A supremacia do óbvio*
Luciano Siqueira
Comentaristas esportivos parecem unânimes: o Botafogo derrotou o Fluminense, no último fim de semana, por 2 a 0, porque o seu técnico interino Lúcio Flávio enxergou o óbvio e o time voltou a jogar com a eficiência de antes.
Outro dia foi o ex-campeão mundial Tostão que elogiou o hoje técnico sãopaulino Dorival Júnior pela capacidade de enxergar o óbvio quando treinou com muito êxito o Flamengo.
Fica subentendido que muitos treinadores ao assumirem times formados por craques erram ao tentar impor um suposto sistema de jogo próprio, desfazendo que o vinha dando certo.
Mais do que isso, no futebol, como na política, por exemplo, o curso natural das coisas existe e nem sempre está obscuro ou oculto pela complexidade das situações. O mérito de quem dirige ou lidera movimentos numa determinada direção é exatamente perceber o mais simples e, portanto, realizável.
Imagine se o grande Lenin tivesse se apegado à hipótese de Marx e Engels, segundo a qual transformações revolucionárias de sentido socialista só ocorreriam em países previamente preparados por um elevado nível de desenvolvimento capitalista.
A velha Rússia era um país agrário-industrial e em razão da confluência de contradições internas e externas pariu uma situação revolucionária. Pareceu, então, a Lenin que se gestava uma situação atípica, porém óbvia: na cadeia de dominação imperialista surgira um elo mais fraco, que poderia então ser rompido pelo assalto ao poder, derrotando o tzarismo.
O presidente Lula nem é técnico de futebol nem está a testa de um movimento revolucionário, porém igualmente está desafiado a enxergar o óbvio na grande missão de superar o desastre herdado de Temer e Bolsonaro e criar uma situação nova propícia a transformações de caráter progressista.
Por exemplo: sem maioria parlamentar, não governa; faz então acordos com o centrão e conquista numericamente a maioria pretendida.
Uma certa desobediência aos limites do arcabouço fiscal surge agora também como óbvia precondição da retomada da economia via investimentos públicos e privados em infraestrutura e na indústria.
Tanto quanto dentro das quatro linhas de um campo de futebol, na luta política fazer o óbvio em nome da eficiência não é tão simples, porém é o caminho para o êxito.
*Texto da minha coluna no portal Vermelho desta quinta-feira
A cada degrau, indo e vindo https://bit.ly/3Ye45TD
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