DCM
Em tom
pessimista, um artigo publicado na última edição da prestigiada revista
americana Scienceavalia que a ciência e o meio ambiente no
Brasil estão “sobre a tábua de cortes” e correm o risco de sofrer retrocessos
diante da atual crise.
“Poucas
semanas após o afastamento da presidente Dilma Rousseff, é difícil afirmar o
que vai acontecer com a ciência e o meio ambiente”, diz o texto, publicado na
última sexta-feira (27/05). “No meio da turbulência política do Brasil,
cientistas e ambientalistas se perguntam se têm no presidente interino Michel
Temer um inimigo.”
A análise
da correspondente para América Latina da Science, Lizzie Wade, aponta que a
incorporação da pasta das Comunicações ao antigo Ministério da Ciência,
Tecnologia e Inovação preocupa a comunidade científica. Ao mesmo tempo,
ativistas reagem com temor à aprovação de uma emenda que derruba o atual
processo de licenciamento ambiental para grandes obras.
“Dias
depois de tomar o poder, ele [o novo governo interino] fundiu os ministérios da
Ciência e Comunicações, deixando pesquisadores com medo do que será feito dos
seus já reduzidos orçamentos”, escreve. Enquanto isso, “forças
pró-desenvolvimento avançam com uma emenda constitucional que pode acelerar a
aprovação de barragens, rodovias, minas e outros mega projetos”.
A intenção
de Temer de cortar os gastos do governo e impulsionar os negócios gera apreensão
nos setores. “Estamos muito preocupados com essas ações, que representam a
degradação da ciência e da inovação no país”, afirma à revista o presidente da
Academia Brasileira de Ciências, Luiz Davidovich.
Danos ao meio ambiente
Segundo
a Science, o projeto de emenda constitucional que
simplifica o processo de licenciamento de obras públicas não ressurgiu na pauta
do Congresso por acidente. Segundo a pesquisadora, parlamentares tentam forçar
a aprovação de assuntos polêmicos que demandam longa discussão em meio ao caos
político.A PEC 65/2012, de relatoria do senador Blairo Maggi (PR-MT) e aprovada
pelo Senado em abril, prevê que nenhuma obra pode ser suspensa ou cancelada
depois da apresentação pelo empreendedor de um simples Estudo de Impacto Ambiental
(EIA). A emenda derruba o complexo processo de licenciamento de três fases
feito pelo Ibama e órgãos estaduais, que exige das empresas a tomada de medidas
de compensação ao meio ambiente.
O projeto
afeta sobretudo a Fundação Nacional do Índio (Funai), diz o artigo: “Sem a
chance de revisar e questionar os documento preliminares de impacto no meio
ambiente, a agência [Funai] não pode garantir a tomada de estratégias de
mitigação para proteger tribos indígenas.”
Danos à
ciência
O
desenvolvimento científico também está sob ameaça com a redução do número de
pastas e o corte de gastos públicos, na avaliação da Science.
A fusão dos ministérios da ciência e comunicações tem “frustrado” os cientistas
brasileiros.
“Reverter
a fusão não deve ser suficiente para proteger o financiamento à ciência”,
escreve Wade. “Antes mesmo do afastamento de Rousseff, a comunidade científica
brasileira já vinha pelejando com cortes severos; em 2015, o governo de
Rousseff cortou o orçamento do ministério da ciência em 25%, e o suporte ao
aclamado programa de bolsas de graduação [Ciência sem Fronteiras] enfraqueceu.”
Entidades
enviaram um manifesto a Temer dizendo que os ministérios não são compatíveis.
“A fusão enfraqueceria o setor da ciência, tecnologia e inovação que, em outros
países, ganha importância”, diz a nota assinada pela Academia Brasileira de
Ciências (ABC) e a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Na
semana passada, cientistas expressaram repúdio à decisão em audiência no
Senado.
“O grito
dos cientistas já tinha que ter sido feito. Vivemos um apagão da ciência no
Brasil há muito tempo”, afirma à DW Brasil Lygia Veiga Pereira, chefe do
Laboratório Nacional de Células-Tronco Embrionárias da USP. “A fusão não é um
bom sinal, porque não há justificativa para unir os dois temas. Mas, num
cenário de crise e cortes, isso não significa que a ciência tenha que ser
deixada de lado.”
Para a
cientista, que está entre os geneticistas mais renomados do mundo, a falta de
vontade política para reduzir a burocracia e aplicar os recursos já disponíveis
de forma mais eficiente são os principais entraves. De acordo com Pereira, o
governo interino precisa reconhecer que, apesar do rombo no Orçamento federal,
o desenvolvimento científico tem um papel fundamental no crescimento econômico
do país.
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