Carol Bradley, no blog Um conto por dia umcontopordia.com.br
Sentados no batente da escada, sentiam o cheiro
do restaurante no outro lado da rua. Era um rodízio de carne, de carro, de gente.
Homem, mulher, gordo, magro, carecas, jovens. Ali cabia todo mundo, menos eles,
os vizinhos.
Homens
engravatados, mulheres de salto alto. Meninos de chinelo, não havia. Depois da
pelada na Casa do Estudante, eles alimentavam-se de imaginação. Seriam um
daqueles que descia do carro com motorista. José veio com 14 anos de Salgueiro.
Trouxe na mala
roupas, sapatos e ideal. Seria juiz e iria lutar contra as injustiças, como a
que presenciara na cidade natal. Enquanto o prefeito bebia água mineral em
filtro de ouro, a maioria da população espremia pedra para tirar gota d`água.
No Recife, começou
a estudar com outros rapazes que seriam médicos e engenheiros. Como a sopa da
Casa era rala, dormiam cedo, para a fome não chegar antes do sono.
Era companheiro dos
livros. Passou em décimo lugar no curso de Direito da Federal. Onde havia
estudado Joaquim Nabuco, agora estudava José Alves. No terceiro período
passou em um concurso para ser estagiário da Celpe. Seus colegas eram filhos de
advogados e desembargadores, ele de Maria Aparecida.
No fim do ano, a
empresa promoveu a confraternização do departamento jurídico. Por capricho do
destino, entrou no restaurante que só conhecia de cheiro. Vestindo terno e
gravata esperou sentar os diretores, advogados, estagiários e ficou na última
cadeira.
O restaurante
estava lotado. Espetos cobertos de carne desfilavam pelas mesas. O garçom se
aproximou. Era Pedro, o goleiro do time. Em um tom de voz nada discreto,
dirigiu-se ao companheiro de bola. Sr. Alves, é uma honra tê-lo novamente
conosco. A mesa do senhor vai ter uma atenção especial. Percebeu o olhar
admirado dos colegas e do chefe. Ninguém sabia que o magrelo era tão
importante. O que o senhor deseja para beber? Uma cachaça, por favor.
Obs. Inspirado no meu amigo, João Arnaldo.
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