21 julho 2021

Mais empulhação?

Remédio para câncer de próstata defendido por Bolsonaro contra Covid-19 levanta suspeitas
Jornal GGN

 

Citada pelo presidente Jair Bolsonaro como o novo medicamento que ele incentiva contra Covid-19, a proxalutamida é um remédio para tratar câncer de próstata, que não tem comprovação científica comprovada nem sequer para este fim. Ainda, supostas pesquisas feitas com o remédio são questionáveis e alvos de investigação.

Nesta segunda (19), a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) autorizou a realização de um estudo clínico para verificar se o remédio defendido por Bolsonaro é seguro ou é eficaz. Mesmo com a autorização, ainda não há dados sobre se o medicamento seria eficaz contra a Covid-19.

As declarações de Bolsonaro foram feitas após sair do Hospital Vila Nova Star, em São Paulo, neste final de semana. Ele disse ter lido “estudos” do Centro de Controle de Doenças dos Estados Unidos que seriam efetivos para a doença. Disse, também, que terá reuniões com o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, para estimular a droga.

Assim como centenas de medicamentos, seja antivirais, antibacterianos, antiparasitas, entre outros, a Proxalutamida também está sendo testada para verificar se tem algum efeito contra os sintomas da Covid-19. Mas, ao contrário dos demais remédios, que apresentaram eficácia contra a doença pela qual foram criados (antiparasitários para combater parasitas, por exemplo), a Proxalutamida não.

A Proxalutamida é um anti-androgênico, que impede a células do corpo reconhecerem os hormônios andrógenos, e está sendo ainda estudado para tratar câncer de próstata e de mama. Mas nem sequer para este fim o medicamento apresentou eficácia nos estudos.

Ainda assim, aceitando a recomendação do mandatário, que disseminou a possibilidade do medicamento para combater a doença da pandemia atual, o ministro da Saúde, disse que o remédio será estudado e testado.

“A proxalutamida está no início dessas pesquisas e precisa estudar mais para verificar primeiro a sua segurança, segundo a sua eficácia, e, a partir daí, se pode ser considerada para o tratamento [da Covid-19]”, disse Queiroga a jornalistas, na manhã desta segunda (19).

Investigação

Ainda em abril deste ano, a imprensa divulgou que os estudos feitos com esse remédio, apresentado somente em uma coletiva no dia 11 de março e conduzido por um dos médicos defensores do tratamento precoce, Alberto Nicolau, têm suspeitas de falhas ou fraudes.

Isso porque, dos 590 voluntários com Covid-19 leve ou moderada que teriam tomado a substância, metade deles recebeu o remédio e a outra um placedo, e ocorreram 12 mortes entre os que foram medicados com o remédio do câncer e 141 entre os que tomaram placebo.

Na prática, foi uma taxa de 47,5% de mortes em pacientes com Covid-19 leve e moderada, muito alta. Mas tais resultados foram comemorados pelos defensores, alegando a comparação entre o placebo e o remédio.

Ao lado de Nicolau, apresentou o suposto estudo o endocrinologista Flávio Cadegiani, que é também o idealizador do polêmico aplicativo TrateCov, criado pelo Ministério da Saúde e que recomendou cloroquina a grávidas e crianças.

Além disso, chamou a atenção o fato de que os resultados teriam sido coletados entre os dias 2 de fevereiro e 22 de março, um prazo considerado “extraordinariamente rápido”. Isso porque o tempo para encontrar os voluntários geralmente é alto, contando com entrevistas, critérios e monitoramento a serem adotados, com rígidos relatórios.

Todas essas suspeitas fizeram com que os supostos testes fossem alvo de uma investigação pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) que será enviado ao Ministério Público, à Anvisa e ao Conselho Federal de Medicina (CFM) para abertura de inquérito.

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