02 setembro 2024

Luis Carlos Paes opina

Agosto: mês pleno de acontecimentos históricos que merecem nossa atenção
Luis Carlos Paes de Castro* 


Chegando mais uma vez ao final de agosto é importante resgatarmos alguns episódios da história do mundo e do Brasil, ocorridos neste mês, com o objetivo de recolhermos ensinamentos tendo em vista a construção de um país desenvolvido e emancipado do ponto de vista nacional e social.
 
Em 1939, os soviéticos isolados e sob ataque do liberalismo e do nazismo, concertaram o impensável Pacto Ribbentrop-Molotov. 
 
Foi uma jogada de mestre da liderança soviética que saiu do isolamento imposto pelas potências ocidentais e virou o jogo na antevéspera da segunda grande guerra, permitindo que a jovem república operária, abominada pelo grande capital americano e europeu, ganhasse tempo vital para se preparar para derrotar a máquina de guerra nazista.
 
Em 1945, no dia 6 em Hiroshima e no dia 9 em Nagasaki, o império americano, diante de um Japão já derrotado pelos chineses, coreanos, soviéticos e pelos próprios americanos, decide lançar duas bombas atômicas que destruíram as duas cidades, matando centenas de milhares de pessoas no momento do ataque e nos anos seguintes em função das queimaduras e da radiação. 
 
Foi uma cruel e desnecessária demonstração de força, constituindo-se no preâmbulo da guerra fria que se seguiria por mais de 40 anos, promovendo guerras localizadas, golpes de estado e perseguições contra os comunistas e todas as forças progressistas e patrióticas ao redor do mundo e mesmo no interior dos Estados Unidos.
 
No Brasil, em 1954 e em 1961, duas tentativas de golpe se sucederam. A primeira, contra Getúlio, foi abortada pelo seu suicídio. A segunda, contra Goulart, derrotada pela mobilização cívico e militar comandada por Brizola. Ambas as tentativas foram articuladas pela extrema-direita e contaram com o apoio decisivo de Washington. O golpe só se viabilizaria em 1° de abril de 1964, implantando um regime ditatorial por longos 21 anos.
 
São alguns episódios, entre dezenas de outros, que mostram de forma cristalina a natureza do imperialismo, os interesses que defende e os métodos que utiliza para dominar o mundo.
 
A questão nunca foi a defesa da paz, da democracia ou dos direitos humanos mas sim dos interesses dos grandes monopólios e do capital financeiro, sediados nos países centrais do capitalismo.
 
Conviveram por décadas com o franquismo e o salazarismo na Europa, promoveram golpes e apoiaram governos fascistas na Ásia, na África e na América Latina. Desde 2014, promovem uma guerra contra a Rússia na Ucrânia e apoiam o genocídio do povo palestino pelos sionistas de Israel.
 
Há anos tentam subverter a ordem democrática na Venezuela. Foram várias tentativas de golpe, pesadas sanções econômicas e, agora, recorrem à fraude eleitoral por parte da oposição, seguida de ações violentas, em diversas regiões, praticadas pela extrema-direita, com apoio do Império americano e seus vassalos, com o único objetivo de controlar a maior reserva de petróleo do mundo.
 
Esta conversa das atas das eleições venezuelanas virou um novo mantra que me lembra muito um episódio recente da política nacional, as chamadas "pedaladas fiscais" da presidenta Dilma Roussef. 
 
As tais "pedaladas" se transformaram num chavão, sem qualquer significado, repetido à exaustão pela grande mídia reacionária, conivente com a extrema-direita, objetivando à ilusão de parcelas amplas da população acerca de suposta corrupção no governo da primeira presidenta do Brasil. 
 
Foi o capítulo decisivo e final da guerra híbrida, com a participação direta do Tio Sam, desenvolvida contra os primeiros governos democráticos e progressistas de Lula e Dilma.
 
O inacreditável é que, depois de sofrer na pele, no passado e no presente, o ataque do Império e da extrema-direita tupiniquim a ele associada, setores progressistas sejam capturados pela narrativa mentirosa e acabem jogando água no moinho do imperialismo, condenando a revolução bolivariana e sua tortuosa experiência, em durissimas condições.
 
Os governos de Chaves e Maduro têm resistido ao império e às elites reacionárias venezuelanas que, atuam com ampla liberdade de ação, seja na maioria dos órgãos privados da imprensa local, seja participando de eleições e assim por diante, o que desmente a falsa tese de que naquele país não existiria democracia.
 
A oposição venezuelana, nos últimos 25 anos, comandou e comanda, até hoje, diversos governos regionais e municipais. Já foi maioria no Parlamento nacional e derrotou em referendo realizado em 2007 uma nova constituição bolivariana quando Chaves presidia o país. O que não é possível é forjar vitórias sem votos suficientes e impor, através da violência e do apoio externo, presidentes fantoches como Juan Guaidó, no passado, ou Edmundo González, testa de ferro de Maria Corina Machado, uma golpista que, assim como Bolsonaro está com seus direitos políticos cassados. Na realidade, ela e Bolsonaro já deveriam estar atrás das grades há bastante tempo.
 
Por último, é estranha a posição de Lula que até o momento não reconheceu o resultado das eleições venezuelas, já auditadas pela mais alta corte de justiça do país irmão.
 
É do conhecimento de todos a pressão do Império, da Europa colonialista e de seus aliados internos do Centrão, dos bolsonaristas e da grande mídia sobre Lula para que seu governo não reconheça o resultado das eleições venezuelanas. 
 
Custa-me acreditar que a anterior política externa altiva e ativa esteja sob a ameaça de ser substituída pela velha política do "fala grosso" com a Bolívia e "fala fino" com os Estados Unidos.
 
Não vai ser pelo caminho da conciliação com a extrema-direita e a subordinação ao império que o Brasil vai seguir o caminho de um novo projeto de desenvolvimento nacional soberano, valorizando o trabalho e reduzindo as desigualdades sociais que exige uma política externa que fortaleça o Mercosul, a Celac, o Brics e o assim chamado "sul global".
 
Ainda há tempo para Lula e certa esquerda, influenciada pelo pensamento liberal, retomarem a senda do desenvolvimento soberano e do respeito aos princípios constitucionais da autodeterminação dos povos, da não-intervenção e da defesa da paz.
 
*Analista aposentado do Banco Central e presidente do PCdoB no Ceará

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