Zumbi, 312 anos depois
A História da Humanidade se processa em espiral, interligando fatos do passado com a vida presente, num movimento dialético que faz ressurgirem – tenham ou não os homens plena consciência disso – idéias, sentimentos e desejos, agora reinventados na forma e na intenção sem perderem, entretanto, o liame com seu o conteúdo original.
Ontem, terça-feira 20, vivemos um exemplo disso ao assinalarmos o 312º aniversário do suplício de Zumbi dos Palmares no Dia Nacional da Consciência Negra.
A exaltação de Zumbi como herói nacional crava em nossa História a saga do negro que nasceu livre em Palmares (1655), foi feito escravo na infância, tornou-se foragido aos 15 anos, e aos 25 já era o líder do maior dos quilombos brasileiros. Um ano depois da destruição de Palmares, foi traído, capturado, ferido, morto e decapitado. Teria permanecido “bandido” segundo a historia oficial (estigma que prevaleceu durante duzentos anos) se os movimentos pela igualdade racial não tivesse colocado no seu verdadeiro papel de inspirador das novas gerações, símbolo da luta atual.
Seus ideais reviveram ontem através de manifestações pelo Brasil inteiro, erguendo três bandeiras de luta: pela aprovação do Estatuto da Igualdade Racial, pela política de cotas e pela transformação do 20 de novembro em feriado nacional.
Avalia a Unegro (União dos Negros pela Igualdade) que tem avançado a luta contra a discriminação e pela igualdade em nosso país. Foram criados organismos de promoção da igualdade racial nas três esferas de governo. Foi revogada a Lei da Terra de 1854 na Constituição com o artigo 68 da ADCT e o Decreto 4887/03, determinando, pelo Estado, o reconhecimento da posse das terras dos quilombolas. A prática do racismo tornou-se crime previsto na Constituição. Surgiu o sistema de cotas nas universidades. Há, hoje, previsão orçamentária no plano plurianual da União e de vários estados e municípios para sustentar políticas de igualdade racial.
Mas há ainda muito a conquistar. Basta que se considere – além de indicadores da desigualdade racial entre nós, como empregabilidade, renda e escolaridade – o estudo divulgado ontem acerca das principais causas de mortalidade de homens negros e brancos. Os negros morem principalmente de causas externas, enquanto os brancos morrem mais de doenças.
Os pesquisadores Marcelo Paixão e Luiz Carvano, da UFRJ e do Laboratório de Análises Estatísticas Econômicas e Sociais das Relações Raciais, demonstra que, de 1999 para cá, vem crescendo a desigualdade entre negros e brancos quando se comparam as taxas de mortalidade por homicídios, tuberculose, enfermidades relacionadas com o parto e HIV.
A desigualdade chega até a se acentuar com a melhora dos índices entre os brancos e piora entre os negros, a exemplo da variável homicídios. No período compreendido entre 1999 e 2005, a taxa de assassinatos por 100 mil homens brancos caiu de 36 para 34 mortes, enquanto entre os homens negros aumentou de 52 para 61 por 100 mil.
Cabe, portanto, implementar as políticas públicas promotoras da igualdade, a lado do desenvolvimento econômico com distribuição de renda e oferta igualitária, do ponto de vista racial, das oportunidades de trabalho e de acesso aos serviços essenciais. Para honrar o ideal simbolizado por Zumbi dos Palmares.
Nenhum comentário:
Postar um comentário