31 maio 2020

Ainda a Copa de 2014


Assistirei ao 7 a 1 para tentar entender um pouco melhor o resultado

SporTV reprisa neste domingo goleada da Alemanha sobre o Brasil na Copa-2014

Tostão, Folha de S. Paulo


Domingo de tragédias. Além do constante aumento do número de infectados e de mortos e dos graves problemas políticos e econômicos que vive o país, poderemos ver, mais uma vez, o 7 a 1, pelo SporTV (às 18h). Vou tentar entender um pouco melhor o resultado, embora muitas coisas na vida não tenham explicação, acontecem.

O 7 a 1, em 2014, começou com a bela vitória do Brasil sobre a Espanha, por 3 a 0, na final da Copa das Confederações, no ano anterior. Apesar de ter sido a única ótima partida coletiva do time brasileiro, criou-se a ilusão de que a equipe era um timaço e que, em casa, com todo o público cantando o Hino Nacional, seria quase impossível não ser campeão do mundo. Aconteceu o contrário. A responsabilidade foi um fator negativo.
Felipão, na Copa do Mundo, cometeu o erro, frequente entre treinadores e profissionais de todas as áreas, de achar que o que deu certo um dia deve ser repetido, mesmo se as condições forem outras. Até profissionais muito bem preparados tendem a tomar decisões baseadas mais em suas experiências pessoais do que em evoluções científicas. É uma mistura de superstição e onipotência.
Alguns jogadores que foram titulares na Copa das Confederações e que tiveram quedas importantes no ano seguinte continuaram na equipe, como Paulinho e Fred. Bernard foi escalado no 7 a 1, no lugar de Neymar, contundido, no Mineirão, porque tinha entrado bem no segundo tempo da partida contra o Uruguai, também em Belo Horizonte, pela Copa das Confederações, quando foi aplaudido pela torcida do Atlético, seu clube anterior. Felipão, iludido, achou que tudo se repetiria.

O planejamento de Felipão, contra a Alemanha, foi o mesmo da vitória contra a Espanha. O time pressionaria desde o início e incendiaria a torcida. Escalou quatro atacantes: Hulk e Bernard, pelos lados, e Oscar, pelo meio, perto de Fred. Todos bons, mas nenhum excepcional, para o nível da seleção brasileira. O volante Luiz Gustavo foi colocado à frente dos zagueiros, por causa do avanço dos laterais. Ficou apenas Fernandinho no meio-campo. Um enorme vazio.

A estratégia foi a de sempre, a mesma de quase todos os times brasileiros, que jogam assim há décadas, até hoje, de bolas longas, de chutões, de zagueiros encostados à grande área, de enormes espaços entre os setores, de predomínio de lances e de estocadas individuais e isoladas e de pouquíssima troca de passes. O atual Flamengo escancarou esse atraso.

A Alemanha fez o contrário. Tinha três jogadores no meio-campo, excelentes, Kroos, Schweinsteiger e Khedira, que não erravam passes e tinham o controle do jogo e da bola, além dos dois meias pelos lados, que voltavam até o meio-campo. Eram cinco contra um. O time alemão, compacto, defendia e atacava em bloco.

Felipão colocou a culpa no apagão. No dia seguinte, o supervisor Parreira leu uma carta carinhosa e solidária de uma torcedora, Dona Lúcia.

Faltam ao jornalismo esportivo brasileiro três investigações aprofundadas. A primeira, sobre os detalhes de uma reunião que teria ocorrido, em Brasília, entre o ditador Médici e os diretores da CBD, que culminou com a dispensa de João Saldanha do comando da seleção brasileira, antes da Copa de 1970. O segundo mistério, se Ronaldinho, na Copa de 1998, teve uma convulsão ou um problema psicológico (piti ou piripaque). A terceira, se a carta e Dona Lúcia realmente existiram ou se foram uma invenção de Parreira. 


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*Cronista esportivo, participou como jogador das Copas de 1966 e 1970. É formado em medicina.

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