09 março 2024

Palavra de poeta: Marcelo Mário de Melo

PALAVRAS E MULHERES 
Marcelo Mário de Melo*


Não se trata de olhar 
palavras e mulheres
pelo buraco da fechadura
nem de tentar arrastá-las
como invasor
ou acionista majoritário.

É preciso atraí-las 
encantá-las 
para que elas caminhem   
ao instante comum.

Queremos vê-las nuas 
mas não nus 
precipitemos.

Palavras e mulheres
têm calendário 
e estações.

Os brotos da rosa 
detém um tempo 
para se enfolhar 
e criar pétalas. 

As rosas maduras 
soltam as pétalas 
pouco a pouco.

Palavras e mulheres 
têm mil faces 
de baton 
nuvem
cristal 
toque de sino 
ópera 
valsa 
tango argentino
ou se enfrevam 
se enrockam 
viram banda marcial 
hino de guerra 
toque de alvorada 
ou de silêncio.

Palavras e mulheres  
gostam de mágica
brincar de se esconder 
e serem descobertas 
atrás da cortina.

Brincam  
de faz de conta 
e se fantasiam 
de fada 
bruxa 
freira 
puta.

E essas fantasias 
são visíveis  
somente para elas 
que ainda fazem 
cara de uma 
enquanto outra.

Palavras e mulheres
têm cios e silêncios 
sobre o muro
das lamentações
ou em rumorosos
comí
cios
ardentes.

Palavras e mulheres 
não  são
estrelas  ilhadas 
nuvens distantes.

São flores 
de mãos abertas 
atentas 
para dançar
com autonomia 
não meras 
montarias
mas cavaleiras livres
esperando 
montar
serem montadas
em cavalgadas
aladas.

Palavras e mulheres
querem ser amadas
fecundadas
mas para isto 
precisam ser 
adivinhadas.

O sonho do poeta 
e ter na mão
a chave do segredo
da adivinhação.

[Ilustração: John Singer Sargent]

*Jornalista, poeta

Arte é vida: uma obra de João Câmara https://tinyurl.com/3faubph6

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