Luis Fernando Verissimo
Tenho inveja dos cronistas novos. Não porque eles não sabem que todas as
crônicas de Natal já foram escritas e podem escrevê-las de novo. Mas porque
podem fazer isto sem remorso.
Tem a crônica de Natal tipo "o que eu gostaria que Papai Noel me
trouxesse". A Luana Piovani ou um fac-símile razoável, a paz entre os
povos, um centroavante para o Internacional (ou um fac-símile razoável) etc.
Tem as infinitas variações sobre problemas encontrados por Papai Noel no
mundo moderno (seu trenó levado num assalto, sua dificuldade em se identificar
em portarias eletrônicas, protestos de ambientalistas contra o seu tratamento
das renas, suspeita de exploração de trabalho escravo, suspeita de pedofilia
etc.).
Tem as muitas maneiras de atualizar a história da Natividade (Maria e
José em fila do SUS, os Reis Magos chegando atrasados porque foram detidos por
patrulhas israelenses ou militantes palestinos, Jesus vítima de uma bala
perdida).
Tem as versões diferentes da cena na manjedoura, inclusive — juro que já
li esta, se não a escrevi — narrada do ponto de vista do boi.
Todas já foram feitas.
Há tantas crônicas de Natal possíveis quanto há meios de se desejar
felicidade ao próximo.
Os cartões de fim de ano são outro desafio à
criatividade humana. Pois todas as suas variações também já foram inventadas.
Quando eu trabalhava em publicidade, todos os anos recebia encomendas de
saudações de Natal e Ano Novo "diferentes", porque os clientes não se
contentavam em apenas desejar que o Natal fosse feliz e o Ano Novo fosse
próspero. Uma vez sugeri um cartão de Natal completamente branco com a frase
"Aquelas coisas de sempre..." num canto, mas acho que este foi
considerado diferente demais. E dê-lhe poesia, pensamentos inspiradores, má
literatura e a busca desesperada do diferente. Um cartão em forma de sapato, de
dentro do qual saía uma meia: a meia para o Papai Noel encher de presentes e o
sapato para entrar no Ano Novo de pé direito. Coisas assim.
Enfim, tudo isto é apenas para desejar a você... Aquelas coisas de
sempre.
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