14 novembro 2016

Novo ciclo, novos desafios

PCdoB se prepara para enfrentar o novo ciclo político

 

A Comissão Política Nacional do PCdoB esteve reunida na capital paulista, nesta sexta feira (11), para discutir o cenário político. Na ocasião, a presidenta nacional do Partido, deputada Luciana Santos fez uma análise sobre a conjuntura política mundial e nacional, tratou do conservadorismo crescente, da luta contra ameaças aos direitos dos trabalhadores, da retomada da democracia e soberania no Brasil e ressaltou a necessidade de enfrentamento deste "novo ciclo político".

Abaixo a íntegra de sua análise:
O processo das disputas municipais neste ano foi a primeira grande batalha política após o golpe que o povo brasileiro e as forças progressistas sofreram com o impeachment de Dilma Rousseff em 31 de agosto último.
Ingressamos, assim, em um novo ciclo político marcado por uma ordem conservadora que procura implantar um estado mínimo para o povo e um estado máximo para o rentismo e as oligarquias financeiras. Para isso, o consórcio golpista, lança mão de um grande arsenal de medidas de restrição à democracia, conquistada a duras penas na Constituinte de 1988. 
São inúmeras as batalhas que temos de travar de modo simultâneo: a luta em defesa de direitos elementares como os recursos para a saúde e a educação, ameaçados pela PEC 241 já aprovada na Câmara dos Deputados e em tramitação no Senado Federal através da PEC 55; a luta contra a reforma política antidemocrática; a luta pela restauração da democracia e contra as ameaças ao Estado Democrático de Direito; e a defesa do patrimônio nacional, que está sob pesado ataque. 
O que as forças reacionárias pretendem, na verdade, é a constituição de um estado de exceção corroendo por dentro o estado de direito. As forças progressistas e democráticas, por seu turno, devem atuar buscando influenciar os rumos dos acontecimentos para garantir os interesses dos trabalhadores e da nação.
O agravamento da crise econômica do capitalismo e a ofensiva conservadora - A compreensão do contexto mundial é imprescindível para analisar a quadra em que nos encontramos. Neste sentido, dois fatores merecem nossa consideração. O primeiro é a centralidade da crise internacional do capitalismo que, mesmo passados oito anos desde o seu início, não apresenta uma saída. Muito pelo contrário, o que se projeta é uma nova fase de turbulência global. 
No cômputo geral, os prognósticos convergem para um crescimento “medíocre” da economia mundial. As projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI) são de que a economia global terá uma expansão de 3,1% em 2016; enquanto, para a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o crescimento será de 2,9%, em 2016; e em 2017 pode chegar a 3,2% – números muito abaixo das médias históricas do Produto Interno Bruto (PIB) global. Nesta perspectiva, o comércio mundial terá taxas de crescimento de 1,5% em 2016 e 2017, muito abaixo da média de 7% dos períodos anteriores a 2008.
Este quadro, decorrente do processo de globalização financeira e das políticas neoliberais, características predominantes do capitalismo contemporâneo, tem gerado inúmeras consequências políticas, econômicas e sociais. Fenômenos como a emergência de grupos de extrema-direita na Europa, crise migratória e a própria saída da Grã-Bretanha da União Europeia, com a vitória do Brexit.
Outro fenômeno que pode ser visto dentro desta chave é o resultado das eleições nos EUA. A vitória de Donald Trump, em grande medida, se deu pelos votos de trabalhadores brancos, desempregados, ou em empregos precários, que estão preocupados com a exportação de empregos para o exterior e com a presença de imigrantes. O núcleo das propostas de Trump buscou dialogar com esse público. Ele teceu críticas aos acordos de livre comércio e a projetos como o Tratado Transpacífico (TTP); levantou, também, questionamentos aos gastos com a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) em decorrência da manutenção da segurança de aliados; além de referências a um certo diálogo com a Rússia. 
O candidato Trump criou um personagem asqueroso, preconceituoso e ultraconservador. Resta saber como será o presidente Trump.
Frente às profundas consequências das políticas neoliberais e das medidas de austeridade, e na ausência de alternativas, se observa uma migração dos votos da social-democracia em direção à extrema-direita na Europa.
Na dimensão geopolítica, a questão central no plano mundial é o longo período de disputas por uma reconfiguração do sistema internacional. Cercear e conter a emergência de novos polos de poder continua a ser um dos objetivos estratégicos das velhas potências imperialistas, em especial os EUA. 
Sob este ângulo é que se pode analisar o cerco do imperialismo aos países do BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), principal expressão deste fenômeno dos novos polos de poder, e entre eles o Brasil, principal pivô da integração na América Latina. 
Eleições 2016, a primeira grande batalha de um novo ciclo político - Estamos diante de um novo quadro político, um cenário resultante de um golpe de Estado, no qual as forças que tomaram o poder visam instaurar uma ordem política e econômica conservadora e retrógrada. A primeira batalha deste novo ciclo foi a eleição municipal recém disputada. 
As eleições municipais de 2016 tiveram como traços gerais o fortalecimento das forças conservadoras, um forte sentimento antipolítica e uma pulverização partidária. Também indicaram que os impactos da forte crise econômica, que afetam tanto a população, como  também os estados e municípios; a operação Lava Jato, que funcionou como uma espécie de cabo eleitoral; as novas regras
eleitorais que tornaram as campanhas mais curtas, e a proibição do financiamento privado. 
Entre as forças conservadoras, quem sai fortalecido é o PSDB, que venceu em um número expressivo de cidades e capitais. Irá governar 806 cidades, sendo sete capitais, com 34,6 milhões de eleitores, e terá em mãos um orçamento conjunto de R$ 160,5 bilhões – um número 140% superior ao que era administrado pelos tucanos em 2012.
Na disputa interna dentro do PSDB, o governador de São Paulo Geraldo Alckmin é o grande vitorioso. Com a vitória de João Dória, este outsider na política, no primeiro turno, o governador vem pavimentando sua luta sobre seus adversários, Aécio Neves e José Serra.
O PT saiu de 638 prefeituras, em 2012, para 254, em 2016. Os petistas administravam um orçamento conjunto de R$ 122,3 bilhões e passarão a comandar somente R$ 13,7 bilhões. A única capital que o partido irá governar é Rio Branco (241 mil eleitores) no Acre. As demais cidades de grande porte são Araraquara (SP) e São Leopoldo (RS), ambas com aproximadamente 160 mil eleitores. 
O Partido dos Trabalhadores vive o momento mais difícil de sua existência, que o leva a um debate sobre projeto e orientação política. O PT possui um papel importante no cenário político brasileiro e é de interesse das forças progressistas que ele consiga recuperar suas forças. 
O PMDB, partido de Temer, apesar de ter tido um crescimento vegetativo em número de cidades administradas, sofreu duas importantes derrotas, entre elas o Rio de Janeiro onde governava e em São Paulo.
Outro fator político foi a pulverização eleitoral. Siglas pequenas ascenderam à condução de importantes capitais: Rio de Janeiro (Marcelo Crivella, do PRB), Belo Horizonte (Alexandre Kalil, do PHS) e Curitiba (Rafael Grecca, do PNM).  Alguns partidos nem mesmo possuem representação na Câmara de Deputados. A chamada pulverização não é por completo um elemento negativo, é expressão da pluralidade política e incomoda as grandes legendas. 
O fenômeno da abstenção política e os votos brancos e nulos atingiram índices nunca vistos, somando 41,24% do eleitorado no segundo turno. Em cidades como Rio de Janeiro e Belo Horizonte, o "não voto" superou os votos recebidos pelo candidato vitorioso. Em Aracaju, capital onde o PCdoB elegeu Edvaldo Nogueira, no segundo turno, o índice de abstenção caiu de 20,9% para 12,8%. 
O PCdoB obtém resultado expressivo entre as forças de esquerda - O PCdoB obteve um resultado positivo, pequeno diante das necessidades, mas significativo quando analisado dentro do cenário atual. Nossas maiores vitórias foram no Maranhão, em Sergipe e na Bahia.
No Maranhão, além de o PCdoB ter conquistado 46 prefeituras, os partidos aliados também tiveram um crescimento importante, dando uma mostra concreta de que não fazemos política com hegemonismo. Em Sergipe, vencemos em Aracaju, que possui 397 mil eleitores e em Nossa Senhora do Socorro, com outros 100 mil eleitores. Ambas representam um terço dos eleitores desse estado, que é de aproximadamente 1,5 milhão, de acordo com o Tribunal Regional Eleitoral (TRE).
Mesmo onde não obtivemos vitórias, a disputa eleitoral atraiu novos simpatizantes, posicionou o partido no debate político e fortaleceu as lideranças que se candidataram. Tivemos um crescimento de 40% no número de prefeituras e elegemos 1001 vereadores por todo o Brasil. Este quadro nos possibilita afirmar que obtivemos um dos melhores resultados entre as forças de esquerda, e contribuirá para as batalhas de 2018. É claro que tivemos reveses relevantes, como em Contagem e Olinda, além de um recuo considerável em termos de votos e eleitos nas regiões Sudeste e Sul.
O cenário nacional tem a marca da instabilidade e da adoção de uma agenda neoliberal - As forças golpistas tentam afirmar que o resultado eleitoral legitima sua agenda e governo. No entanto, a instabilidade política e econômica é grande. O governo Temer, apesar da ampla base parlamentar que possui, tem tido certas dificuldades para gerir as diferenças existentes entre as forças golpistas, e
mesmo para entregar a dita estabilidade e a retomada do crescimento. 
A Operação Lava Jato continua sendo o fator de desestabilização política e econômica do país e a atuação política dos procuradores tem sido cada vez mais constante. Seu novo capítulo será a delação premiada do pessoal da Construtora Odebrecht, que pode atingir até 300 políticos e é uma fonte real de preocupação para o governo Temer, bem como para todo o sistema político. Merece registro as operações que a Polícia Federal realizou nas instalações do Senado, rompendo com a autonomia dos poderes, ampliando as tensões e agravando a crise institucional. 
Neste cenário, devemos saber explorar as contradições existentes entre essas forças, visando romper o isolamento e defender o Estado Democrático de Direito e demais interesses e objetivos do PCdoB e das forças progressistas. Como já dito, devemos atuar em múltiplos tabuleiros ao mesmo tempo. 
A economia não dá sinais de recuperação - Por outro lado, o cenário econômico tem se demonstrado bastante adverso. Apesar de a mídia fazer uma campanha afirmando que com Temer a situação seria de retomada imediata do crescimento econômico, os indicadores mostram outra realidade. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o desemprego alcançou 11,8% da População Economicamente Ativa (PEA), e o poder de compra das famílias brasileiras, que vinha crescendo de 2003 até 2014, caiu 2,8% em 2015 e deve encolher 7% em 2016, ou seja, quase 10% em dois anos. 
A retração da economia deve atingir -3,4% em 2016. Em decorrência disso a arrecadação está em queda livre, e diminuiu 8,27%, em setembro, em comparação a 2015. 
O Brasil vive um rápido processo de desnacionalização de sua economia, e a única entrada de ativos em nossa economia tem sido aquisições e fusões com empresas estrangeiras. Em setores como o de energia, investidores chineses têm comprado usinas hidrelétricas e distribuidoras, ativos da Petrobras têm sido adquiridos por companhias como a norueguesa Statoil e a australiana Karoon e a Odebrecht Ambiental, que atuava em projetos de saneamento, foi arrematada por canadenses. 
Avança a reforma política conservadora - Outro tema de grande importância para o país é o da Reforma Política que está em pleno curso. Devemos ter plena consciência do que está em jogo: as forças progressistas mais avançadas podem, arbitrariamente, ter sua representação eliminada do parlamento brasileiro, ou ficarem restritas a uma condição de semilegalidade. O debate deveria ter sido iniciado na Câmara de Deputados, por se tratar de um tema que influencia as eleições
proporcionais, e não no Senado, que é eleito por eleições majoritárias. A votação da reforma política foi fatiada, limitando-se a determinados aspectos, não entrando, por exemplo, no debate sobre financiamento das campanhas eleitorais. 
Em um debate tão relevante como este, que impacta todo o sistema político brasileiro, a Reforma Política não é possível de ser realizada a toque de caixa. As propostas aprovadas no Senado (aprovação da cláusula de barreira e do fim das coligações proporcionais) ainda passarão pela Câmara dos Deputados e lá deveremos atuar para que esse retrocesso não se imponha e para que seja preservado o pluralismo político.
Sobre a questão do financiamento de campanhas, defendemos que seja de caráter público, com vistas a financiar a democracia brasileira a partir da constituição de um fundo. O teor do texto aprovado no Senado é conservador e limita a participação popular na vida política.
A batalha do Teto Fiscal - Ainda no plano das iniciativas institucionais, teremos que enfrentar a batalha que está sendo travada no Congresso Nacional contra a PEC do Teto fiscal, aprovada em dois turnos na Câmara e em tramitação no Senado, como já foi dito anteriormente. O texto foi aprovado no dia 9 de novembro na Comissão de Constituição e Justiça do Senado. Durante a votação, senadores de oposição apresentaram um voto em separado que exigia a realização de uma consulta popular para a implementação da medida, como uma forma de debater amplamente na sociedade os impactos e significados da adoção desse teto.
Concretamente esse novo regime fiscal do país irá favorecer a especulação financeira. É uma tentativa de instituir na Constituição os privilégios aos rentistas e perpetuá-los através da fixação de um teto para os gastos públicos, com a eliminação da obrigatoriedade constitucional do emprego de recursos públicos em áreas sociais como saúde e educação. E irá restringir a capacidade do Estado de atuar no estímulo ao desenvolvimento do país. 
Sinais de um Estado de Exceção no Brasil - Os sinais de uma onda ultraconservadora pairam no cenário brasileiro. O que temos visto é a ocorrência de fatos que que comprovam a existência de um estado de exceção seletivo em suas ações. Ações como a invasão na Escola Florestan Fernandes do MST e a repressão às escolas ocupadas por estudantes pelo Brasil afora são fatos que não podem passar desapercebidos. No caso da Escola do MST, dez viaturas da Polícia Civil chegaram ao local, sem a presença de um oficial de Justiça, para cumprir o mandado de prisão de uma mulher do Paraná. Pareceu um mero pretexto para entrar na escola sem autorização judicial. Trata-se de uma iniciativa a mais de intimidação e repressão que o governo do estado adota em relação ao movimento social. 
Contra estas e outras atitudes antidemocráticas foi lançada no dia 10 de novembro, na Casa de Portugal, em São Paulo, a campanha em defesa da democracia, do Estado de Direito e em defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com o slogan Por um Brasil justo para todos e para Lula. Lá estivemos presente com várias outras lideranças do PCdoB.
Intensificam as lutas em defesa do Brasil, da democracia e dos direitos - Diante deste cenário, é prioridade política fortalecer as lutas em torno de bandeiras em defesa dos direitos, na luta pela retomada da democracia e a defesa do Brasil e seu patrimônio. 
Entre as ações que estão em curso merecem destaque a luta dos estudantes secundaristas contra a reforma do Ensino Médio que, ao completarem um mês desde seu início, já contam com mais de mil escolas ocupadas.
De igual modo, neste 11 de novembro, sindicatos e movimentos sociais articulados pela Frente Brasil Popular e Povo sem Medo organizaram a Jornada Nacional de Lutas contra o pacote de medidas que ferem os direitos dos trabalhadores e do povo em geral. 
Unir o povo em defesa da democracia, dos direitos e da nação - Estamos diante de um cenário complexo e adverso. Este novo ciclo que se inicia, resultado de um golpe que busca implementar uma
agenda ultra neoliberal e conservadora, não é um fenômeno isolado. Este fato possui correlatos em outras partes do mundo e é, em última instância, decorrência da grave crise do capitalismo.
Existem muitos acontecimentos em curso e a realidade é marcada pela imprevisibilidade política e certa instabilidade do governo Temer. Temos que acompanhar a evolução dos acontecimentos, adotando encaminhamentos concretos que a luta política demanda.
Temos daqui por diante um conjunto expressivo de tarefas que teremos de realizar de modo simultâneo. Iniciaremos no próximo mês de dezembro, na reunião do Comitê Central, um balanço das experiências  do ciclo político que se encerrou, bem como um debate sobre a atualização de nossa tática diante do atual cenário político. Este debate continuará por 2017, quando em março realizaremos nova reunião ampliada da Direção Nacional para aprofundar a nossa elaboração da nova tática da esquerda condizente aos desafios do Brasil pós-golpe, culminando com a realização do 14º Congresso do PCdoB.
Simultaneamente a isto, atuaremos na batalha da reforma política, contra as medidas que retiram direitos dos trabalhadores, e na articulação de um largo movimento, ampla frente política, que se agregue em torno de um programa que una o povo em defesa da democracia dos direitos e da nação. 

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