28 fevereiro 2021

Futebol em roda viva

 

O futebol não descansa e ainda contribui para as aglomerações

Copa do Brasil começa a ser decidida neste domingo, enquanto outros torneios se iniciam

Tostão, Folha de S. Paulo

 

O Flamengo é bicampeão brasileiro. Neste domingo (28), começa a decisão da Copa do Brasil, entre Grêmio e Palmeiras. Iniciaram também os estaduais, a Copa do Nordeste, a Libertadores e outras competições. O futebol não descansa e ainda contribui para as aglomerações. Algumas pessoas perderam a dimensão da gravidade. Parece um prolongado suicídio coletivo.

Ao mesmo tempo em que estou cansado, com um ano de quarentena, de ver tanto futebol, programas esportivos e noticiários, que costumam ser iguais, a responsabilidade e o prazer de escrever, de ver belas partidas e a convivência com as pessoas queridas me ajudam a suportar essa tragédia. A vacinação, que está muito lenta, é a esperança. Aguardo, com paciência, a minha vez.

Em um campeonato por pontos corridos, no fim, predomina a qualidade do elenco, com algumas exceções. O Flamengo, apesar da má atuação, da derrota para o São Paulo, de ter levado um grande número de gols na competição e de outros atropelos, venceu porque tem melhores jogadores. Faltou ao Inter mais talento individual, além de ter vivenciado mais uma decisão polêmica, a não marcação do pênalti a seu favor, que poderia ter mudado a história do campeonato.

O Atlético-MG teve excelentes momentos, contratou muitos bons jogadores, mas não do nível dos que tem o Flamengo. O São Paulo surpreendeu, chegou perto do título, mas se liquefez, por vários motivos, principalmente pelo modesto elenco. A estratégia defensiva usada contra o Flamengo funcionou bem, mas para esse jogo e para esse momento.

Na Europa, o futebol também não para. Bayern e Manchester City são os times que têm atuado melhor. O PSG, com Neymar e Mbappé e, agora, com um técnico melhor, Mauricio Pochettino, é também forte candidato ao título europeu.

Guardiola, no início do Campeonato Inglês, teve uma crise de anormalidade, de mesmice, e escalou a equipe como a maioria dos outros técnicos faz com seus times. Deu errado, e ele voltou à lucidez, ao jogar apenas com um volante, dois meias avançados e com o ótimo lateral esquerdo Cancelo como um armador, próximo ao volante.

Filipe Luís joga mais ou menos assim no Flamengo, mas o time não tem um ponta aberto. Fica embolado pelo meio. Rogério Ceni pede para Bruno Henrique atuar mais pelo lado, mas ele brilha quando entra pelo meio, para finalizar e fazer dupla com Gabigol.

No jogo entre Borussia Monchengladbach e Manchester City, em Budapeste, na Hungria, em campo neutro, por causa dos problemas de entrada e saída de pessoas em alguns países, o bom comentarista Bruno Formiga, da TNT Sports, contou que o pai dele viu, no estádio, em Budapeste, o Honvéd jogar. A base da seleção húngara de 1954, um dos mais espetaculares times da história, onde jogava Puskás, que eliminou o Brasil da Copa do Mundo.

Imediatamente, lembrei-me da derrota do Brasil para a Hungria, em 1966, por 3 a 1. Fiz o gol da seleção. Eu tinha 19 anos. Ao falar da Hungria, lembrei-me também, do belo livro "Budapeste", escrito por Chico Buarque. Coincidentemente, comecei a ler o livro "O ar que me falta", de Luiz Schwarcz, fundador da editora Companhia das Letras, que narra a chegada ao Brasil de seus antepassados, vindos da Hungria.

Por tudo isso, passei a fazer planos de viajar a Budapeste, cidade que sempre pensei em visitar.

A mente funciona por meio de associações de ideias, de fatos e de sentimentos. As lembranças e os encontros são reencontros com o que vivemos e/ou imaginamos.

Veja: Imunidade parlamentar pra quê? https://bit.ly/2ZHFqJV

Arte é vida

 

João Câmara

Crônica de domingo

 

Definição do rapaz

Paulo Mendes Campos

 

 

Em 1946, Rubem Braga e eu, então moradores de uma casa à rua Júlio de Castilhos, resolvemos estudar inglês. Um anúncio de jornal nos fez decidir sobre o professor. Nós lhe telefonamos, ele veio, combinou-se o preço, aulas três vezes por semana.

Tratava-se de um inglês alto, de testa estreita, cinquentão. As aulas, às oito horas da manhã, para dizer a verdade, não eram muito excitantes. A fim de fugir delas, passamos a usar do expediente primário de mandar a cozinheira dizer que não estávamos em casa. Entretanto, o empedernido súdito de sua majestade não acreditava na desculpa:

– Oh, as preguiçosos ainda eston no cama.

E gritava escada acima:

– Mim está aqui esperando preguiça brasileira.

Não havia jeito, senão descer. E tome verbo irregular. Incapazes de liquidá-lo, sugerimos que, em vez de gramática, fôssemos traduzindo obras literárias, que isso era mais agradável, etc. Foi o diabo. Não me lembro de ter visto, em toda a minha vida, mais inenarrável expressão de estupor do que o dia em que traduzimos um soneto de Ezra Pound, em que o poeta se dizia uma árvore de galhos abertos, no meio de um bosque. O professor arregalou os olhos com um tal brilho de incompreensão total e absoluta da imagem poética que fomos obrigados a desistir definitivamente da poesia. Nunca mais se falou nisso.

E como as aulas subsequentes continuassem monótonas, apelamos para a prosa. A fim de aliciá-lo, procuramos afagar seu nacionalismo falando em Bernard Shaw. Pasmem-se os incrédulos. O mestre fez um ar polido de curiosidade e perguntou:

– Bernard Shaw? Quem é ele?

Pois o homem não estava fazendo humour não. Era no duro, nunca ouvira falar em Bernard Shaw. Trouxemos, então, a peça Androcles and the Lion e começamos a traduzi-la. Dessa vez, a coisa ia melhor. O professor mostrava algum interesse pelo enredo e, para a nossa admiração, pediu o livro emprestado, a fim de lê-lo em casa.

Levou uma semana com o livro. E um dia veio até nós com o ar astuto de quem descobriu a brincadeira que estão preparando para ele. Entregou-nos o livro se rindo muito:

Mim pensou que era coisa séria.

– I beg your pardon, exclamamos em coro.

– Essa peça é somente um joke, disse ele. Leão no fim dança com homem. Ih, ih, ih.

[Ilustração: Pindaro Castelo Branco]

Veja: Imunidade parlamentar pra quê? https://bit.ly/2ZHFqJV

 

Humor de resistência

 

Charge de Gilmar

Lockdown inevitável

Com o acelerado avanço pós-carnaval da pandemia de Covid-19 no Brasil, é cada vez maior o risco de colapso no SUS (Sistema Único de Saúde). Especialistas no setor recomendam a urgente adoção do lockdown para “salvar a saúde pública” e evitar uma tragédia de proporções ainda maiores.“Neste momento, eu fecharia tudo”, resume o médico Gonzalo Vecina Neto, fundador da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e ex-secretário de Saúde de São Paulo (SP). “Tudo indica que estamos diante de um colapso. Como não temos governo federal, a decisão de lockdown – de pelo menos duas semanas – deve ser tomada pelos estados, de acordo com o clima que estão vivenciando.” Leia mais https://bit.ly/3kuchM5

Golpismo insidioso


Estapafúrdio produzido por Bolsonaro e apoiado por generais tem a ver com intenções definidas

Intenções inconfessas que enlaçam as atitudes do presidente têm corrido sem dificuldade

Janio de Freitas, Folha de S. Paulo

 

A incógnita mais expressiva, dentre as muitas atuais, é simples como formulação e inalcançável na resposta. Dado que estão explicitados os indícios de golpismo e a incompetência espetaculosa dos militares no governo, o que fará o Exército na possível transformação da pandemia em tragédia de massa, um país sufocado pela peste, carente de tudo menos de morte?

A marca de um ano exato do primeiro caso de Covid-19 no Brasil encontrou os estados em desespero com o recorde de casos e a ausência de leitos, vacinas, pessoal e outros recursos. Uma antevisão das previsões e alertas que as vozes mais competentes estão fazendo, inclusive a Organização Mundial da Saúde, caso persista o incentivo de Bolsonaro e do seu governo à calamidade.

O já célebre depoimento do general Eduardo Villas Bôas sobre a ameaça que fez ao Supremo, em nome do Exército, é claro na desmistificação da conversão desses militares ao Estado constitucional de Direito e à democracia.

Ressalva a fazer-se é a ausência até de mera informação aos comandos da Marinha e da FAB sobre a ameaça, como dito pelo entrevistado. Risco de discordância, é claro. E isso, não sendo certeza, pode ser indício de promissora evolução na Marinha e na FAB, oficialidades muito mais dotadas de preparo geral, para civilizar-se, do que no Exército.

Já é bem difundida a impressão, ou a convicção, de que todo o estapafúrdio produzido por Bolsonaro e apoiado pelos generais tem a ver com intenções definidas. Há bastante coerência nos atos amalucados, que são bem aceitos pelos generais também por uma comunhão não declarada nem gratuita.

A propaganda do falso tratamento com cloroquina cedo se mostrou como objetivo. Não só para desacreditar as recomendações científicas. Também para ações de governo que custaram milhões ao dinheiro público —e aí estava o Exército a fabricar quantidades montanhosas da droga enganadora.

O próprio Ministério da Saúde, o mais militarizado setor civil da administração pública, foi posto como indutor da droga ineficaz. Bolsonaro continua condenando as máscaras e estimulando aglomerações. E, sobre tudo o mais, a sabotagem a vacinas excedeu a incompetência. É muito mais e muito pior.

Por trás disso houve e há algo. Esse desatino não resistiria, para chegar à dimensão que alcançou, sem um propósito a sustentá-lo.

Não faz sentido o envolvimento, sem motivações especiais, de um governante em propaganda de remédio e em combate ao conhecimento científico provado e comprovado. Com esse meio de disseminar a morte, porém, combina-se um outro de fim idêntico.

No seu primeiro ato pela difusão da posse de arma, Bolsonaro alegou direito da cidadania de se defender. Sucessivos agravamentos dessa facilitação à criminalidade chegaram, agora, ao desmentido definitivo do propósito apresentado por Bolsonaro: novos decretos permitem até 15 armas para o cidadão comum, 30 armas para quem se apresente como caçador, 60 armas para quem se registre como atirador, munição a granel. Arsenais sem relação alguma com defesa pessoal. Mas não sem objetivo de quem os libera e dos militares, em especial do Exército, que dão o apoio.

As intenções inconfessas que enlaçam as atitudes de Bolsonaro, em temas como a pandemia e o armamento de civis, têm corrido sem dificuldade. Mas alguma coisa mudou nas últimas semanas. O Supremo mudou. Por quanto tempo e se para ser supremo sem temor e sem prazo, no momento, importa menos. Aproveite-se enquanto dure, que a necessidade do país é extrema.

Quando quatro ministros do STF decidiram trabalhar nas férias de dezembro e janeiro, a boa novidade foi noticiada como precaução contra propensões do recém-eleito presidente Luiz Fux. Revelou-se muito mais do que isso.

De Ricardo Lewandowski vieram, e continuam vindo, decisões que enfrentam desvios na política antivacinas do governo, o mesmo quanto às mais recentes revelações de ordinarices judiciais, políticas e policiais na Lava Jato, e outras de mesmo peso.

Alexandre de Moraes encarou, e não tem cedido nem milímetros, as ameaças ao Supremo, as patifarias nas redes, os indícios que recaem na Presidência da República.

Rosa Weber deu ao governo cinco dias, expirados ontem, para justificar o pacote das armas. Edson Fachin tomou a defesa verbal do Estado de Direito. E vai o Supremo por aí, ou parte dele, mudado, posto de pé e cabeça erguida.

Os negociantes do Congresso continuam negociando. O poder econômico, idem. Se a defesa da democracia não vier do Supremo, talvez só tenhamos resposta para a incógnita de Bolsonaro sob a forma de fato consumado. E a pandemia, como se agrava aqui, facilita.

Veja: Imunidade parlamentar pra quê? https://bit.ly/2ZHFqJV

Frente ampla

A pedagogia da frente ampla: unidade, tática e compromissos

Wallace Melo

 

Ao tratar sobre algumas experiências vivenciadas no Chile, o professor Paulo Freire explicou que em dados momentos, é preciso juntar os diferentes para combater o antagônico. Uma afirmativa que, embora distanciada por mais de cinco décadas de nossa atual realidade, tem o potencial de nos ensinar importantes lições, sobretudo acerca do caráter pedagógico do advento de frentes amplas, haja vista as conturbações políticas;

É bem verdade que a convergência de diferentes forças em uma só frente ampla, não é algo tão simples, a ponto de reduzirmos os movimentos a meras alianças pontuais. Quem acredita nisso, está incorrendo em gravíssimos erros de análise. Nesse sentido, é importante perceber e atribuir atenção especial aos motivos que causam a emergência de coalizões políticas de amplitudes maiores e plurais. 

Quando se estabelece uma circunstância que implica o surgimento de frentes amplas, é porque, com absoluta certeza, temos um horizonte pautado por correlações de forças desproporcionais, tendo assim, o hegemonismo exacerbado em um ou poucos polos de poder, em detrimento dos demais grupos ou frações políticas. Analisar bem a natureza desse ambiente desfavorável para muitos é um exercício primordial para entendermos os porquês da instituição de movimentos com maiores amplitudes.

Ora, não é prejuízo dizer aqui que, se uma determinada força política reunisse sozinha, as condições e força para derrotar quaisquer circunstâncias hegemônicas, assim ela a faria, sem a anuência de outras formas de organizações ou agremiações.

Contudo, o exercício de unir diferentes visões, na intenção de resistir e combater determinada realidade não é fácil para qualquer organização política, sobretudo aquelas que cultivam princípios filosóficos e conteúdos programáticos mais sólidos. Porém, mesmo percebendo as dificuldades para essas movimentações, também é importante salientar que esses expedientes são potencialmente ricos em aprendizados, experiências e, principalmente, para reafirmar, dentro dos nossos fronts, alguns compromissos ideológicos.

No escopo das alianças políticas e na construção de uma frente ampla, como diz o camarada Luciano Siqueira, “dá-se a unidade e a luta ao mesmo tempo”. Ou seja, é compor e marchar junto ao conjunto de setores envolvidos, respeitando a diferença entre os presentes e sempre reafirmando  e defendendo seus valores e concepções ideológicas e estratégicas. Um instrumento de singular importância que contribui bastante para o sucesso das movimentações aliancistas, se estabelece na construção de conteúdos programáticos que sirvam de alicerce e intersecção entre os envolvidos.

Já o camarada Renato Rabelo já sinalizou a outrora que uma “aliança é compromisso político e não ideológico”. Reflexão essa de suma relevância, sobretudo no entendimento da tática. 

Outro elemento pertinente ao debate posto se estabelece com as possibilidades trazidas pelas movimentações aliancistas para construção de uma frente ampla é a capacidade de mobilização popular, pois são por meio desses expedientes plurais e democráticos, que aumentam as possibilidade de aglutinação das massas e diferentes setores que, comumente não dialogamos ou não estão dispostos em nossos radares. 

E por qual motivo esse fato é relevante? A frente ampla promove diferentes lampejos de consciência política, normalmente embasado em fatores mais pontuais, economicistas ou de interesses pragmáticos. Contudo, é oportuno aproveitarmos esse movimento para reforçar a defesa por um programa mais amplo e fundamentado, sobretudo nas concepções revolucionárias e socialistas.

Ou seja, ao invés de nos embebedarmos nas críticas infundadas, rasas ou vazias, que em muitos termos, nada dizem ou só alimentam um falso criticismo pequeno burguês, é possível, nos expedientes mais amplos, avançarmos – nos dizeres de Engels – metodicamente na condução de uma luta embasada teórica, política e economicamente classista. Trazendo assim análises mais complexas e cientificamente embasadas. Ora, “sem teoria revolucionária, não há movimento revolucionário”, assim percebia Lênin.

Dessa maneira, é imperioso combater algumas opiniões oportunistas que circulam (rapidamente) em nossos meios, que o estabelecimento de uma frente ampla, signifique ou reduza-se a acordos pontuais ou a efetivação de barganhas axiomáticas. Pelo contrário. No exercício de diálogo com os diferentes, temos mais a obrigação de reafirmar nossos compromissos programáticos e ideológicos, e por meio desses, apontar, na centralidade da política, o necessário combate às causas geradoras e antagônicas à frente ampla.

Wallace Melo Barbosa – Professor, humanista e secretário de formação do Sinpro Pernambuco

Veja: A vida vem mostrando o tamanho real da vitória de Bolsonaro nas eleições para a presidência da Câmara e do Senado https://bit.ly/3pCgM8n

27 fevereiro 2021

26 fevereiro 2021

Anomalia

 Será verdade que Bolsonaro cogita promover o general Pazuello para grau hierárquico inexistente no Exército como saída honrosa (sic) do ministério da Saúde? Aí de ti, República!

Na mira

O Parlamento da Austrália adota Lei que obriga gigantes da tecnologia, como Google e Facebook, a remunerarem veículos de comunicação pelo uso de notícias. Uma Lei assim vingaria no Brasil?

Ao fundo do poço

Analistas do Mercado preveem “recessão técnica no primeiro semestre deste ano”.

Tradução: crise econômica seguirá se agravando sob a tutela de Bolsonaro-Paulo Guedes.

Palavra de poeta

 

A ONÇA DA ESPERANÇA

Marcelo Mário de Melo

 

Entrando em corpo de onça

a Esperança no ataque

em vez de esperar o lance

pega a bola dá o saque

entoa o grito de alerta

toca corneta e atabaque.

Afia as garras e parte

removendo entulho e tralha

ferrugem mofo zinhavre

lacuna trava e falha

veste roupa de combate

arranca trapo e mortalha.

A Esperança agora

atiça o amanhecer

vai a campo e observa

o que faz esmorecer

os descaminhos nas mentes

e nos modos de fazer.

Para o sonho avançar

é preciso trilha certa

semente sã e cuidado

janela ampla e aberta

o sol da veracidade

aceno e grito de alerta.

A Esperança é uma malha

feita em ampla tecelagem

uma colcha de retalhos

de persistência e coragem

juntando peça por peça

em gesto ação e linguagem.

A onça da Esperança

depende assim desses fios

por isso ela observa

nascentes brotos pavios

o mar querendo saber

se correm certos os rios.

A força da Esperança

se constrói na pedra dura

no olho desamarrado

no combate à impostura

na peneira onde se lavam

o erro e a amargura.

Ela não é menininha

princesa em conto de fada

madame ou cortesã

inocente namorada

mas mulher experiente

subterrânea e alada.

A Esperança exigente

quer ver o ponto no nó

alicerces e estacas

a mistura a massa o pó

a ferramenta afiada

quem afia e a pedra-mó.

 

[Ilustração: Montez Magno]

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Veja: Não é fácil, mas saber onde pisamos nas redes sociais importa para que não nos deixemos manipular mais do que o inevitável pelo jogo de algoritmos https://bit.ly/2ZzvEJO

Nas redes

Amiga no WhatsApp:

- Dr. Luciano, se eu tivesse dinheiro alugaria 40 carros de som para denunciar o descaso de Bolsonaro com a pandemia e o desemprego!

- Esqueça os carros de som, use as redes sociais. Já ajudará muito.

Angu de caroço

Exército decide retirar tropas que fazem segurança da maior apreensão de madeira da história do Brasil e Polícia Federal reage à decisão do Exército e ameaça abrir inquérito contra militares que abandonarem operação contra madeira ilegal.

Isto significa o quê?

Colapso da saúde pública

Após um ano de pandemia, será difícil conter colapso da saúde no país

O infectologista Marcos Boulos afirma que não se trata mais de saber se outras cidades viverão o colapso de Manaus, mas quem será a primeira. Nas condições sanitárias atuais, ele não vê meios de evitar isso.

Portal Vermelho

 

Foi num dia 26 de fevereiro que se registrou o primeiro doente de covid-19 no Brasil. Um ano depois, são 10.390.461 diagnosticados com o novo coronavírus e 251.498 mortos, sendo que os últimos dois meses testemunharam uma aceleração de contágios e mortes maior que todo o ano de 2020.

Para analisar esse quadro aterrador, o portal Vermelho entrevistou o infectologista Marcos Boulos, que se mostrou pessimista com as próximas semanas da pandemia. Para ele, o quadro só tende a se agravar, pois não há muito a fazer para diminuir a circulação do vírus. “Só se todo mundo ficasse dentro de casa. Mas o que vemos é que a população já assumiu a premissa de não fazer nada para evitar o contágio. Há um clima de retomada de atividades produtivas num momento de agravamento enorme da pandemia”, lamentou.

Considerando isso, para ele, o colapso do sistema de saúde, aos moldes do que ocorreu em Manaus, é certo. Ele avalia que Manaus foi a cidade que menos seguiu protocolos de distanciamento social e “ainda preconiza tratamento precoce totalmente ineficaz contra a doença”. “Agora, resta saber qual cidade vai entrar no caos primeiro. O ABC paulista já está colapsando e Campinas também aponta para isso”, observou. Boulos percebe que há cada vez menos distanciamento social, uso de máscara e higienização.

Mas o médico e consultor do governo paulista também apresenta fatores novos que tornam o contágio pior que na primeira onda da pandemia. “Há o surgimento de novas cepas com disseminação muito maior que antes”, admite.

Ele também inclui as condições hospitalares piores que no início da pandemia. “O começo da pandemia uniu o país para enfrentar a doença. Agora, no retorno do alto contágio, não temos mais as condições hospitalares que tínhamos antes, já que hospitais de campanha foram desmontados e o leitos foram reocupados por outras patologias”, justifica. Esta diminuição de leitos para covid-19 ocorre no momento mais intenso de contágio e agravamento da doença.

O infectologista não flexibiliza sua opinião sobre a necessidade de medidas rigorosas para evitar um colapso cada vez pior do sistema de saúde, com aceleração desenfreada de mortes. Os governos são pressionados pelos mais diversos setores econômicos para não instaurar lockdown. Restaurantes dizem que implementam protocolos sanitários, mas têm que fechar, enquanto festas clandestinas se espalham pelas cidades.

“Restaurantes e bares nem deviam estar funcionando, pois dados internacionais mostram que estes foram os ambientes onde mais houve contágio. As pessoas não usam máscara para comer ou beber num lugar desses”, sentenciou. Ele também diz que as festas clandestinas são um problema sério para o poder público, que tem dificuldade para coibí-las. “Precisa prender as pessoas que participam disso”, defende ele.

Diante da dificuldade de impor lockdown, os governos apontam para toques de recolher à noite para evitar as festas e aglomerações de jovens. Isso ajuda? “Tudo que puder fazer para diminuir a circulação de pessoas ajuda, mas é insuficiente. Precisa arrochar mais que isso”, reafirmou.

Podia ser melhor? Podia ser pior? Sim para os dois. “Se houvesse decisão centralizada no governo federal, dando orientações de controle padronizadas dizendo tudo que se pode ser feito para impedir a circulação do vírus, tendo testes suficientes e ampla vacinação, a doença teria tido menos impacto”, supôs. “Mas podia ser pior se não fosse feito nada para garantir o distanciamento social, o uso de máscara. Estaríamos no caos total!” completou.

Devagar, quase parando

Boulos também analisou a lentidão da vacinação no Brasil. Se por um lado, a novidade da doença e da vacina trazem o desafio de garantir fabricação de 14 bilhões de doses, algo que ele considera improvável, por outro, o Brasil demorou muito para entrar na competição internacional pelos imunizantes.

“Vai demorar muito tempo para haver vacina suficiente para o mundo todo, mas o Brasil fez apenas duas parcerias com farmacêuticas, por meio da Coronavac do Butantan e da Oxford/Astrazenica da Fiocruz. Teria que comprar mais opções de vacinas, como a Sputinik V, a vacina da Pfizer, da Moderna, entre outras disponíveis”, criticou.

Para o médico, a parte social deveria ser considerada na prioridade para vacinação. Ele repercutiu estudo geoterritorial que mostra as periferias pobres das cidades mais vulneráveis ao contágio, portanto prioritárias para a imunização. “Há uma compreensão de que a vacina não impede totalmente o contágio, mas evita agravamento e risco de morte, por isso, a prioridade para profissionais de saúde e idosos. Por outro lado, a exposição dos trabalhadores, jovens e idosos da periferia é muito maior, provocando essa fragilidade social. Por isso, é menos indicada a vacinação em empresas privadas, que podem garantir o distanciamento social e quarentena de seus profissionais”, defendeu.

Boulos também comentou o estudo da Faculdade de Saúde Pública da USP, que analisou normativas do governo federal sobre a pandemia. Os pesquisadores demonstraram que havia uma estratégia deliberada do governo de promover a imunidade coletiva no Brasil, que foi frustrada pelo Poder Legislativo, pelo Poder Judiciário e pelos governos locais.

“A imunidade coletiva só faz sentido para um governo louco, que quer fazer morrer mais gente”, declarou. Ele comparou os 30 milhões de mortos durante a gripe espanhola, no início do século XX, quando não havia vacina, nem medidas sanitárias e a população era dez vezes menor. “Imagina deixar 212 milhões de pessoas se contaminarem! Um por cento de letalidade significaria mais de 2 milhões de mortos em poucos meses. Realmente, a pandemia acabaria mais cedo, mas a que custo?”, questionou. Ele ainda mencionou o exemplo chinês, com seus 1,4 bilhões de habitantes, não tomando as providências que tomou para evitar o contágio generalizado.

Leia também: Após um ano do primeiro caso, Brasil tem recorde de mortes por covid

Veja: Na resistência democrática, todos os caminhos são válidos https://bit.ly/3cXUHhK

Genocida

A insensibilidade do governo Bolsonaro, que se exime da responsabilidade de enfrentar a crise sanitária, abre uma ferida dolorosa que permanecerá como dos momentos piores da história do Brasil. www.twitter.com/lucianoPCdoB

25 fevereiro 2021

Direito ao voto

A conquista histórica do sufrágio feminino no Brasil completa 89 anos nesta quarta-feira (24). O voto é um direito de todo brasileiro acima de 16 anos para escolher a classe dirigente do país. Graças a universalidade do voto, todos têm a chance de ir às urnas manifestar suas preferências e convicções em um futuro melhor para o país. Mas nem sempre foi assim. Há 89 anos, no dia 24 de fevereiro de 1932, as mulheres conquistavam o direito de votar. Leia mais https://bit.ly/3dJNGBp 

 

Buruçu no meio do campo

 


O punhado de sal

Walter Sorrentino, no Blog do Renato

 

O presidente ataca o bastião do liberalismo com a intervenção na presidência da Petrobras. A reação é medonha, de A a Z da mídia e do mal chamado senhor Mercado – este no caso, nacional e internacional.

Bolsonaro quer popularidade, espera contornar a crise com os caminhoneiros, quem sabe baixando temporariamente o preço dos combustíveis. Bolsonaro sabe que o papel do Estado dá popularidade (ora vejam) em particular no que concerne à maior e mais avançada empresa criada pelos brasileiros por várias décadas, desde “O petróleo é nosso” até a descoberta do Pré-Sal. O poder da caneta presidencial é imenso, não é de se subestimar.

Mas o governo está em declínio progressivo, enfraquecido com os desdobramentos deste terrível início de 2021 para o país, particularmente pela ruinosa gestão do enfrentamento da pandemia e o fim do auxílio emergência. Se vê crescentemente enquadrado em seus intuitos autoritários. Busca caminhos para sua estratégia básica, que não é salvaguardar a nossa soberania, mas sua reeleição em 2022. A vida não está fácil para o governo.

Enquanto isso, no Congresso se articula a PEC Emergencial que propõe dar um tiro de misericórdia nas verbas obrigatórias para a Educação e Saúde. Em meio a uma escalada de 10 milhões de casos de COVID-19 e 250 mil mortes pela doença. Em meio a um ano perdido no calendário das escolas, que marcará para sempre uma geração inteira de estudantes no ingresso à vida profissional.

Os presidentes do Congresso veem a brecha para serem os avalistas da agenda econômica falida. O Centrão, com isso, eleva o cacife para cobrar a sustentação ao governo, enquanto se apoderam de nacos de poder para o fortalecimento de seus partidos; o maior de todos é o objetivo de Artur Lira de que os deputados “governem” o orçamento. Ficam à disposição de Bolsonaro, quem sabe, ou fortes para detoná-lo se necessário, criando uma alternativa de nome para a eleição presidencial.

O país segue à deriva, o governo é trôpego; o desencontro de agendas entre a sociedade, o governo, o Congresso e os setores econômicos são uma babel. Não há consensos nem força para construí-los e hegemonizá-los. A vida não está fácil para nenhum bloco.

No governo, Guedes é apenas um espectro: o presidente atual da Petrobras é um dos quatro centuriões que indicou a Bolsonaro e já caíram; os militares estão colhendo o desprestígio que semearam com o apoio e presença maciça no Executivo; o núcleo ideológico está na defensiva e enfraquecido pelos fatos que levaram à prisão o deputado criminoso confesso; a famigerada toga já foi defenestrada do governo por Bolsonaro e a Lava Jato colhe derrotas sucessivas de sua ofensiva de perseguições jurídicas subversivas.

No establishment econômico as divisões prosperam quanto a o-que-fazer. Mas enquanto predominar a atitude ir levando com um governo mequetrefe, para ficar com a galinha de ovos de ouro das “reformas”, serão os principais responsáveis históricos por quebrar o país, em mais uma década perdida com essa agenda econômica senil.

O que o Brasil precisa é de proteger as vidas, implementar um robusto e seguro programa de vacinação, aprovar imediatamente um auxílio-emergência de R$ 600,00 até dezembro, em ampla escala e renovável enquanto não se debela a taxa de transmissão da COVID-19 (RT < 0,9). Não se pode levar adiante a satânica agenda de teto de gastos, regra de ouro e outras, em meio a tal situação. É preciso superar esse fiscalismo perante uma crise humanitária e uma economia em depressão, financiando a emergência com títulos públicos a serem adquiridos pelo Banco Central, “marcados” para contabilizá-los para a dívida pública.

Mas as saídas são políticas. É preciso uma forte e ampla oposição, de geometria irregular segundo se trate de defesa da democracia, da agenda econômica e dos direitos sociais, civis e humanos. Foi marcante o gesto da cantora Teresa Cristina na entrevista ao Roda Viva, dedicando a eles uma música conclamando Lula, Flávio Dino, Boulos e Freixo a se unirem para dar uma esperança e perspectiva aos brasileiros.

Ela fez como apanhar um punhado de sal à beira-mar, de Gandhi, que desatou a independência da Índia do império inglês. Gestos são importantes. É disso que precisa a oposição, ecoando o poderoso anseio de unidade das forças progressistas, que é bem maior do que os intentos, legítimos que sejam, de quaisquer das legendas partidárias.

Nada é mais importante que isso hoje. Uma foto e uma mensagem de todas as nossas lideranças – esse será nosso “punhado de sal”. Trata-se de sinalizar a travessia deste trágico início de 2021; 2022 vem depois, não antes.

Veja: Na resistência democrática, todos os caminhos são válidos https://bit.ly/3cXUHhK

Duas condições

Ignácio Loyola Brandão diz que para ser escritor é preciso vontade e disciplina. Está certo. Mas vale para tudo verdadeiramente importante na vida, pois tempo e energia que se perde não se recupera.

Cena política


 A fonte pode secar

Luciano Siqueira       

Durante a última campanha presidencial, jovens que integravam uma das rodas de militantes empenhadas na campanha de Hadadd-Manuela, surpreenderam seus companheiros ao relatarem a aderência da narrativa do então candidato Bolsonaro nos bairros periféricos do Recife.

Da narrativa e do gesto.

- Mesmo quando gagueja diante de perguntas ou reconhece que não entende de economia, ele ganha adeptos entre os mais pobres, observaram. Nosso povo também gagueja em situações embaraçosas e não entende de economia...

Além disso, a ira anti-política convencional, que supostamente o candidato envergava, calhava fácil no sentimento de uma imensa maioria hipnotizada pela vigorosa campanha midiática que teve o PT (e a esquerda, por extensão), a prática política dita “velha”, políticos e partidos como alvo.

O ex-capitão surgia como um desengonçado Messias a apontar uma ruptura com o que estava estabelecido e a emergência de um novo ciclo no País.
Venceu.

E desencadeou um novo ciclo, sim – obscurantista, marcadamente fascistóide, movido pelos interesses prioritários do rentismo e pelo desmonte gradativo do Estado Democrático de Direito, das salvaguardas da soberania nacional e dos interesses fundamentais dos trabalhadores.

O porre midiático que visava lastrear o caminho para Alckmin contraditoriamente abriu larga vereda para o ex-capitão e a extrema direita. E para um projeto econômico ultraliberal que mesmo seus próceres mais convictos julgam estar defasado no tempo e nas condições de um mundo em crise econômica sistêmica, agravada com a pandemia.

Os perdedores de 2018 ainda permanecem atordoados. Alguns sequer compreenderam em profundidade a natureza da derrota e a dimensão da luta atual. Teimam em reproduzir fórmulas eleitoreiras que deram certo em passado recente, mas já não repousam sobre terra firme.

O fato é que agora já caminhamos para um novo pleito geral, tendo a presidência da República como cerne da disputa, e o jogo político se desenrola fundamentalmente na superfície, carecendo de bases consistentes.

Nas oposições, a predominância de projetos próprios visando a um primeiro turno (compreendido como alguns como “prévia” para uma unidade mais ampla num eventual segundo turno) e a escassez de entendimento em torno de uma plataforma destinada a vencer eleitoralmente e tirar o País da crise desenham o drama nacional.

Mas a superficialidade também comparece às hostes governistas, pelo menos ao núcleo palaciano que opera o cotidiano com o presidente.

Evidente que os interesses em jogo, empalmados pelo governo, contam com o concurso de muita gente graúda por trás das cortinas. A máquina governamental se move quase que em paralelo às atitudes tresloucadas do presidente.

E aqui e acolá surge uma dissonância grave – como no episódio da substituição do presidente da Petrobras, que deixou o tal Mercado perplexo e irado. 

Mas a operação política, incluindo o relacionamento com o Judiciário e o Parlamento e a opinião pública, faz-se pelo presidente e seu núcleo dito “do ódio”.

Daí a repetição, ora mais intensa, ora espaçada, dos rompantes e cacoetes de Bolsonaro na linha do que os jovens da periferia do Recife diziam ter aderência entre os mais pobres (e certamente do gosto também de ampla parcela da pequena burguesia urbana conservadora).

Porém ocupa crescente espaço na cena o tal “general Fome”, cada vez mais intensamente presente nos lares da maioria. A fonte da ilusão pode secar na proporção em que o fogo de monturo da insatisfação libere labaredas de revolta.

​​​​​​​Estarão as oposições à altura?

- Veja: Na resistência democrática, todos os caminhos são válidos https://bit.ly/3cXUHhK