A mudança começa nas cidades – mais que um slogan, uma esperança!
Ana Cristina Santos*,
no Blog do Renato
Toda cidade brasileira, nesse ano
de 2020, ouviu ao menos uma vez um candidato ou candidata falar sobre mudança.
O sentimento de mudança é inato aos seres humanos e naturalmente a publicidade
explora essa palavra e sensação das formas mais diversas (e até bizarras) nas
propagandas eleitorais. E de tanto uso, essa palavra tão preciosa entrou no
eixo da banalização, fica caminhando ali, naquela linha tênue entre o
esvaziamento e a ressignificação.
No ambiente político em que
vivemos o sentimento de mudança é muito forte. No mundo inteiro, polarização,
guerra, miséria, retrocessos. No Brasil, um governo ultraliberal na economia,
que desrespeita a Constituição, atropela direitos básicos do povo e da
sociedade em geral, aprofunda as desigualdades sociais e estimula o ódio, a
intolerância, os preconceitos e o negacionismo. Uma crise de múltiplas faces —
política, sanitária e econômica — empurra a faixa mais vulnerável da população
para a miséria, atinge a classe média e espalha a desesperança até mesmo em
militantes mais resistentes, que seguem nas trincheiras de defesa da
civilidade, combatendo os desmandos do Governo Federal. A fome voltou a fazer
parte da realidade dos brasileiros e a internet, entre notícias falsas e
sensacionalismo, segue evidenciando o rancor de uma elite que sonha em voltar
aos tempos do colonialismo.
Assim chegamos às eleições de
2020. Na defensiva e, para piorar, fragilizados por uma pandemia que modificou
completamente nossos hábitos e costumes e nos impôs uma dura rotina de
temores_, perdas, adoecimentos, isolamento e distanciamento social. Nesse
cenário, mais do que nunca a palavra mudança ganha mais força e precisa fazer
mais sentido. E é olhando para o passado que busco a concretude para, mais que
uma palavra, ela seja uma ideia forte, um combustível para alimentar ações,
pensamentos e aspirações para o futuro neste novembro, vésperas de eleições municipais.
Há 20 anos vivíamos uma situação
de desesperança parecida com a atual. São fortes as lembranças do arrocho
provocado pelas políticas neoliberais de Fernando Henrique Cardoso, dos ataques
contínuos à Educação, do desmonte do SUS, da entrega do patrimônio público à
iniciativa privada. Ali, daqueles tempos de luta e resistência, surgia a
semente da esperança que, dois anos depois, tomou conta do país e promoveu uma
grande revolução com a eleição de Luís Inácio Lula da Silva, o primeiro
representante dos trabalhadores a dirigir o Brasil. Em 29 de outubro de 2000,
Olinda e Recife elegiam prefeitos de esquerda e renovavam a energia de
combatividade daqueles que acreditavam que o Brasil poderia trilhar um futuro
de desenvolvimento social e de combate à desigualdade.
Luciana Santos foi a primeira pessoa eleita pelo
PCdoB para um cargo executivo em Olinda. Uma mulher, jovem, negra, nordestina e
comunista mudaria os rumos da cidade patrimônio, abriria caminhos para dizer
que lugar de mulher é na política sim e que competência, credibilidade e boa
gestão não dependem de gênero. No Recife, João Paulo, na época no Partido dos
Trabalhadores, também era eleito. O voto popular conduzia um operário à
prefeitura da capital pernambucana. O sentido verdadeiro da palavra mudança,
que começou naquele momento ainda, está impresso nas mentes e corações
recifenses. A sua principal obra: cuidar das pessoas, garantiu que ele saísse
do governo com quase 90% de aprovação e um legado de combate à desigualdade, de
modificação do espaço urbano, de inclusão, respeito e trabalho pela dignidade
de cada homem e cada mulher, da orla aos altos.
Olho para esses dois casos e repenso o slogan. É
nas cidades que a mudança começa. Se procurarmos na história recente
encontraremos muitos outros exemplos. É nas cidades que a mudança começa. Com
candidaturas que olhem nos olhos das pessoas, que tenham compromisso com a
mudança do mundo, com o desenvolvimento sustentável, com o respeito à cidadania
e que entendam o quanto é sagrada a dignidade de cada ser humano. A mudança
começa nas cidades. Conosco. Com a consciência de que o que digitamos na urna é
mais que um número, é mais que um voto em uma pessoa ou em um partido. Com a
certeza de que nosso voto é mais um tijolo numa construção muito maior, muito
mais ampla. É um passo numa caminhada que é árdua, longa e que só pode ser
feita coletivamente. A mudança começa nas cidades porque é lá onde moramos,
porque são as cidades que guardam nosso peito cheio de esperança, nossos punhos
erguidos e nosso desejo de viver em um mundo mais justo, onde todas as pessoas
tenham, minimamente, o direito de ser feliz.
*Jornalista,
pesquisadora sobre comunicação alternativa e popular e doutoranda em
Comunicação na Universidade de Brasília.
Foto: Diego Galba
Veja:
De grão em grão a urna confirma o que se quer https://bit.ly/2U6Twlu
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