Os Data Centers no BrasilAbraham B Sicsú
4 horas da manhã. Acorda-se cedo. Mensagens, pela internet, para não fazer barulho. Uma colega professora me alerta: “O debate está quente em Brasília. Temos que acompanhar. É decisão estratégica para o Brasil e para o Nordeste.”
Não
entendendo direito, questiono do que se trata. Com calma, me explica, é sobre
um Plano de Internalização de Data Centers, feito pelo Ministério da Fazenda,
em parceria com o da Indústria e a Ciência e Tecnologia. Começo a entender,
embora não tivesse informações.
Centro
de Processamento de Dados, conhecido como Data Center, uma instalação física
projetada para armazenar, processar e gerenciar dados de forma segura e
eficiente, isso eu sabia. É fundamental para a digitalização das empresas,
é onde se armazenam e processam as informações das empresas e instituições,
básico para dar agilidade e eficiência às decisões.
Querendo
mais detalhes, procuro um amigo especialista. De uma maneira didática, ele me explica:
“Os Data
Centers são como o coração da computação de hoje. Ao invés de termos dados
espalhados e distribuídos, eles são concentrados em um local e de certa maneira
protegidos e melhor administrados para as diversas aplicações (bombeados para
diversos usos).
Outra
analogia seria comparar eles com centros de logística, onde se armazenam dados
(itens), que são usados/distribuídos quando necessários.
Em
função da aplicação, eles assumem desenhos diferentes: dedicados a uma empresa
ou a vários usuários, voltados para uma grande quantidade de dados ou
estratégicos para empresas ou informações sigilosas de governo, serviços que
envolvem restrições de tempo de acesso ou não.”
Procurando
mais informações, vejo na internet que os Data Centers são classificados em
níveis, de 1 a 4, dependendo da disponibilidade de infraestrutura e, principalmente,
de sua capacidade de suportar falhas e manutenção com um mínimo de
interrupções.
Estados
Unidos, Alemanha, Reino Unido e China possuem um grande número de Data Centers,
sendo que a América do Norte, disparado, é o maior, tem cerca de metade dos
mais sofisticados, nível 3 e 4.
Como são equipamentos tecnologicamente sofisticados
e caros, as empresas e instituições que deles precisam, todas da era digital,
preferem contratar seus serviços e pagam caro por esses serviços. Como não
temos em quantidade e qualidade esses equipamentos no país, os serviços
representando um ônus para a Balança de Pagamentos.
Acrescente-se a isso que os Data Centers consomem
uma quantidade de energia significativa, tem operação contínua de seus
equipamentos. Além, para o resfriamento de seus equipamentos e servidores,
precisam de enormes volumes de água o que pode ser um problema para abrigá-los
em muitos locais.
O aumento de armazenamento e processamento de dados,
impulsionado inclusive pela Inteligência Artificial, leva a um aumento
desproporcional de uso de energia e água que deve ser considerado. Aí entra o
Brasil como potencialmente produtor de energias renováveis em larga escala e
ainda dispondo de volumes de água compatíveis.
Discordando daqueles que sempre usam o chavão de que
não temos um Projeto Nacional de Desenvolvimento, na transição para o atual
Governo, no meu entender, construímos um projeto que, talvez, por
circunstâncias políticas não esteja sendo posto em prática totalmente.
Nele, além de abordar temas sociais da máxima
importância, definiu-se como prioridade estancar a desindustrialização do País,
que vinha faz anos. Missões foram definidas.
Voltadas para a melhoria das condições de vida como metas, mas, não só,
também, buscando maior competitividade das cadeias produtivas da nação. Nessa
direção, estruturou-se o Plano Nova Indústria Brasil.
Neste, a Missão IV visa a transformação digital de
nosso parque fabril para dar maior competitividade à nossa indústria. São
priorizados campos como Big Data, internet das coisas, Inteligência Artificial
e Robótica, por exemplo. Tecnologias disruptivas que podem alterar o estágio
atual do setor. Para todas elas, Data Centers são fundamentais, principalmente
os de classificação superior.
Com esse cenário, resolveu-se fazer um Plano
específico para Data Center tendo à frente o Ministério da Fazenda, por ter
forte ênfase em incentivos fiscais para a captação de investimentos de monta,
tendo como parceiro o MDIC e o MCTI, que articulam o setor e tem profundo conhecimento
da realidade setorial.
Um plano
ambicioso para promover o crescimento do setor de Data Centers no Brasil. Tem
como objetivo atrair investimentos de R$ 2 trilhões em 10 anos. Dizem os
documentos:
“Cria
uma política nacional para Data Centers, com incentivos fiscais, segurança
jurídica e regras específicas para o setor, visando posicionar o Brasil como um
centro global para Data Centers.”
Não é
uma atração de investimentos sem regras bem definidas. Vale salientar que no
Plano se tem um forte enfoque na sustentabilidade.
Propõe-se
que aos equipamentos aqui localizados que se basearem em energia renovável,
como solar, eólica ou hidrogênio verde, terão benefícios fiscais
diferenciados.
Segundo
o Ministério da Indústria, se incorpora isenções tributárias para os
investimentos necessários com impacto de mais longo prazo, como compra de
equipamentos e construções físicas, em contrapartida à vinda para o país das
grandes empresas do setor.
Há
contrapartidas para o Fundo Nacional de Desenvolvimento Industrial e
Tecnológico, recursos que visam financiar pesquisa e desenvolvimento e adensar
a cadeia produtiva com conhecimento.
Ainda, a isenção de
Impostos de Importação só será concedida a produtos que não tenham produção de
similares no país. Memórias, servidores, equipamentos de Tecnologia da
Informação aqui já sejam produzidos não terão esse benefício.
Reduzir a dependência
externa dos serviços dos Data Centers é fundamental. No ano de 2024 houve um
déficit na Balança Comercial de mais de sete milhões de dólares, apenas com os
Estados Unidos.
Com esse Plano
finalizado, cabe um processo de busca de investidores. E o primeiro passo está
sendo dado esta semana.
O Ministro da Fazenda
foi à América do Norte para detalhar para grandes investidores, como Amazon,
Google e Nvidia o plano. No seu discurso está a necessidade tecnológica do
país, a oportunidade de negócios e a transformação ecológica.
Também, a importância
de priorizar o poder computacional para as instituições e empresas implantadas
no País. Pelo menos 10% da capacidade gerada pelos investimentos com os
incentivos têm que contemplar instituições e empresas que atuam no Brasil.
Segundo cálculos
feitos pelo Governo, como já dito, há um potencial de atração de investimentos
de 2 trilhões de reais, em dez anos, o que não é pouco.
Embora o programa
pareça ser bem estruturado, reações contrarias começaram a existir.
Estados que já atraíram empresas, como o Ceará, em que
existem Zonas de Processamento para a Exportação com benefícios similares
específicos, precisam de ações compensatórias que devem ser negociadas com o
Governo Federal. Tenho certeza que serão.
Mais que uma crítica,
um alerta usual e relevante é quanto à segurança informacional e soberania
nacional. Há receio de que, ao se associar com as grandes Big Techs se esteja
abrindo mão da privacidade e sigilo em prol dos americanos.
Evidentemente, essas
negociações terão que levar em consideração este fator e medidas protecionistas
deverão ser adotadas. Países como a China e alguns da Comunidade Européia têm
adotado modelos que parecem ser seguros e confiáveis. Podem servir de parâmetro
para nós.
Sempre há uma visão
conspiratória por detrás de algumas críticas a qualquer plano nacional que seja
elaborado. Não é diferente para este. Surgem os primeiros textos contrários com
a seguinte alegação:
“Essas empresas (com
quem se pretende negociar, as Big Techs)
foram e continuam sendo peças centrais na arquitetura de desinformação,
manipulação e espionagem que empurrou o Brasil ao colapso institucional vivido
na última década”.
Ou seja, critica-se o
programa por estar procurando empresas externas que usariam seu poder de
mercado para manter o País na “dependência e submissão tecnológica”, inclusive
manipulando as informações armazenadas.
Entendo a
resistência, mas considero despropositado. Um mercado que cresce a passos
largos, em que não temos capacidade financeira ou tecnológica para nos inserir
autonomamente, não pode ser desprezado por razões políticas ou ideológicas.
Claro que outras
parcerias serão procuradas, por exemplo, com empresas dos BRICS que têm a
tecnologia adequada. Serão muito bem vindas. Mas, limitarmos nossa busca a
essas é desconhecer a realidade desse mercado específico e desprezar parcerias
que podem ser viabilizadas em mais curto espaço de tempo, com possíveis bons
resultados.
É um espaço
importante para auxiliar na reindustrialização do País. Um espaço em que temos
posição privilegiada na concepção da sustentabilidade energética.
Aonde podemos ter uma
ação com impactos regionais redistributivos se soubermos direcioná-la como
política pública espacialmente alocativa. Lembrando, por exemplo, que o
Nordeste é o maior produtor de energia eólica nacional, grande produtor de
energia solar e, com a estrutura de Pecém e Suape, apresenta-se como potencial
principal produtor de hidrogênio verde.
Um programa que
parece bem estruturado e dimensionado, mas, pode e deve ser aperfeiçoado, que
muito pode contribuir para um desenvolvimento mais harmônico, modernizante e
aderente com as tendências contemporâneas, é um passo significativo para a
inserção brasileira nas tendências atuais do setor produtivo.
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