Mihai Criste
Os tempos do rito
Janio de Freitas, na Folha de S. Paulo
A própria agenda do Senado demonstra o
caráter de mero salvamento das aparências no rito para aceitação ou recusa de
processo de impeachment. Às sessões de acusação corresponderam sessões de
defesa, como convém. Mas com diferença importante.
A última apresentação da defesa de Dilma Rousseff deu-se anteontem, terça, à tarde. Ricardo
Lodi Ribeiro, professor de Direito Financeiro da Uerj, e Geraldo Mascarenhas
Prado, da UFRJ, consolidaram os argumentos defensivos anteriores e
acrescentaram os seus. Estabeleceram com competência o queMarcelo Coelho definiu como "a dimensão realmente diminuta dos atos
presidenciais que justificariam o pedido de impeachment". Mesmo um
entusiasta do impeachment, se honesto, sentiria o valor do conjunto de
argumentos.
O relator Antonio Anastasia iniciou a leitura do seu relatório pouco antes de 15h30 de ontem, quarta-feira. Menos de 24
horas depois de encerradas as últimas e detalhadas exposições da defesa. Ainda
que desejasse, o relator não teria tempo de analisá-las, fazer sua confrontação
com as acusações, com os fatos e documentos. E só então fixar suas conclusões e
produzir o relatório, de aceitação ou recusa do processo e julgamento pelo
Senado.
Muito extenso, com longas preliminares
histórico-jurídicas, e minucioso na apreciação das questões de fato suscitadas
pela acusação, o relatório evidenciou que suas conclusões e preparação ficaram
concluídas antes das etapas finais da defesa. Já nas preliminares, de
elaboração bem anterior, o relatório facilitava a percepção do resultado ainda
muito distante na demorada leitura.
Não é seguro que, no caso, o intervalo
adequado levasse ao estudo do último e importante ato da defesa. Nem que o
estudo influísse na visão de Anastasia. Mas a ausência do intervalo necessário
deixou um sinal negativo nas condições de uma decisão tão grave pelo Senado.
Com agenda assim apertada, e sem necessidade disso, parte da defesa se torna
inútil já por antecipação. A defesa se encerra como ato de aparências, e não de
equidade entre os opostos.
O problema se repete na cronologia
ainda mais forçada: Anastasia concluiu a exposição do seu complexo relatório já
à noite, e o advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, deve confrontá-lo
como defensor já às 10h de hoje. Comentário dispensável.
Antonio Anastasia é do PSDB, que
encabeça os partidos pelo impeachment, e associado a Aécio Neves. Em termos
políticos e éticos, uma indicação de relator que atendeu apenas à formalidade.
Não à equanimidade, nem na pequena medida em que é possível entre
representantes partidários. Medida ontem bem praticada pelo presidente da
sessão difícil, senador Raimundo Lira.
No plenário do Senado, onde se abre o
processo de impeachment, a sequência de acusação, defesa e relatório repete-se,
com importância ainda maior. Há tempo para reexame da agenda prevista e para a
discussão de escolhas pessoais e políticas para os cargos necessários. Com o
jogo jogado, trata-se mesmo de cuidar das aparências. Que cuidem melhor.
O ACUSADOR - O esforço contra Dilma não cessa de exibir situações
originais. Na exposição como um dos acusadores pró-impeachment, no Senado, o procurador
do Ministério Público no Tribunal de Contas da União, Júlio Marcelo de
Oliveira, disse que "as pedaladas fiscais ocorreram de forma continuadas
de 2013 a 2015".
Ou não tinham a gravidade de repente
acusada ou a acusação virou autoacusação. O que ele providenciou, a respeito,
já em 2013 ou mesmo em 2014, como procurador da República designado para o
assunto?
A acusação alcança o TCU, mas aí não há
novidade.
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