O massacre ao escrever ou falar
Você sabia que na bandeira
brasileira está escrito 'Independência ou morte'? Bem, eu não sabia
Ruy Castro/Folha de
S. Paulo
Não somente os seres humanos são vítimas de torturas. As línguas também, e a nossa passa por uma dura fase de espancamentos impressos ou ao microfone. Aqui vai um apanhado de erros de grafia, prosódia ou simples lógica perpetrados nos últimos tempos por profissionais que vivem de escrever ou falar, recolhidos pelo severo escritor e poeta Alexei Bueno. Tirando pelo meu, posso imaginar o suplício aos olhos e ouvidos de Alexei. Exemplos.
Um articulista se referiu a "acidentes com morte
grave". Outro, ao "Monumento das Pracinhas", no Rio. Um
comandante russo "acordou morto na Ucrânia". Petrópolis fica "no litoral do Rio de Janeiro". E o rio
Sena, "no interior da
França" —de fato, onde mais? O ministro do Supremo tomou uma decisão
"monocromática". O país tal tem uma "cultura
cosmopolitana". Certo "navio misterioso" era "um submarino
nazista". Famosa escritora gaúcha é "filha de descendentes
alemães". E Manaus, ultimamente, "não tem registrado quedas de
chuva".
Já no rádio e na TV, o pessoal não consegue se entender com os
acentos. Pilotis torna-se "pilótis". A "Ilíada" é a
"Iliada". O relógio é da marca "Patek Phíllipe". Obus é
"óbus". Timor é "Tímor". O Arroio Chuí é o "Arroio
Chui". Medellín é "Médellin". Cartago é "Cártago" (e
seus habitantes, cartaguineses). Qualquer nome estrangeiro de qualquer língua,
mesmo a alemã, é pronunciado à inglesa: Wernher Von Braun transfigura-se em
"Uérner". A Luftwaffe, em "Luftuáffe". E bunker, não tem
jeito, virou "bânquer". Escreve-se também à inglesa:
"eventually" (por fim) virou "eventualmente";
"troops" (soldados) agora são "tropas".
Não é só na língua —a turma tropeça também na história.
"Após fugir da escravidão no Rio de Janeiro, Luís Gama foi para São Paulo
tentar uma vaga na USP". Tiradentes "foi enforcado na praça
Tiradentes, em Ouro Preto". Cristo "foi crucificado na montanha do
Gólgota". E, claro, "todos sabemos que na bandeira
brasileira está escrito
‘Independência ou morte’".
Bem, eu não sabia. Vivendo e aprendendo.
[Se comentar, identifique-se]
Graciliano Ramos e o texto no tempo das redes https://lucianosiqueira.blogspot.com/2025/06/expoente-da-literatura-brasileira.html
Nenhum comentário:
Postar um comentário