Telemarketing reverso
Luciano Siqueira
Li recentemente que a Anatel obrigará
as empresas de telemarketing a acrescentarem um número às ligações, de modo a
que quem as atende possa identificar previamente do que se trata.
Assim, muita gente, como eu, que não
tolera telefonemas oferecendo planos os mais diversos — compra facilitada
de veículos novos, combos de telefônicas ou imóveis à beira-mar e que tais — e
sente a privacidade invadida, poderá escapar da chatice.
Mas tem gente que tira de letra o
incômodo, se diverte e ainda faz protesto político.
Tudo numa boa.
Um amigo meu, por exemplo.
— Bom dia, é o senhor Gumercindo?
— Sim, pois não?
— O senhor teria interesse em adquirir
uma unidade num resort em Muro Alto, recém-construído? Uma ótima oferta,
garanto.
— Por enquanto, não.
— Por que não?
— Porque perdi meu emprego, comprei um
carro novo, me inscrevi no Uber e me dei muito mal.
— Humm...
— Sou mais uma vítima desse governo
Bolsonaro, que aumenta preço de tudo. Quem aguenta gasolina a 7 reais o
litro!?
E assim segue fazendo seu proselitismo
político tendo como ouvinte, no outro lado da linha, a tal vendedora.
Vale para todo tipo de oferta, diz ele.
— Senhor Gumercindo, boa tarde!
— Boa tarde! Bom que você tenha ligado,
amigo. Estava precisando mesmo desabafar com alguém.
— Sim...
— Como pode o presidente da República
se opor à vacina contra essa doença terrível, a covid-19!?
— !?
— Pois é. Um absurdo!
E segue discursando, tanto mais
criativo quanto permita a ocasião.
Pergunto:
— Quando mais você se diverte com esse
"telemarketing reverso"?
— Nos sábados à tarde, com toda
certeza.
— Como assim?
— Trabalho duro a semana toda e
reservo as tardes do sábado para tomar uma birita e ouvir música na varanda do apartamento. É quando mais divirto com o
telemarketing.
— Amigo velho, faltam-me paciência e verve para isso, mas reconheço que você
inventou mais uma trincheira de luta pela democracia!
.
Uma imagem simples pode traduzir um modo de ver a vida https://bit.ly/3bHdyf5
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