No Vermelho, por Denis Oliveira:
Ação policial no RJ: o risco da militarização da questão social
Comemorado pelo governo do Estado do Rio de Janeiro como a retomada de um espaço controlado pelo “estado paralelo do tráfico de drogas”, a recente operação da polícia no Complexo Alemão mobilizou um contingente recorde de policiais, deixou 19 mortos e gerou muitas controvérsias. Entidades ligadas aos direitos humanos criticaram a operação.
Denúncias recebidas pela Ordem dos Advogados do Brasil indicam que dos 19 mortos, 11 eram inocentes. A Comissão de Direitos Humanos da mesma entidade foi impedida pelo Instituto Médico Legal de acompanhar a necropsia dos corpos. A Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância ) criticou o fato de que a operação deixou crianças sem aula na sexta-feira (22) e tenha espalhado pânico entre os moradores.
O jornalista Maurício Dias, da revista Carta Capital, foi autor da reportagem de capa da publicação que sai neste final de semana e trata do tema. Em entrevista ao site Conversa Afiada, Dias afirma que “a presença do Estado, a força do Estado, que tem o poder, o uso legal da força é o Estado, também causa psicologicamente um alívio, que mostra que o Estado é mais poderoso que os bandidos. Agora tem que ter cuidado com isso. Isso não pode ser feito a qualquer preço por causa da população que está lá, mas é verdade também que, é lamentável essa constatação, mas, ela tem que ser feita, que tem um preço.”
“Higienização” - E é justamente este preço que está sendo discutido. Alguns aspectos contextuais são importantes para refletir sobre este fato. Primeiro, a operação está sendo realizada bem às vésperas da abertura dos Jogos Panamericanos, o que pode dar a impressão de estar fazendo uma “higienização” no município em função do grande evento esportivo. Isto pode ser o ponto de partida para uma militarização conjuntural da cidade nos mesmos moldes instituídos durante a Rio-92.
O próprio Maurício Dias, inicialmente favorável à ocupação da Polícia Militar, ressalta: “É preciso dizer que não basta a polícia. Não adianta nada ocupar; lá já tem dois meses, há quase 50 mortos nesses dois meses. É um número expressivo de mortos. Evidentemente a população local está apavorada também porque ela vive sob tiroteio já há dois meses. É preciso levar depois recursos econômicos suficientes pra não deixar voltar o que era antes, senão esse sacrifício de agora não terá valido nada, terá sido absolutamente em vão.”
Falta preparo - Um outro aspecto a ser considerado é que uma ação baseada apenas na repressão consolida uma cultura autoritária e autônoma presente nos órgãos policiais. A fala de um policial da operação de que foi “como dar tiro em pato em um parque de diversões” mostra o tipo de pensamento que ainda predomina nas forças policiais em que a tônica é concepção militar de destruição do outro e não a função pública de proteção do cidadão.
A negativa de acompanhamento dos membros da Comissão de Direitos Humanos da OAB da necropsia dos corpos, o desencontro de informações (o número de mortos anunciado pelo governo era de 13 depois passou para 18 e, finalmente, 19) e as denúncias de que a maior parte deles não tinha ligação com o tráfico são indicadores do risco para a democracia que é transferir a responsabilidade do problema da exclusão social para uma instituição marcada pelo viés do autoritarismo, da violência e do racismo.
É importante que o problema do tráfico de drogas seja enfrentado corajosamente pelo Estado, mas é preciso que isto não seja feito a qualquer preço, desrespeitando os direitos de cidadania dos moradores dos bairros atingidos e reforçando uma cultura autoritária e repressora presente nos aparelhos policiais.
O jornalista Maurício Dias, da revista Carta Capital, foi autor da reportagem de capa da publicação que sai neste final de semana e trata do tema. Em entrevista ao site Conversa Afiada, Dias afirma que “a presença do Estado, a força do Estado, que tem o poder, o uso legal da força é o Estado, também causa psicologicamente um alívio, que mostra que o Estado é mais poderoso que os bandidos. Agora tem que ter cuidado com isso. Isso não pode ser feito a qualquer preço por causa da população que está lá, mas é verdade também que, é lamentável essa constatação, mas, ela tem que ser feita, que tem um preço.”
“Higienização” - E é justamente este preço que está sendo discutido. Alguns aspectos contextuais são importantes para refletir sobre este fato. Primeiro, a operação está sendo realizada bem às vésperas da abertura dos Jogos Panamericanos, o que pode dar a impressão de estar fazendo uma “higienização” no município em função do grande evento esportivo. Isto pode ser o ponto de partida para uma militarização conjuntural da cidade nos mesmos moldes instituídos durante a Rio-92.
O próprio Maurício Dias, inicialmente favorável à ocupação da Polícia Militar, ressalta: “É preciso dizer que não basta a polícia. Não adianta nada ocupar; lá já tem dois meses, há quase 50 mortos nesses dois meses. É um número expressivo de mortos. Evidentemente a população local está apavorada também porque ela vive sob tiroteio já há dois meses. É preciso levar depois recursos econômicos suficientes pra não deixar voltar o que era antes, senão esse sacrifício de agora não terá valido nada, terá sido absolutamente em vão.”
Falta preparo - Um outro aspecto a ser considerado é que uma ação baseada apenas na repressão consolida uma cultura autoritária e autônoma presente nos órgãos policiais. A fala de um policial da operação de que foi “como dar tiro em pato em um parque de diversões” mostra o tipo de pensamento que ainda predomina nas forças policiais em que a tônica é concepção militar de destruição do outro e não a função pública de proteção do cidadão.
A negativa de acompanhamento dos membros da Comissão de Direitos Humanos da OAB da necropsia dos corpos, o desencontro de informações (o número de mortos anunciado pelo governo era de 13 depois passou para 18 e, finalmente, 19) e as denúncias de que a maior parte deles não tinha ligação com o tráfico são indicadores do risco para a democracia que é transferir a responsabilidade do problema da exclusão social para uma instituição marcada pelo viés do autoritarismo, da violência e do racismo.
É importante que o problema do tráfico de drogas seja enfrentado corajosamente pelo Estado, mas é preciso que isto não seja feito a qualquer preço, desrespeitando os direitos de cidadania dos moradores dos bairros atingidos e reforçando uma cultura autoritária e repressora presente nos aparelhos policiais.