Impacto da pandemia tira até
um quarto do rendimento dos trabalhadores no País
Transcrevo matéria de O Estado de São Paulo sobre a
queda da renda média dos trabalhadores na pandemia.
Mesmo os brasileiros que
conseguiram manter seu trabalho durante a pandemia têm sentido no bolso o
impacto causado pelo novo coronavírus na economia. E a queda no rendimento dos
trabalhadores ocupados foi maior para aqueles que têm menor escolaridade,
segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Covid, do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), organizados pela
consultoria Idados. No primeiro semestre, os trabalhadores que não chegaram a
completar o ensino médio tiveram quedas de até 25% em relação ao que costumavam
ganhar no mês. Para calcular essa perda, o IBGE perguntou quanto o trabalhador
recebia habitualmente naquele mês e quanto, de fato, entrou no seu bolso. “É o
lado sombrio de toda crise econômica: quem estudou menos é mais vulnerável no
mercado de trabalho, o primeiro que teve o contrato suspenso e redução de
jornada. E é ainda mais grave, ao se levar em conta que são essas pessoas que
mais dependem do trabalho para sobreviver”, avalia o economista Matheus Souza,
da Idados. Até maio, a perda de renda obtida pelo trabalho era de 18% na média
de todas as escolaridades. Em junho e julho, com a retomada gradual da
economia, a queda foi aliviada, primeiro para 17% e, em seguida, para 13%.
Apesar de ter metodologia diferente, a Pnad Contínua (que é a pesquisa de
referência) mostra que nesses meses nunca houve uma queda assim. “Desde o
início da pesquisa, em 2012, a maior queda nesses meses foi de 3%, em 2015”,
diz Souza.
Agora, ainda que tenha
melhorado, a diferença da perda de remuneração que os menos instruídos (que não
completaram o ensino fundamental) tiveram em relação aos que fizeram faculdade
manteve-se elevada, em oito pontos porcentuais. Souza ressalta que os dados se
referem a uma média dos trabalhadores com essas qualificações, e que a perda de
rendimento considera tanto os ocupados formais quanto os informais. No caso dos
informais, parte dos trabalhadores contou com o auxílio emergencial, que já foi
de R$ 600 e passa a ser de R$ 300 até o final do ano. “Ainda que os mais pobres
tenham até visto um aumento de renda, a lembrança que o brasileiro guardará da
pandemia será de perda do que recebia no trabalho”, diz o economista. Entre
maio e julho, os trabalhadores sem instrução alguma ou com até o ensino
fundamental incompleto chegaram a perder R$ 431 por mês. É como se tivessem
deixado de receber o equivalente a 40% de um salário mínimo, de R$ 1.045. “A
gente se acostuma a viver com menos, mas nunca é fácil. Dá uma sensação de que
a vida andou dez anos para trás”, conta a cuidadora de idosos Neomar Maria da
Silva, de 62 anos, de Maricá (RJ). Analfabeta, ela teve de se mudar para a casa
de parentes e entrou no programa de renda básica do município, em que recebe o
equivalente a R$ 130 mensais. “Perdi quase tudo, menos a esperança”, afirma
Neomar.
Dia seguinte. Com a
pandemia, a estimativa é que quase um quarto dos trabalhadores formais (9,5
milhões) teve o contrato de trabalho suspenso ou a jornada reduzida, segundo
dados divulgados pelo Ministério da Economia, o que afeta diretamente o
rendimento de quem depende do trabalho. Parte dessas perdas foi amortecida pela
compensação que o governo deu para quem teve redução de salário. Mas, mesmo os
brasileiros com ensino superior e melhores cargos, tiveram baixas de renda
expressivas, de 14% a 10% entre maio e julho. Para o consultor legislativo
Pedro Fernando Nery, os trabalhadores que mais perderam podem até recuperar
essa perda no futuro, mas isso tende a ser um movimento mais demorado do que a
volta dos empregos. “Normalmente, é um processo lento. Mesmo após a última
recessão, o emprego cresceu muito mais rápido que a renda.” Ele diz que é
importante pensar no dia seguinte à pandemia, para que as perdas de rendimento,
sobretudo para os mais frágeis, não se prolonguem ainda mais, apesar do cenário
de desemprego em alta e ritmo de recuperação ainda incerto. “O acesso à
carteira assinada no Brasil é historicamente concentrado em homens brancos, mas
a ideia de zerar os encargos sobre a folha de pagamentos, ainda que seja algo
limitado a um salário mínimo, tende a ajudar na inserção dos mais vulneráveis
no mercado formal.”
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