24 janeiro 2022

Crônica da sexta-feira

Afinal, malegômeno é o quê?

Luciano Siqueira
 

Fiz meu curso ginasial (como se chamava antigamente) no Colégio Estadual do Atheneu Norte-riograndense, em Natal, no turno da noite.

A turma ia chegando do trabalho e antes de começarem as aulas ficava por ali jogando conversa fora.

Uma brincadeira que fazíamos era desafiar uns aos outros a dizerem o significado de palavras pouco usuais.

"Energúmeno", por exemplo — termo que hoje calha muito bem para caracterizar o atual presidente da República.

Numa certa medida nós nos inspirávamos no Marquês de Pombal, que se notabilizara por recuperar o uso de palavras que haviam ficado esquecidas, especialmente quando mandou na colônia e impôs a língua portuguesa como idioma único no Brasil.

Tinha um colega, conhecido por Wilson Doido, que era verdadeiro ás no desvendar o sentido das palavras. E sempre tinha uma anedota para complementar a resposta.

Me intrigava tamanha habilidade num balconista de farmácia como ele.

Um dia eu o desafiei com o termo "malegômeno", que improvisadamente tirei da minha própria caixola.

Pura invenção.

Jamais lera ou ouvira pronunciar aquela palavra.

Wilson Doido sentiu o golpe. Pela primeira vez se viu embatucado: não conhecia a palavra, mas não queria dar o braço a torcer.

Arriscou significados vários, do tipo pessoa maléfica e afins — que rejeitei todos.

Deu a hora da aula sem que a peleja fosse resolvida. 

Iniciamos a noite justamente com a aula do professor de português, José Patrocínio, reconhecidamente competente e muito bem informado.

Instado a esclarecer o significado do termo malegômeno, disse desconhecê-lo e se comprometeu a pesquisar em sua coleção particular de dicionários.

Na próxima aula esclareceria.

Mas na próxima aula, na semana seguinte, o professor obviamente comunicou à turma que não havia encontrado nos dicionários a dita palavra.

Feito bumerangue, o desafio caiu em meu próprio colo, pressionado a esclarecer aonde a havia encontrado.

Não me fiz de rogado e aprofundei a invencionice respondendo que a encontrara numa das obras justamente de Sebastião José de Carvalho e Melo, o famoso Marquês de Pombal.

E assim a polêmica foi encerrada sem sequer o professor e os mais atentos alunos perceberem que eu os havia ludibriado, pois o Marquês de Pombal usara palavras em desuso em seus discursos e não exatamente em obras escritas, ele que historicamente é tido como importante estadista português, que se deixou influenciar pelo iluminismo. 

Mas não se conhecem livros de sua autoria...

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Uma imagem pode ter vários significados. Depende de quem a observe https://bit.ly/3E95Juz

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