Tereza Costa
Rêgo, Vive!
Renato
Rabelo
A morte de Tereza me deixou profundamente
comovido. Ela se despede, deixando uma memória de lutas junto ao Partido
e um legado artístico que se tornará imortal. Conheci a camarada Joana, seu
nome de guerra, no exílio em Paris, ao lado de Diógenes Arruda Câmara,
destacado quadro e líder político do Partido Comunista do Brasil.
Na viagem de volta da República Popular da China,
no final de 1976, após o Massacre da Lapa, em 16 de dezembro, fomos obrigados a
permanecer em Paris. A operação das forças repressivas da Ditadura desbaratou a
reunião do Comitê Central do PCdoB, assassinando três dos seus membros e
prendendo outros quatro. Essa situação abrupta, de grande perda, nos deixava
inseguros de voltar. Fui acolhido por Joana e Arruda, durante 5 meses, no
apartamento em que viviam em Paris.
Convivi com eles, no exílio, inclusive com o
camarada João Amazonas, e junto com outros camaradas, até final de 1979, quando
então fomos beneficiados pela grande conquista democrática do Ato da Anistia.
Formamos uma Direção do Partido, fora do Brasil, entre os três – Amazonas,
Arruda e eu – buscando contatos internos e tentando transmitir orientações
possíveis ao Partido, o qual se encontrava desorganizado no âmbito nacional e
em grande parte dos estados.
Reeditamos o jornal A Classe Operária, mantivemos
correspondência com endereços seguros e eu realizei viagem por um período mais
extenso para Buenos Aires e Montevidéu, mantendo contatos presenciais com
camaradas e com minha mulher, Conchita. A partir de 1978, minha família
consegue viver comigo em Paris.
Durante todo esse período de exilio na França,
Joana foi uma grande parceira, solidaria e generosa, dedicada à atenção e ajuda
aos camaradas e amigos nas dificuldades de toda ordem, próprias das condições
do exílio; assumiu inúmeras tarefas do Partido, viajava com Arruda, sendo sua
companheira de toda hora. Os textos elaborados por Arruda, eram ditados por
ele, e escritos por Joana, em decorrência das sequelas deixadas nas mãos dele
pelas torturas que lhe impuseram em sua prisão em São Paulo.
Luciana Santos, nossa presidenta, em sua bela
manifestação, logo após a morte de Tereza, enaltece o seu legado político:
“Tereza, ao lado de Diógenes Arruda, doou energia, tempo e coragem na
resistência à ditadura e na construção do nosso partido em tempos tão
difíceis”.
A trajetória de Tereza Costa Rêgo tem seu lugar e
sua particularidade na imensa e densa história de quase um século do Partido
Comunista do Brasil, vincada por inúmeros quadros e militantes, lutadores
abnegados e devotados, gente simples, trabalhadores com elevada estatura
cívica, intelectuais inteiramente engajados à luta em tempos tão tenebrosos,
mártires e heróis caídos em plena frente de batalhas, mulheres que apesar de
valores obscuros e imposições dominantes, que tolhem inteiramente sua
emancipação, numa “sociedade muito pesada”, ultrapassam esses obstáculos e se
dedicam à luta transformadora, revolucionária.
Tereza é uma dessas lutadoras, é um exemplo de
transgressão de todos os papeis que o patriarcado o tentou impor, nascida de
uma família tradicional da aristocracia rural pernambucana. Os três tempos de
sua vida são muito bem desenhados na sua trajetória: por sua origem, criada
para ser apenas decorativa, preparada para um “bom casamento”, tolhida por
limites retrógrados; rompe com esse status ultraconservador, desafiou
convenções machistas, colocando-se contra as injustiças sociais, demonstrando
sua marca de escolhas corajosas, se apaixona, se liga e segue um líder
comunista, temido pelo status quo, numa demonstração ostensiva de uma clivagem
com seu passado; por fim, após a morte de Diógenes Arruda, sem abandonar a sua
formação política e ideológica, que lhe permitiu a maturidade e fortes
convicções, assinaladas por ela própria, e seguindo escolhas corajosas, Tereza
se encontra com ela mesma, desabrocha sua imensa inspiração artística, com
traços e cores inconfundíveis.
A minha convivência e relação de atividade com
Tereza é no exilio, no segundo tempo de sua trajetória, das quais tenho grande
orgulho por sua militância tão generosa. O último tempo da sua trajetória,
durante quatro décadas, até sua morte, mantém-se no Partido, se transforma no
principal nome feminino da arte moderna em Pernambuco. Segundo os entendidos, é
uma das artistas visuais mais importantes de Brasil – ainda que o país lhe deva
um reconhecimento pela dimensão do seu trabalho. Situação que tem acontecido
com muitos artistas de grande estatura.
O seu legado artístico é formado por grande acervo
e de quadros monumentais. São muitos os destaques de sua pintura inconfundível.
Eu situo a feitura de murais, geralmente utilizados por grandes artistas para
expressar significativos acontecimentos históricos como “Guernica” de Pablo
Picasso (1881-1973), e os grandes muralistas mexicanos, destacando-se, Diego
Rivera (1886-1957), com sua obra magistral “Sonho de uma Tarde Dominical na
Alameda Central”, que tive a oportunidade de ver no original, em Madri, na
Espanha, e na Cidade do México, respectivamente. De Tereza, fiquei emocionado
ao presenciar sua majestosa obra, Mulheres de Tejucupapo, 8m x 2,2m, em
acrílico.
Velha
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