Luciano Siqueira
Publicado no Blog de Jamildo (Jornal do Commercio Online)
Para usar uma imagem simples, a vida (e a luta) transcorre como as ondas do mar. Cabe a cada um que pretenda inovar e trilhar novos caminhos “ler” o real sentido dos acontecimentos.
Essa divagação vem a propósito nos inúmeros encontros com personagens, a maioria quase anônima, da vida e da peleja popular na cidade que de pronto relembram episódios vividos num passado nem tão distante, mas que soma quase três décadas. São reminiscências de conquistas marcantes e também de reivindicações jamais conquistadas, mas que se colocam atuais e reclamam, enfim, solução.
Trata-se do olhar dos que permanecem em sua comunidade a que se apegam por necessidade e também por identificação com o pedaço do território onde construíram sua própria trajetória de vida. Um olhar que se traduz muitas vezes de maneira muito simples, direta, porém emocionada, que inspira e incorpora nova energia a quem ali comparece para ouvir e debater alternativas para os desafios do tempo presente.
“Para que duas criaturas se aconselhem, são necessários muitos encontros e muitas realizações”, ensina o poeta Rilke. A sensação que me vem é de que foram muitos encontros e realizações em momentos distintos, compartilhados com gente humilde e lutadora das áreas mais populares do Recife. E eu nem tinha na devida conta a dimensão da vivência comum e que agora é retomada pelo fio condutor da nova empreitada.
Impossível não enxergar esse reencontro à luz da História, ainda que modestamente na micro dimensão da localidade e nos limites de nossa própria experiência: uma espécie de espiral que faz voltar ao ponto de partida, agora em novas circunstâncias, a querência por dias melhores nutrida por uma gente que não se entrega jamais.
A História da cidade é palmilhada pela conquista de territórios a custa de muita luta, espaços ocupados na contramaré da especulação imobiliária e mantidos até hoje pela força da resistência. Ali associações e conselhos de moradores, clubes de mães, ligas de dominó, quadrilhas juninas, times de futebol, agremiações carnavalescas e até igrejas ou terreiros ou centros espíritas dão o colorido caleidoscópico da resistência e dos triunfos amealhados ao longo do tempo.
A foto na parede, já gasta e amarelada; o testemunho de filhos e netos... “Meu avô falava muito no senhor”, “Essa menina – apontando para a filha hoje mãe de alguns rebentos – nasceu naquele tempo em que o senhor vinha aqui ajudar a nossa luta” e assim por diante.
Sim, minha gente, a política feita assim lembra as ondas do mar que se renovam, crescem e recomeçam sempre.
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