Luciano
Siqueira, no Blog de Jamildo
Onde há contradições pode haver crise. Tão natural quanto o
parto aos nove meses de gestação – e, em tese, não necessariamente ruim, pois situações
críticas podem ser a ante sala de uma situação nova, melhorada.
Mas há de haver um nexo, algum grau de previsibilidade a partir
da consideração do conjunto das variáveis em presença.
O que ocorre no Brasil hoje é uma mixórdia institucional,
onde nada é previsível e tudo, absolutamente tudo – sobretudo o pior – pode
acontecer.
O ponto de partida da crise institucional, que evolui em
paralelo e ao mesmo tempo sincronizada com a crise econômica e o desmoronamento
da representação política parlamentar, foi o impeachment da presidenta Dilma.
O impeachment resultou de uma vontade política respaldada
numa maioria parlamentar circunstancial, ao arrepio da Constituição. Sem com
provado crime de responsabilidade da mandatária, o seu afastamento definitivo
se constituiu num golpe.
Ora, se a Constituição pôde ser assim desconsiderada, num ambiente
de agudização de contradições nas diversas esferas da vida nacional, nada mais
poderia encontrar limites.
A própria Operação Lava Jato, inspirada num objetivo nobre -
o combate à corrupção -, mas desvirtuada pela conotação partidária explicita,
cuidou também, desde os seus primórdios de desrespeitar normas processuais. Com
o aplauso e beneplácito das forças à direita e do complexo midiático golpista.
Agora, justamente através do instituto da delação premiada
também personalidades, líderes e grupos conservadores e de direita, que urravam
de satisfação enquanto o alvo principal foi o PT (e continua sendo), agora são igualmente
atingidos.
Nem o juiz Sergio Moro, que faz vista grossa diante das quatorze
referências explícitas ao senador Aécio Neves, do PSDB, em depoimentos de
delatores, parece ter meios de impedir que os figurões do seu lado político se
vejam também enlameados.
Nesse ambiente, a Câmara e o Senado aprovam o que bem
entendem, na linha da regressão de conquistas e direitos e em benefício
próprio; o Judiciário extrapola seus deveres constitucionais e o Executivo,
cuja principal cadeira é ocupada por um presidente sem estatura, frágil e
seriamente chamuscado pelas delações premiadas, esperneia entre a incompetência
e a falta de representatividade.
Todos atiram contra todos e há baixas em todas as hostes.
Entrementes, não se reconhecem nessa cena complexa e plena
de riscos, interlocutores que, em nome dos chamados Três Poderes, se
sobressaiam pela competência e pela respeitabilidade perante a sociedade, em
condições de promoverem algum entendimento em nome do equilíbrio e do bom
funcionamento das instituições.
Nesse contexto, é urgente a emergência de uma vontade
democrática coletiva, socialmente respaldada, para além de divergências de
fundo, que possa restabelecer o ambiente necessário à preservação da
Constituição e oferecer alternativas à crise.
Antes que o caos se estabeleça de vez.
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