03 dezembro 2015

Impeachment é aberração contra a democracia

Um histriônico chacoalha com a democracia

Haroldo Lima, no Vermelho
Um país, como o Brasil, não pode ficar sujeito ao desatino de um político medíocre e corrupto, como Cunha. Uma democracia, como a brasileira, não pode ficar à mercê do revanchismo de um responsável por furtos diversos, como Cunha. Uma chefe de Estado, eleita por 54 milhões de eleitores, não pode sofrer a ameaça de ser apeada do seu cargo pela iniciativa velhaca de um alucinado, como Cunha.
O Judiciário, como instituição, tampouco pode ser aviltado vendo prosperar um processo ilegal por ser inepto, que não poderia ser aberto porque não satisfaz a exigência básica para ter começo, que é a definição prévia do seu rito.
Quando um homem com uma história turva, como Cunha, volta-se contra uma mulher que tem história limpa e de luta pelo seu país, como Dilma, quando a patifaria assume a chefia de um Poder libertado às custas de tantas batalhas para colocá-lo contra a democracia a duras penas conquistada, quando isto acontece, a consciência nacional se constrange, os homens e as mulheres de bem veem-se desafiados, pois os valores estão invertidos e um histriônico está chacoalhando a democracia.
Inversão de valores. Sim. Na quadra atual do Brasil, a corrupção está sendo desmascarada e, às vezes, a mera suspeita leva gente para a cadeia. Pois é nesse momento que o Ministro Teori Zavascki, responsável no STF pela Operação Lava Jato, indagado por que não autorizava investigação sobre Dilma, ou se iria arquivar as denúncias contra ela, respondeu, em 7 de março de 2015 que, no contexto da Lava Jato, “a rigor, nada há a arquivar em relação à presidenta da República”. Deu assim um atestado formal de que, à luz da “narrativa fática” do Lava Jato, nada há contra Dilma.
Mas, dizem os golpistas, se ela não roubou, nem tem conta na Suíça, nem escondeu patrimônios, entretanto praticou “pedaladas fiscais”. Sob esse mote, quer-se dizer que Dilma autorizou o uso de dinheiro do Banco do Brasil e da Caixa Econômica para pagar contas de programas para os pobres, para que os programas não fossem fechados. O dinheiro usado seria ressarcido aos bancos. Ora, uma lei que foi imposta no passado pelo FMI proíbe que isto seja feito. Mas, mesmo assim, não proíbe um adiantamento de curto prazo, para que programas populares não sejam suspensos. No passado, e por outros motivos, presidentes como FHC e Lula também fizeram isto e não foram molestados. Por que com Dilma é diferente?
Ademais, essas “pedaladas fiscais” apontadas contra Dilma aconteceram no seu mandato anterior e a Constituição não permite que chefe de Governo seja investigado por ato praticado fora do mandato em curso.
A Dilma tem um mandato legítimo. Golpeá-lo é arrebentar com a democracia entre nós. Para o país que há pouco tempo passou por 21 anos de ditadura, convivendo com censura, prisões arbitrárias, tortura e morte, isto é intolerável.
Não que se chancele tudo que está sendo feito pelo governo Dilma. Sua política econômica é de matriz neoliberal. Os juros que seu governo pratica são imorais. Os lucros dos bancos enormes.
Suas iniciativas para a retomada do desenvolvimento são tacanhas. Sua apatia ante a mídia hegemônica arrogante e mentirosa é chocante. Mas o Nordeste está passando agora pelo terceiro ano de seca consecutiva. No passado, quando tinha um ano de seca, uma sequência interminável de saques ocorria nos armazéns das cidades interioranas. Eram os famintos arrebatando farinha, feijão e jabá para não morrerem de fome. Durante décadas foi assim, porque assim era a triste história do abandono do homem do campo. Nessa seca brava que já tem três anos não houve nenhum saque. Por causa de Lula e Dilma, sem qualquer dúvida.
Contra Dilma, a oposição golpista – que não é toda a oposição – inspira-se em aforismo do antigo reacionário brasileiro Carlos Lacerda, aquele que esteve à frente da campanha provocadora que levou Vargas ao suicídio e que foi um dos articuladores do golpe de 1964. Em 1950, com a candidatura de Vargas a presidente sendo articulada, Lacerda vociferava: “Vargas não deve ser candidato. Se for candidato, não deve ser eleito. Se for eleito, não pode tomar posse. Se tomar posse, não pode governar. Se tentar governar, deve ser deposto”. Essa é a essência do golpismo.
Quer-se tirar Dilma de qualquer jeito, arranje-se o pretexto.
No atual momento brasileiro, a direita está na ofensiva. Tem consciência de que precisa enganar o povo e jogá-lo contra seus defensores. Sabe que necessita dissimular bastante para fingir que o defende, que defende o país e que é honesta. Tudo mentira.
Mas, passamos por condições difíceis. Fruto da pressão gigantesca de uma mídia hegemônica que tudo distorce, os valores estão invertidos, e muita gente, às vezes inocentemente, é levada a “atribuir a amigos os seus problemas e a inimigos as suas esperanças” (Marx).
No passado, em situação parecida, um grande brasileiro, fundador da República, Rui Barbosa, dizia: “De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto”.
Apesar desse sentimento, apesar dessa sensação, as mulheres e os homens comprometidos com a democracia, o progresso social e a honestidade não se acovardam, não baixam a cabeça, não jogam fora seu passado, vão à luta. O Golpe não passará.
*Haroldo Lima é engenheiro, ex-diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis e consultor da área de petróleo.
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