A fogueira está queimando
Por José Ambrósio*
Festejos juninos têm a magia de sempre me
reconduzir à já distante infância em pequenas cidades interioranas como Vitória
de Santo Antão (Sítio Poço do Boi, hoje Pombos), Amaraji e Moreno (Tapera, hoje
Bonança). Década de 60. Fogueiras, fogos, balões, milho assado, pamonha,
canjica bolos e muitas brincadeiras.
E era durante as brincadeiras que
invariavelmente vinham as broncas dos nossos pais e outros adultos. E elas nos
entristeciam. Um ‘carão’ deixava a criança envergonhada. E ainda tinha a gréia
dos amigos: “Levou um carão, pra comer com feijão!” Pronto! Não precisava de
mais nada! E servia de lição para as outras crianças.
Se fosse no começo da brincadeira era ainda
pior. Em geral o menino ou a menina flagrada “pegava o beco”, como se diz hoje
em dia. A festa praticamente acabava para aquela criança.
Ontem, uma decisão da Vara Federal Cível da
SJDF determinou a Jair Messias Bolsonaro a obrigatoriedade de utilizar máscara
facial de proteção em todos os espaços públicos, vias públicas, equipamentos de
transporte público coletivo e estabelecimentos comerciais, industriais e de
serviços do Distrito Federal, sob pena de multa diária fixada em R$ 2.000,00
(dois mil reais).
Um sonoro ‘carão’ que não poderia ser dado de outra forma. Em meio ao
flagelo da pandemia do novo coronavírus, não se pode admitir que a maior
autoridade do país que já enterrou 52.788 vítimas da Covid-19 saia por aí sem a
máscara recomendada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e cujo uso é
obrigatório no Distrito Federal. E essa exposição sem máscara da autoridade que
deveria dar o bom exemplo para a nação vinha sendo corriqueira, inclusive com
abraços e apertos de mãos. Sim, e o número de infectados já soma 1.152.066 até
as 8h desta quarta-feira (24), como aponta um levantamento feito pelo consórcio
de veículos de imprensa a partir de dados das secretarias estaduais de Saúde.
Quanta diferença de postura em relação a
outros chefes de Estado e de Governo que enfrentaram a pandemia com a devida
seriedade e o devido respeito ao seu povo desse o início. Caso do governo da
Nova Zelândia, na Oceania, para ficar apenas nesse.
Aqui, como o presidente decidiu que a pandemia
não passava de uma “gripezinha”, o Governo não liderou o enfrentamento, o que
fez com que os governadores – que tem autonomia para isso – passassem a decidir
as estratégias para proteger a população, em geral em consonância com os
protocolos da OMS.
Hoje o Brasil é o segundo país em casos e
mortes pelo novo coronavírus, atrás somente dos EUA. Seus cidadãos e suas
cidadãs não podem entrar livremente em alguns países, quando outros já reabrem
as suas fronteiras.
A fogueira está queimando! Viva São João!
*José
Ambrósio é jornalista e membro da Academia Cabense de Letras
[Ilustração: Anita Malfatti]
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