Minha opinião

Na fila do caixa
Luciano Siqueira
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Onde tudo se escuta, queira ou não:

- Eu odeio filas - reclama a jovem atrás de mim, suspirando, na fila.

- Eu até suporto - comentei -, mas hoje parece mais lenta do que o normal e todo mundo aqui está com pressa...

- Eu estou sempre com pressa — disse o cidadão de meia idade, calvície acentuada, bermudas coloridas, camisa regata e braços tatuados.

- Por mim pode ir devagar.

- Paciente?

- É. Na minha idade a gente tem todo o tempo do mundo!, falou a pequenina senhora, esguia, cabelos brancos, aparentando 80 ou mais e entrando na conversa como quem quer apenas um pretexto para falar.

- Estou chegando lá, comentei sorrindo.

- Aqui vejo todo mundo — disse ela. — e basta olhar para imaginar...

Enquanto a fila anda lentamente, olho em torno e lhe dou razão. Todos parecem desempenhar seu próprio papel, qual enredo prévio. Tem o sujeito que grita ao telefone, por surdez ou impaciência; a adolescente que lê um livro, absorta e alheia ao que se passa; o garotinho que insiste em levar um chocolate enquanto a mãe repete “você não pode, meu filho!”, a jovem senhora de olhar fixo na tela do celular...

- “É no cartão, débito ou crédito?”, a moça do caixa, de olhar vago e voz rouca adverte que é chegada a minha vez. Enquanto pagava, pude apenas ouvir que a idosa simpática e falante chama-se Esmeralda e que vem sempre por volta das 18 horas.

Uma pena, pensei comigo. Nossos horários não combinam. Nada mal se pudéssemos conversar outras vezes, me beneficiaria da sua verve e do olhar arguto.

A padaria resta como um último reduto de novas amizades em bairros tomados por edifícios onde cada um vive em seu apartamento como que em clausura voluntária. Vizinhos que se falavam na calçada é um privilégio do passado. As novelas na TV e a sensação de insegurança levam todos a uma espécie de exilio voluntário. Agora tudo impulsionado pela comunicação digital instantânea e distorcida. Até quando?

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