As contradições reveladas pelas transformações no trabalho industrial
Poucas categorias revelam com tanta nitidez e simbolismo as transformações do mundo do trabalho, como a metalúrgica. Flora Lassance discute estas mudanças e como lidar com elas.
Osvaldo Bertolino/Cezar Xavier/Portal da Fundação Maurício Grabois
Na manhã do sábado, 16 de dezembro, Flora Lassance, operária metalúrgica do setor naval, trouxe à reunião ampliada do GT Mundo do Trabalho uma análise profunda sobre as transformações que afetam os operários metalúrgicos. Ela destaca a importância desse grupo para abordar questões cruciais, especialmente no que diz respeito ao processo de formação.
Flora compartilha a metodologia de pesquisa adotada, que não se limitou à região Nordeste, mas ampliou-se para incluir metalúrgicos de Betim, Caxias do Sul, Amazonas e outras regiões da Bahia. Ela destaca a relevância de trazer as impressões, angústias e expectativas de toda a categoria metalúrgica no Brasil para enriquecer o debate.
A pesquisa elaborou três perguntas fundamentais para sondar a identidade e avaliação dos trabalhadores frente às mudanças do mundo do trabalho. Flora enfatiza a importância do processo de formação e cita Paulo Freire, afirmando que é necessário estudar mais sobre a própria categoria para compreender as nuances das transformações em curso.
Entre os pontos destacados por Flora, quatro merecem atenção especial:
- Compreensão Diversificada das Mudanças do Mundo do Trabalho: As transformações são percebidas de maneiras variadas, desde alívio até desconfiança. Flora ressalta a confusão na identidade dos trabalhadores metalúrgicos, que enfrentam uma inversão de valores e uma diluição do sentimento de classe.
- Valorização das Mudanças e Camuflagem de Contradições: Muitos operários valorizam as mudanças introduzidas, mas Flora destaca a camuflagem de contradições estruturais. A reorganização do ambiente da fábrica, acompanhada de um discurso sedutor, pode mascarar a verdadeira insatisfação operária.
- Participação Ilusória em um Sistema Participativo: A participação dos trabalhadores parece controlada internamente e simbolicamente, iludindo sobre uma coincidência de interesses entre operários e empresários. Essa ilusão contribui para a diluição do sentimento de classe e mina a resistência.
- Impactos das Novas Tecnologias no Setor Metalúrgico: Flora destaca o impacto das novas tecnologias, automação e inteligência artificial no setor metalúrgico. Ela apresenta exemplos concretos de fábricas onde a produção aumentou significativamente, mas os empregos foram drasticamente reduzidos.
Diante dessas análises, Flora ressalta a necessidade de a categoria metalúrgica enfrentar os desafios, melhorar as condições e a qualidade de vida dos trabalhadores, e compreender a importância contínua do movimento sindical. O desafio de se adaptar, qualificar e desenvolver novas habilidades é crucial para a permanência no mercado de trabalho em meio a essas transformações.
A pesquisa de Flora revela um panorama complexo e desafiador para os metalúrgicos, destacando a urgência de repensar a identidade e resistência da classe diante das profundas mudanças no mundo do trabalho. O trabalho de base, a formação e o engajamento político são apontados como elementos fundamentais para construir perspectivas mais justas e sustentáveis para a categoria.
Leia a cobertura da reunião ampliada do GT Mundo do Trabalho:
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Transformações tecnológicas
Após o debate, ela trouxe reflexões sobre o impacto das transformações tecnológicas no mundo do trabalho industrial. Ela destacou a realidade da indústria automotiva, passando por mudanças significativas desde o perfil dos anos 1980 até os dias atuais, marcados pela robotização.
Flora iniciou a discussão levantando uma pergunta crucial: “Qual é a política de inclusão para os trabalhadores diante desse processo de transformação tecnológica?”. A preocupação central reside na falta de uma política efetiva de inclusão, evidenciando que, na prática, os 65 mil novos empregos gerados não compensam os 85 mil que serão extintos. A questão, portanto, ressoa como um desafio para as lideranças e trabalhadores envolvidos nesse contexto.
A sindicalista reiterou que a preocupação não é ser contrária às transformações tecnológicas, mas sim garantir que essas mudanças sejam acompanhadas por políticas inclusivas e estratégias que não deixem os trabalhadores à margem do processo. Flora destacou a importância das políticas públicas como um possível mecanismo de superação, apontando para a necessidade de iniciativas que promovam a educação, formação profissional e inovação.
Um exemplo concreto foi apresentado a partir da experiência na Bahia, onde a Agenda Bahia do Trabalho Decente tem desempenhado um papel inovador. Essa iniciativa estadual amplia os compromissos assumidos pelo governo federal no âmbito do trabalho decente, abordando questões essenciais em nove eixos prioritários. Entre eles, destacam-se a erradicação do trabalho escravo, combate ao trabalho infantil, segurança e saúde do trabalhador, igualdade de gênero e raça, além de juventude e empregos verdes.
Flora ressaltou que a Agenda Bahia do Trabalho Decente é construída de maneira quadripartite, envolvendo a participação ativa da justiça, trabalhadores, empregadores e outros setores, buscando promover o diálogo social. O modelo exitoso tem despertado interesse em replicar a iniciativa em outras regiões, como no Pará, com a proposta de criar a “Agenda Pará do Trabalho Decente”.
Diante das complexidades apresentadas pelo impacto das transformações tecnológicas, Flora enfatizou a importância de debater e implementar políticas que possam assegurar a inclusão, formação e proteção dos trabalhadores metalúrgicos diante dos desafios do novo cenário industrial.
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