte está associado ao seu poder de intervir nos rumos do desenvolvimento dando-lhe coerência e procurando atender às aspirações de sua população.

O desenvolvimento de uma região ou estado deve estar fortemente alicerçado na sua visão de futuro. O direcionamento estruturado, com perfis e metas bem definidos faz-se necessário, se possível, com um planejamento estratégico. Esse deve ser o balizador dos investimentos a serem realizados e dos resultados esperados.

É fundamental articular a dinâmica produtiva com metas claras a serem atingidas, inclusive exigindo compromissos empresariais com aqueles que quiserem se inserir no modelo a ser implementado. Incentivos, de qualquer forma, não são apenas para alavancar a situação financeira das empresas, importante que sejam fortemente vinculados a objetivos sociais, ambientais e de competitividade.

O segmento de inovação não foge a tal lógica, fundamental haver ligação efetiva entre a visão estratégica para o Estado e os investimentos que serão feitos no setor de pesquisa, desenvolvimento e estruturação dos mercados.

Indispensável lembrar que, atualmente, chegar à inovação, necessita de pesados investimentos em diferentes áreas, desde a pesquisa e desenvolvimento, até as estratégias de mercado, de tecnologia industrial básica, de marketing e de difusão. E isso, parece ser pouco ressaltado nos documentos oficiais, atendo-se, quase que exclusivamente, à área estrita da pesquisa e desenvolvimento.

Nessa direção, entender o projeto de desenvolvimento do Estado faz-se prioritário. Ele deve orientar fortemente os investimentos feitos no setor.

Nos primeiros quinze anos do século XXI, Pernambuco teve um projeto de crescimento que o projetou acima dos demais estados do Nordeste. Baseado em grandes projetos estruturadores, a vinda de uma refinaria de petróleo e de quase todos os setores de suporte, inclusive com algumas ramificações para a petroquímica; a montadora de automóveis e a vinda de mais de sessenta empresas fornecedoras de autopeças; a vinda da Hemobrás e de empresas farmo-químicas; a consolidação do Pólo de Saúde em Recife; o Porto Digital e de empresas da área de informática em toda a região metropolitana.

Num levantamento feito nos contratos do BNDES de 2002 a 2024, nota-se que Pernambuco teve 493 operações, sendo que 163 para a indústria de transformação, em 23 municípios. Número bastante significativo.

Verdade que fortemente concentradas em Ipojuca, 55% em valor, onde está SUAPE e a Refinaria da Petrobrás. Goiana viria a seguir, onde está a Stellantis (inicialmente chamada de FIAT/ Chrysler) com cerca de 10% em valor.

Vale salientar, também, que o Pólo de Saúde em Recife e operações de energia eólica em pequenos municípios merecem destaque nos projetos financiados pelo principal, quase único, banco de desenvolvimento de âmbito nacional.

Isso garantiu que o estado tivesse 5,5% do valor contratado pelo Banco no período, o que não é pouco. Deu-lhe notoriedade.

Destaque-se, no entanto, que o ciclo de grandes investimentos deu uma forte arrefecida a partir de 2016.

Não se notam, na carteira do BNDES, grandes contratos para o estado a partir de 2018, o que vem ao encontro de uma realidade em que se perde dinamismo frente aos demais estados da região. Um novo ciclo teria que ser estruturado, novas lógicas incorporadas e aprofundadas.

Tendo em consideração que se passa por um processo mundial de profundas transformações em que a manufatura 4.0 ganha dinamismo, a inteligência artificial muda os perfis estruturantes de produção e consumo, a sustentabilidade ambiental assume papel de relevo na nova agenda de desenvolvimento, planejar o desenvolvimento tendo por base a dinâmica de inovação parece que seria caminho coerente com um futuro mais promissor.

Articular esse movimento que se deseja com a inovação far-se-ia necessário. Vejamos o que ocorre mais de perto.

A principal fonte de financiamento para inovação no País, sem dúvida passou a ser, nos últimos dois anos, o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico- FNDCT, administrado pela Financiadora de Estudos e Projetos FINEP. Uma análise mais focada traz um aspecto que se considera relevante e preocupante.

Verifica-se, em uma análise dos projetos financiados, que o maior fundo direcionado à pesquisa e desenvolvimento para inovação existente no País procura se articular com o projeto desenhado pela Nova Indústria Brasil- NIB. Plano base da lógica de orientação definida no período de transição para o Governo atual do país e que deve ser a lógica da dinâmica inovativa e de reindustrialização que se pretende. Dar sustentação a mudanças profundas no desenvolvimento social e sua sustentabilidade é o objetivo. Concordamos com essa visão.

Na carteira da FINEP, os projetos realmente pensados como estruturantes, que deverão ter impacto efetivo, aqueles que terão grande poder transformador, se concentram nos financiamentos de mais de 50 milhões de reais por projeto.

Todos os que já foram aprovados, 13 projetos, se basearam em projetos por encomenda, ou seja, que tinham bem definidos os objetivos a serem alcançados e como deveriam ser implementados. A ligação com o desenvolvimento é nítida.

Esses projetos se concentram em São Paulo e Rio de Janeiro e apenas um para o Distrito Federal. Nenhum outro estado foi contemplado. Ou seja, o direcionamento do financiamento que tem realmente impacto, abstrai o resto da Federação.

 No caso de Pernambuco, segundo esse critério, não há nenhum projeto que faça a ligação direta entre uma visão de futuro para o estado e uma âncora efetiva na área da inovação, de peso realmente significativo.

A articulação entre desenvolvimento e inovação é fundamental. Uma busca a ser feita. Infelizmente, até o momento, não são observadas essas conexões. 

Caminhos que possam apontar para uma agenda efetiva de conexão do setor de C,T&I com um projeto de inclusão crescente de nossa economia nas tendências atuais nacionais e mundiais fazem-se necessários.

Caso contrário, muito se investirá na base de inovação e de ciência, mas com resultados pouco significativos para o avançar do desenvolvimento estadual.

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