04 maio 2016

Incoerência e despudor

Impeachment eticamente anêmico
Luciano Siqueira, no Blog de Jamildo/portal NE10

Analistas internacionais de diversas correntes políticas e ideológicas, incluindo porta-vozes do chamado "mercado", consideram absurdo o afastamento da presidenta Dilma nos termos aprovados na Câmara dos Deputados e agora, tudo indica, a serem confirmados pelo Senado. 
Refiro-me à opinião internacional para acentuar o vazio jurídico e factual da justificativa do impeachment.
A polêmica aqui, muitos dizem, parece chamuscada pelo acirramento de ânimos e pela radicalização política do processo. Pode ser — mas em decorrência da própria natureza da questão.
Em entrevistas e artigos recentes, o senador Cristovam Buarque, ex-PT, ex-PDT e atualmente no PPS, tem reconhecido abertamente que se trata de uma decisão eminentemente política.
Ou seja, pouco importa ou é secundário o substrato jurídico que, de acordo com a Constituição, seria indispensável a todo e qualquer processo de impedimento de ocupante da presidência da República.
Na peça formal, como se sabe, o vértice da argumentação pelo impeachment está na suplementação orçamentária praticada pela presidenta Dilma, ultrapassando as metas fiscais, autorizada pelo Parlamento.
Mesmo procedimento adotado antes por Fernando Henrique Cardoso e Lula, sem que sobre ambos pesasse nenhuma punição.
O mesmo acontece com a maioria dos governadores e, inclusive, aconteceu na gestão do senador Antonio Anastasia, relator da Comissão do Impeachment no Senado, quando governador de Minas Gerais.
Mais: matéria publicada na Folha de S. Paulo revela que quase a metade dos 51 senadores que declaram que a presidente Dilma Rousseff deve ser afastada por cometer crimes contra o orçamento liberou a presidenta para gastar além do que o Congresso Nacional havia autorizado!
Vale dizer, no exercício pleno da função parlamentar, tomaram a decisão considerando-a justa e, posteriormente, em razão da disputa política, não têm pejo em usar o fato para considerarem incriminada a mandatária.
Deram respaldo político e jurídico. Agora negam.
Ao que se deve acrescentar as razões de fundo, para além do desrespeito imediato à Constituição, que alimenta a empreitada pelo impeachment.
Os documentos “Ponte para o futuro” e “Travessia social”, do PMDB, antecipam um conjunto de decisões que o eventual governo Temer trataria de implementar de imediato, ao modo de Macri, na Argentina: um retorno pleno às políticas de cunho neoliberal que quebraram o País ao final do governo FHC e que, por quatro vezes seguidas, foram rejeitadas pela maioria dos brasileiros nas eleições presidenciais.
Nessas condições, o que assistimos agora são lances de uma peleja que deverá se prolongar e que perpassará o pleito municipal de outubro, desembocando nas eleições gerais de 2018.

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