“O mais perigoso do
Brasil”
Luciano
Siqueira
O fato insofismável é que o circo sobrevive em nossas
plagas, cá na sofrida mas resistente e promissora região nordestina.
Circos de variadas dimensões se mantêm atuantes, sobretudo
nas áreas periféricas das metrópoles e interior adentro.
A alguns falta até a lona completa, o que os constrange à ausência
de cobertura. Outros, além de uma variedade minimamente razoável de atrações, possuem
cobertura e também um ou dois veículos.
Tem também os de médio porte e algum luxo.
Talvez seja o caso do circo propagandeado no litoral sul do Paraíba,
onde estive com a família para um breve período de descanso.
Carro de som envelopado com a marca e frases de apelo,
circulava anunciando mais um espetáculo do “extraordinário Glamour Circo’s”,
tendo como principal atração “o globo da morte mais perigoso do Brasil!”
Retorno, então, ao meu tempo de criança no bairro da Lagoa
Seca, em Natal, onde vivi parte da infância e da adolescência.
Por ali passaram muito circos. Sempre uma festa!
À tarde, um palhaço equilibrado sobre pernas de pau,
megafone à mão, gritava “Hoje tem espetáculo!”. Em seguida, repetia o anúncio
em tom de pergunta: “Hoje tem espetáculo!?”, ao que a molecada do bairro, que o
seguia, todos com uma marca de tinta no braço (que lhes daria o direito de entrada
gratuita à noite), respondia em uníssono: “Tem, sim senhor!”
E o diálogo seguia serpenteando as ruas mais movimentadas:
- Hoje tem espetáculo!?
- Tem, sim senhor!
- Às sete horas da noite?
- Sim, senhor.
E o arremate histriônico:
- Oi, arremexe D. Chica pra fazer canjica!...
E a meninada requebrava numa alegria incontida...
Aos meus olhos de menino todo circo que se anunciava me
parecia o melhor do mundo!
Mais ainda quando o desfile se fazia com algum toque de
sofisticação, a presença de artistas uniformizados na carroceria de uma caminhoneta,
palhaços fazendo graça, malabaristas ensaiando alguma trela, algum animal
adestrado...
Bem que gostaria de ter visto o espetáculo do “Glamour”, num
município distante uns quinze quilômetros.
Mas minhas motivações já não são como as do garoto da Lagoa
Seca... Optei por permanecer à beira-mar, taça de vinho à mão, e me deliciar
com a lua iluminando as águas, as intermináveis brincadeiras do sobrinho André,
de Victor, Martinha, dos netos Pedro, Miguel e Alice e outros tantos que
provocam em Luci gargalhadas estridentes e fazem a alegria de Neguinha e Tuca.
Porém ficou a curiosidade: por que o globo da morte do
“Glamour Circo’s” é o mais perigoso do Brasil?
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