20 setembro 2012

Para aliviar a cuca...

A poesia nossa de cada dia
Luciano Siqueira 

Publicado no Blog da revista Algomais e no Jornal da Besta Fubana
 
Certa vez, ao dedicar um exemplar da Rosa do Povo, de Drummond, a uma militante, João Amazonas escreveu: “como seria a vida sem a poesia? Certamente seria cinza”. Sábia afirmação do velho dirigente comunista, pois os poetas - esses seres especiais – têm o dom de nos fazerem enxergar além do que apenas vemos, revelando a beleza e o sentido universal contido no mais efêmero dos episódios cotidianos.

Bem que precisamos dos poetas no dias que correm. E de nossa capacidade de imitá-los, tentando descobrir a verdade além das aparências e da parcialidade mau-humorada da grande mídia, hoje tão empenhada em difundir unilateralmente fatos negativos e em botar gosto ruim nas coisas boas.

Cá no Recife, dois poetas e militantes dos bons, Cida Pedrosa (do PCdoB) e Marcelo Mário de Melo (do PT), oferecem ao público belas e consistentes contribuições em favor da vida. Como em dois livros lançados em 2005, que releio agora em meio às intensas atividades da campanha eleitoral.

Cida reúne em Gume, seu quarto livro (tem participado também de antologias), versos que, a um só tempo, afagam e cortam: “uma faca de dois gumes”, como bem assinala o escritor Raimundo Carrero. Encara o sofrimento (o seu e o de nossa gente): “a cidade era à prova de balas/a ponte era à prova de sonhos/a dor visitava o capibaribe/entre putas e pombos construí poemas” (O oriente da cidade); “a morte rompe a porta/congela nossos olhos/vitrifica a vida” (Vigília);  e reafirma um audacioso modo de traduzir sua sempre renovada capacidade de amar: “meu amor/desde já te informo:/durmo de pernas abertas/e a cada lua/te espero/para plantar girassós” (Convite).

Marcelo, com o seu Manifesto da Esquerda Vicejante, coletânea de poemas e textos, num tom predominantemente satírico e bem-humorado, porém otimista, critica equívocos e trejeitos de um tipo de militância emblematicamente imaturo e sectário: “Em lugar da esquerda autoritária, arrogante e autofágica, a esquerda auditiva, criativa e cativante./Em lugar do otimismo compulsório, a esperança crítica.” E nos concita ao bom combate (no belo poema Bandeiras): “As nossas bandeiras/devem estar sempre/içadas/inteiras/e limpas./Bandeiras/sujas e rasgadas/somente/pela força dos ares/do suor/ou do sangue/das campanhas.”

Que assim seja – para que possamos lutar sempre com coragem e alegria.

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