Nos mínimos detalhes
Luciano Siqueira
Sempre me intrigou a verdade cada vez mais comprovada — sobretudo
na atualidade protagonizada pela inteligência artificial, super-robôs e
tecnologias várias — de que a vida se decide nos mínimos detalhes.
Fração de segundos, em inúmeros casos.
Na medicina, cirurgias complexas que não se faziam porque
faltava a garantia da mais absoluta precisão, hoje robôs supervisionados pelo
cirurgião humano salvam vidas e mesmo, em certos casos, a capacidade cognitiva
do paciente.
Nas recentes Olimpíadas de Paris, vimos na TV que um atleta supera
o outro porque um dos dedos do pé escapou um pouco ao controle e o equilíbrio
sobre uma trave ou um tatame não é o mesmo do concorrente que, elevado à
perfeição, faz-se vitorioso.
Pior: mísseis teleguiados ou torpedos mortíferos conduzidos por
drones controlados a centenas de milhares de quilômetros de distância atingem
alvos humanos numa fração de segundos.
Mas a maioria dos 8,2 bilhões de terráqueos poucos se beneficiam
de tamanha precisão. Sequer toma conhecimento disso.
Ou muitos, como eu, nem tiram proveito e ainda perdem uma parcela
do sono noturno envoltos em inapelável inquietação.
Estou entre os que sempre enxergaram beleza nas incompletudes da
vida — no mundo mineral, nas plantas e animais e em nós mesmos.
Afinal, boa parte dos impulsos que alimentam o bom uso das nossas
energias físicas e subjetivas ocorre exatamente na tentativa de suprir
carências e imperfeições.
Fossemos os humanos perfeitos, certamente já não teríamos tanta
necessidade de afeto ou não nos veríamos compelidos pela curiosidade na busca
de saber como as coisas são e como a vida flui.
O traço leve que dá forma e coerência às cores pintadas
pelos expressionistas, os acordes sincronizados de uma trilha sonora e os versos
instigantes de um poema, fôssemos perfeitos e precisos, repito, não fariam
nenhum sentido.
A
beleza da vida sairia pelo ralo.
Mas não me deixo sucumbir pelo espanto de agora na esperança de
que, a despeito dos mínimos detalhes da perfeição científica e técnica,
permaneçam vivos a necessidade do canto do pássaro que se aproxima da janela, o
equilíbrio instável da rosa que brotou aos primeiros minutos da manhã e essa
brisa que, furtiva e insinuante, me acaricia o rosto.
Leia também: https://lucianosiqueira.blogspot.com/2023/05/minha-opiniao_18.html
A riqueza de uma vida sábia está em saber curtir o agora, dando a si a liberdade de contemplar a graciosa mãe natureza que nos abençoa todos os dias com o oxigênio vital a nós, com a brisa singela, o cantar dos passarinhos e com a magia que acalma todos e reduz a ansiedade tão presente na era atual. Tal e qual o saber contemplar o belo, a vida atual exige de todos o equilíbrio no uso correto da tecnologia. Um passo a mais, ou um a menos pode implicar em algo não positivo à nossa mente e ao nosso corpo. Autoconhecimento e respeito: essas palavras resumem bem uma das maiores riquezas da era atual. :)
ResponderExcluirQuanta sensibilidade a sua capacidade de capturar e retratar, através das palavras, as nuances sutis e as emoções do cotidiano.
ResponderExcluirQuerido Luciano! Esse texto é poesia pura! Provocou emoções, me fez valorizar as imperfeições, indagar o que me move. Obrigada por essa rica provocação!
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