01 maio 2013

Contra a internação compulsória

Manifesto do Grupo de Estudos sobre Álcool e outras Drogas – Gead/UFPE
Por uma política pública, humanizada e de qualidade de atenção integral a usuários de álcool e outras drogas na cidade de Recife

O Grupo de Estudos sobre Álcool e outras Drogas – Gead, da Universidade Federal de Pernambuco – UFPE, vem tornar público seu posicionamento contrário à aprovação do Projeto de Lei – PL n0 17/2013, de autoria do vereador Luiz Eustáquio, que dispõe sobre a internação voluntária, involuntária e compulsória para dependentes químicos de álcool e outras drogas no município do Recife.

De natureza coercitiva, higienista e judicial, em qualquer uma das suas modalidades de internação, este PL fere os princípios das reformas sanitária e psiquiátrica e à dignidade da pessoa humana, bem como fere os direitos fundamentais, sobretudo, os de inviolabilidade do direito à vida, à liberdade e à autonomia dos indivíduos.

A internação só deve ser indicada quando todos os recursos não hospitalares mostrarem-se insuficientes e não deve ser utilizada como porta de entrada na rede de atenção integral a usuários de álcool e outras drogas do Recife, que são parte dos dispositivos do Sistema Único de Saúde - SUS. Muito menos, deve-se recorrer aos espaços de internação privativos de liberdade, como as comunidades terapêuticas, propostas pela vereadora Michelle Collins, nas Emendas Aditivas ao referido PL. Estas Emendas Aditivas põem em questionamento o PL, uma vez que os dois vereadores, Luiz Eustáquio e Michelle Collins, são proprietários de comunidades terapêuticas.

Nos últimos anos, a cidade de Recife se destacou nacionalmente pela estruturação de uma ampla rede de atenção integral a usuários de álcool e outras drogas, conhecida como “Programa +Vida”, que inclui Consultórios de Rua, Centros de Atenção Psicossocial em Álcool e outras Drogas – Caps AD e Albergues Terapêuticos, dispositivos abertos, laicos, de qualidade e pautados no respeito aos direitos humanos e na compreensão de que o uso de drogas faz historicamente parte da vida social e é uma das formas de expressão das subjetividades humanas em tempos de agravamento da questão social.

Essa rede, aliada à rede do Sistema Único de Assistência Social – SUAS, dos governos municipal e estadual (Programa Atitude), desenvolvem estratégias de redução da demanda e de danos com abordagens de rua e cuidados intensivos, que vão da desintoxicação ao albergamento, quando necessário. É verdade que estas redes têm suas fragilidades, mas estas são, sobretudo, em decorrência da lógica do financiamento público brasileiro, que privilegia o mercado financeiro em detrimento das políticas públicas sociais.

Por fim, o debate democrático e informado sobre as drogas deve ocorrer sem demonizá-las e sem violências contra os usuários. As evidências científicas demonstram que são necessárias medidas conjuntas de redução da oferta, da demanda e de danos no sentido de modificar padrões de consumo, mas não a abolição das drogas de nossa sociedade. Esta tarefa exige esforços coletivos, tanto do Estado como da sociedade, para melhorar e expandir as políticas públicas sociais no sentido de erradicar a miséria e a barbárie produzidas pelo modo de produção capitalista, que se pauta na exploração e na desigualdade social.

Recife, 29 de abril de 2013.
Grupo de Estudos sobre Álcool e outras Drogas – Gead/UFPE

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