A
estranha (ou talvez não tanto) participação de mercenários estrangeiros no
assassinato do presidente do Haiti
Polícia local confirmou a
participação de 28 pessoas no crime, das quais 26 são colombianos e 2 são
estadunidenses que também possuem nacionalidade haitiana. Em 2020, foram
denunciados dois planos de magnicídio com uso de mercenários dos EEUU, na
Venezuela e na Bolívia - o primeiro fracassou, o segundo não chegou a ser
executado
Victor Farinelli, Carta Maior
O governo do Haiti confirmou nesta
quinta-feira (8/7) que há 28 pessoas vinculadas ao assassinato do presidente
Jovenel Moïse, ocorrido no dia anterior. Segundo as autoridades locais, o mais
chamativo é que todos eles seriam cidadãos estrangeiros.
O investigador Leon Charles, diretor-geral da
Polícia de Porto Príncipe, revelou as informações em uma entrevista que foi
transmitida em cadeia nacional. Ele explicou que 17 pessoas foram presas nas
últimas 30 horas, por seu possível envolvimento com o caso. Entre os detidos,
15 são cidadãos colombianos e dois são estadunidenses que também contam com
cidadania haitiana.
Charles também revelou o nome de um desses
suspeitos: James Solages, estadunidense com nacionalidade haitiana, é apontado,
até o momento, como o provável líder do grupo que realizou o magnicídio.
Além de Solages e dos demais 16 indivíduos
capturados nas últimas horas, a Polícia de Porto Príncipe informou que outras 7
pessoas consideradas suspeitas de participação no homicídio de Moïse terminaram
sendo mortas a tiros durante os operativos de detenção. Também há 4 indivíduos
que ainda estão foragidos.
“Estamos trabalhando para levar os responsáveis à
Justiça”, declarou o investigador durante a entrevista, rechaçando as críticas
de que existe um possível atuar vingativo por parte da sua polícia.
Todos os 7 falecidos eram de nacionalidade
colombiana, assim como os 4 fugitivos, o que, somados aos 15 detidos, eleva a
26 o total de pessoas provenientes do país sul-americano supostamente
envolvidas no crime.
O magnicídio de Moïse
Jovenel Moïse tinha 53 anos e era presidente do
Haiti desde 2017. Seu assassinato acontece a menos de três meses das eleições
presidenciais do país, marcadas para o dia 26 de setembro, nas quais ele
disputaria a reeleição.
O magnicídio ocorreu na madrugada de quarta-feira
(7/7), quando um grupo de homens armados invadiu sua residência particular e o
matou com 12 tiros. A primeira-dama, Martine Moïse também foi baleada e se
encontra hospitalizada e em estado grave – horas depois do ataque, ela foi
levada em avião-ambulância até a cidade de Miami, onde permanece internada.
Venezuela e a Operação Gideon
A participação de mercenários no magnicídio de
Jovenel Moïse chama a atenção. O acontecimento em si marca o primeiro caso do
tipo desde a morte de Salvador Allende, em 1973 – embora o então presidente do
Chile tenha se suicidado, segundo a versão oficial, o gesto ocorreu em meio a
um golpe de Estado violento, que envolveu o bombardeio do Palácio de La Moneda
por parte da Força Aérea chilena.
Entretanto, em 2020 houve dois planos que poderiam
ter feito com que o caso haitiano não fosse o primeiro deste século.
Em maio do ano passado, um grupo de mercenários
(novamente, estadunidenses e colombianos) tentou invadir a costa da Venezuela
por via marítima, em um plano cujo objetivo era chegar até Caracas e assassinar
o presidente Nicolás Maduro.
Os terroristas não contavam com que um grupo de
pescadores atacasse suas embarcações, colaborando com as forças militares, o
que levou a invasão a um fracasso absoluto.
Os envolvidos confessaram formar parte de um plano
chamado “Operação Gideon”, o qual teria sido preparado pela empresa militar
estadunidense Silvercorp, que os selecionou.
Em uma reportagem para a CNN, dias depois da desastrada missão, os
responsáveis pela Silvercorp disseram que quem contratou o serviço foi Juan
José Rendón, um venezuelano que vive em Miami, onde trabalhava, naquele então,
como assessor de Juan Guaidó, o líder da oposição mais raivosa ao governo
venezuelano.
O fracasso da “Operação Gideon” foi o começo do
declínio para Guaidó, que perdeu seu cargo na Assembleia Nacional da Venezuela
em dezembro do mesmo ano – o parlamentar decidiu não concorrer na eleição
legislativa e pregar um boicote ao pleito, o que terminou sendo mais um plano
mal sucedido em seu currículo. Sem cargo, ele também ficou sem qualquer base
argumentativa para sustentar sua versão de que era o “presidente interino” do
país, relato no qual insistia desde janeiro de 2019.
Direita boliviana contra Arce
Outro caso semelhante quase aconteceu na Bolívia,
em outubro de 2020. É o que assegura uma reportagem publicada pelo The Intercept no dia 18 de junho revelando que líderes da
direita do país andino, frustrados com a devastadora derrota eleitoral que sofreram
naquele então – quando Luis Arce foi eleito no primeiro turno, com mais de 55%
dos votos –, planejaram uma operação secreta para impedir que o vencedor
assumisse o cargo.
A vitória de Arce representou a volta ao poder do
MAS (Movimento Ao Socialismo), o partido que governou a Bolívia durante 13
anos, com o presidente Evo Morales. O principal candidato da direita, o
jornalista Carlos Mesa, ficou com apenas 28%.
Esse resultado também significou que o povo
boliviano, em sua maioria, condenou o golpe de Estado de 2019 e o grupo que
tomou o poder pela força naquele então. Tanto é assim que, além de vencer as
presidenciais, o MAS também garantiu uma clara maioria no parlamento.
Diante desse cenário desastroso, o grupo político
que chegou ao poder com o golpe preparou uma estratégia para não ter que
entregar o poder aos eleitos, baseado no uso de mercenários contratados para
invadir o país e assassinar Arce. O responsável por colocar o plano em prática
foi Luis Fernando López, então ministro da Defesa do regime de Jeanine Áñez, a
presidenta imposta no poder pelos militares bolivianos, em novembro de 2019.
A matéria do The Intercept inclui áudios, e-mails e documentos que
comprovam a contratação do grupo de mercenários norte-americanos, através de
uma empresa com sede em Miami, para que realizassem uma ação militar com apoio
de altos oficiais das Forças Armadas bolivianas alinhados a setores de extrema
direita.
Segundo o texto dos jornalistas Laurence Blair e
Ryan Grim, “vários dos conspiradores discutiram o envio de centenas de
mercenários estrangeiros para a Bolívia, a partir de uma base militar
estadunidense nas proximidades de Miami. Em La Paz, eles se reuniriam com
grupos de militares e de policiais aposentados, todos fieis à direita boliviana
e convencidos de que era preciso evitar o retorno da esquerda”.
O plano também contou com o apoio do então
ministro de governo, Andrés Murillo, que foi recentemente detido nos Estados
Unidos, devido ao seu envolvimento em casos de corrupção. No final, a operação
nunca foi executada, mas tampouco apagou as evidências de sua planificação.
Acreditar em bruxas
Por enquanto, são três casos: um na Venezuela, que
terminou fracassando, outro na Bolívia, que não chegou a ser executado, e um
terceiro no Haiti, que aconteceu e teve sucesso. Os três são ligados pela
utilização de mercenários e pela participação de empresas ou de cidadãos dos
Estados Unidos e da Colômbia, com os estadunidenses encabeçando os planos.
Mas, por enquanto, todos esses elementos são
apenas coincidências, não há evidência clara de que exista uma ligação entre
eles.
Sobre a ligação do governo estadunidense com esses
planos, existe apenas uma questão: no caso da Operação Gideon, sabe-se – também
graças a reportagens publicadas na imprensa dos Estados Unidos – que a empresa
Silvercorp, que apoiou a fracassada invasão de mercenários à Venezuela,
trabalhou na escalação de pessoal de segurança para eventos da campanha
eleitoral de Donald Trump. O que, ainda assim, continua dentro do campo das
coincidências.
O problema é que já são três coincidência em
apenas 15 meses. Um prato cheio para aqueles que não acreditam em bruxas,
pero...
.
Brasil - Na luta política, todo apoio é bem-vindo https://youtu.be/v8gcgIN23b8
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