11 julho 2022

Educação pública e de qualidade

Programa de governo de Lula deve garantir gestão pública da educação
 
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Entidades e especialistas consideram que diretrizes da campanha Lula-Alckmin tocam de forma viável e factível nos temas da reconstrução de um sistema educacional atingido pelo bolsonarismo e pela pandemia. Movimentos estão preocupados com avanço da gestão privada sobre escolas.

No dia 21 de junho, a pré-candidatura à Presidência da República de Luis Inácio Lula da Silva (PT), tendo como vice o ex-governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSB), apresentou as diretrizes de programa de governo que nortearam sua campanha. A reportagem consultou representantes de entidades e especialistas para avaliar as diretrizes e sugerir propostas para o tema da Educação.

As reações foram otimistas e surpresas com a abordagem avançada das diretrizes. Elas trataram dos ataques sofridos pela educação e os profissionais da educação neste governo, apontando para uma inversão de orientação. A ideologização que visou atacar o caráter crítico e democratizante da grade curricular, assim como o desmonte do financiamento educacional promovido durante o governo Bolsonaro, foram tratadas conceitualmente.

Mas houve também preocupações com o enorme desafio que se avizinha, conforme o bolsonarismo aliado à pandemia afastou milhões de adolescentes e jovens da escola e da universidade. A política macroeconômica pouco imaginativa de Paulo Guedes, focada apenas em ajuste fiscal austero e neoliberal, também promoveu danos profundos no fomento da formação e desenvolvimento científico e tecnológico.

Redemocratizar

A coordenadora da secretária-geral da Confederação Nacional dos trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee), Madalena Guasco Peixoto, acredita que as diretrizes tocam na questão da ideologização da educação pela Escola Sem Partido, ao falar da retomada da educação democrática, cidadã, crítica, laica e inclusiva. “Diante da dimensão do desmonte, o programa é lúcido e toca nas questões fundamentais”, declarou.

Mas ela sente falta de uma proposta dos movimentos educacionais com a gestão privada da educação pública. Para além da defesa de uma educação pública, universal e de qualidade, acrescentar “com gestão pública” seria fundamental para incorporar essa nova demanda da luta social. “Diante do que está acontecendo no Brasil, com avanço do capital aberto na educação pública, isto é uma lacuna”, resumiu.

Ela exemplificou com um projeto de lei na Câmara de Vereadores de São Paulo, que propõe que organizações sociais possam administrar escolas, com direito de projeto pedagógico próprio e contratação de profissionais. “Eles estão vindo com força, como fizeram com escolas que passaram para a gestão militar”.

Para ela, o centro das diretrizes para a Educação está dito na retomada da educação cidadã e do fortalecimento da ciência, tecnologia e inovação. “O programa trata das questões centrais da atualidade e faz com que a candidatura se distinga e recupere a educação democrática”, opina a educadora.

Para além da questão do fomento, Madalena também observa como o governo Bolsonaro atacou a educação pelo viés da falta de relação prevista no Pacto Federativo para fortalecer as metas do Plano Nacional de Educação. “Os municípios e estados ficaram sem coordenação nacional, e sem a distribuição necessária de recursos para municípios muito pobres. Esta desarticulação foi proposital para o desmonte educacional”.

Leia também: Lula-Alckmin e o gesto taticamente contido: https://bit.ly/3A39tiS

Estado de emergência

Diante do estrago deixado por Bolsonaro e a pandemia na Educação, a presidenta da União Nacional dos Estudantes (UNE), Bruna Brelaz, tinha expectativas modestas em relação às diretrizes. Para ela, se as diretrizes conseguem abranger um plano emergencial já será suficiente para avançar.

“O Brasil está vivendo um dos momentos mais difíceis da sua história e todo governante que queira se colocar à disposição do país, vai precisar se colocar um programa de emergência e recuperação nacional em todas as áreas. Essa é nossa expectativa em relação a campanha do presidente Lula”, afirmou.

Para ela, a primeira iniciativa de um eventual governo Lula deveria ser “recuperar os estudantes”. “Fazer uma operação resgate para que os estudantes que estão desistindo da escola e da universidade possam retomar o ensino superior”, diz ela. Bruna observa de seu lugar privilegiado de representante estudantil, os milhões de jovens brasileiros que abandonam a escola e o sonho do diploma universitário.

Para ela, é preciso que o estado brasileiro consiga dar o aparato necessário para estes estudantes permanecerem na escola. Especificamente no ensino superior, garantir que ele consiga o diploma na mão, considerando os riscos que as universidades estão correndo pelo país de não conseguir manter atividades básicas.

“Hoje, as universidades enfrentam um colapso em relação à permanência estudantil, porque o Plano Nacional de Assistência Estudantil tem sido atacado, assim como o orçamento das universidades, o que prejudica de imediato os estudantes”, disse ela.

A questão do dinheiro

Um dos especialistas consultados, que apontou a questão do fomento e financiamento como um dos maiores problemas a serem enfrentados pelo futuro governo, foi o pedagogo Dermeval Saviani. Enquanto avaliava as diretrizes para a reportagem, ele foi convidado para participar de uma “oitiva temática da educação com o objetivo de receber propostas de iniciativas de competência federal que incidam sobre a necessária alteração do quadro de deterioração acelerada da educação nacional após o golpe de 2016”, organizada pela coligação dos sete partidos de apoio à candidatura Lula.

A preocupação de Saviani diante dos pontos relativos à área de educação, diz respeito ao problema do financiamento das iniciativas propostas. “Com efeito, a via que viria a assegurar os recursos necessários eram os resultados do pré-sal. Como, porém, após o golpe de 2016 legitimado pelo suicídio democrático que elegeu Bolsonaro, o pré-sal foi leiloado, fica a questão do financiamento das medidas propostas, sem o que elas não passarão de expectativas que não se realizarão”, pondera ele.

Com o convite recebido, ele pretende abordar este tema, além de outros pontos que lhe parecem relevantes serem considerados pelo próximo governo, embora avalie que não há nada a acrescentar às diretrizes, em si.

Além do aspecto do desmonte federativo, Madalena também considera que um dos grandes problemas da educação no governo Bolsonaro é que o desmonte se deu “pelo viés da retirada do financiamento de tudo”.

O cientista político Luis Fernandes, que dirigiu a Finep, agência pública que financia a inovação, foi um dos convidados para contribuir para a formulação das diretrizes, com papel importante na área de Ciência, Tecnologia e Inovação, que está diretamente ligada a questão da Educação.

Para ele, o principal problema a ser enfrentado por um futuro governo é o colapso do sistema de fomento. Houve no documento de diretrizes, na opinião dele, um claro compromisso com a recomposição do sistema nacional de fomento. Ele considera esse compromisso totalmente “factível e viável”.

“Essa garantia foi dada a partir de uma conquista já obtida no Congresso, que foi a transformação do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) em fundo financeiro não passível de contingenciamento. Lei aprovada que o governo Bolsonaro descumpriu, ao meu ver tendo cometido crime de responsabilidade”, explicou ele.

Com isso, Luis considera que já existe uma base para recompor o sistema e avançar ainda mais, embora existe a barreira constitucional do Teto de Gastos, também. “Como as diretrizes se orientam para recuperar a capacidade de regulação e de investimento público do estado, todas passam por uma condição prévia de revisão do teto constitucional dos gastos públicos, que inviabiliza o investimento público como estruturante do desenvolvimento nacional”, salienta.

Luís Fernandes, de qualquer forma, se mostrou satisfeito com a redação final do documento, pois todas as proposições feitas foram incorporadas. “Algumas em termos de detalhes de projetos não cabem num documento de diretrizes, mas podem ser transformadas em ações de plataforma e iniciativas de governos. Mas conseguimos consolidar e entrar na campanha com um importante instrumento que vai dar um arcabouço de formulação para avançar na estruturação de um novo projeto de desenvolvimento para o Brasil”, disse.

Clique aqui https://bit.ly/3nRIzmA para conhecer as diretrizes de programa de governo para a educação, e para ciência, tecnologia e inovação, encontradas nos itens 21, 22, 81, 82, 83 e 84

(por Cezar Xavier)

 Foto: Ricardo Stuckert

Veja: O inferno astral de Jair Bolsonaro https://bit.ly/3Pf8TTy

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