Marcio Pochmann, no portal Vermelho
Nas três eleições diretas para presidente, o
projeto neoliberal vencedor no Brasil (1989, 1994 e 1998) não chegou a ser
apresentado enquanto tal para o veredito da sociedade. Nos programas políticos
de governo apresentados nos debates eleitorais, palavras ou expressões como
‘privatização’, ‘redução dos direitos sociais’, ‘transferências de renda para
os ricos’, ‘encolhimento de oportunidades’ e ‘estancamento da mobilidade
social’ jamais foram explicitadas.
Após quatro sucessivas
derrotas eleitorais (2002, 2008, 2010 e 2014), o projeto neoliberal procura
novamente voltar a dominar o governo na forma de um golpe explícito à jovem
democracia brasileira. Sem conseguir conquistar o voto popular, os defensores do
golpismo escondem o que desejam realmente fazer com o país e o conjunto dos
seus cidadãos.
Para tanto, os fins
parecem justificar o uso de qualquer meio. De um lado, os defensores do golpe à
democracia adotam como esteio legitimador do impedimento do governo Dilma, a
condução do processo pelo atual presidente da Câmara dos Deputados, cuja ética
política, compromisso público e lisura administrativa são, no mínimo,
questionados, se é que existentes.
De outro, percebe-se que
a linha dos argumentos adotada pelo impeachment foca o uso inadequado dos
recursos públicos pelo governo Dilma, prática que não pode ser considerada
crime, tendo sido usual desde o atual vice-presidente no exercício temporário
da função de presidente, passando por presidentes anteriores até os atuais
governadores. Além disso, expressa subliminarmente, o questionamento ao papel
do Estado reformulado a partir de 2003.
Em síntese, a
reorganização das políticas públicas buscando fazer valer plenamente a
Constituição Federal de 1988, especialmente no que toca incluir todos os
brasileiros nas oportunidades geradas pela economia nacional. Por isso que a
via adotada de crescimento econômico desde o início dos anos 2000 se revelou
fundamental para abrir um inédito caminho para tornar o país menos desigual.
Mas isso, obviamente, em
uma nação constituída e experimentada na iniquidade de várias ordens causou
mal-estar, justamente naqueles minoritários segmentos privilegiados por antigos
monopólios sociais, políticos e econômicos que resultam das práticas
tradicionais do Estado patrimonialista. Nesse sentido que a centralidade da
oposição golpista é o gasto público, adotando como argumento a necessidade de
diminuir consideravelmente o tamanho do Estado.
Informam
sub-repticiamente que o gasto público não cabe na economia nacional,
necessitando reduzi-lo, bem como transferir para o setor privado as empresas
estatais como a Petrobras, a Caixa Econômica Federal, entre outras. Da mesma
forma buscam antecipar que os direitos sociais estabelecidos pela Constituição
Federal de 1988, como salário mínimo, aposentadoria e pensões, entre outros,
prejudicam o desempenho da economia nacional.
Assim, a aprovação do
impedimento do governo Dilma imporá a uma parte significativa da população o
retorno ao caminho da exclusão, restabelecendo a sociedade da inclusão dos 2/3
no Brasil. Tal como o espírito da sociedade dos brancos vigente no final do
século 19, que aceitou abolir a escravidão sem a necessária inclusão dos
ex-escravos e suas gerações, segue o objetivo golpista neste início do século
21.
Parcela importante da
população poderá continuar a fazer parte do Brasil, porém, sem usufruir de suas
oportunidades, na medida em que o Estado tenderá ao exercício dos monopólios
sociais, econômicos e políticos
aos privilegiados de sempre. Quem viver verá, infelizmente.
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