Ações da Prevent integram corrente de efeitos lógicos da campanha de
Bolsonaro contra a ciência
Nada do horror que tem acontecido
foi engano ou acaso
Janio de Freitas, Folha de S. Paulo
A
monstruosidade do programa de assassinatos nos hospitais do plano de saúde Prevent
Senior não é uma aberração. Vê-la como tal é aliviante para o
horror e a indignação difíceis de suportar. Mas não é verdadeiro. Aplicar falsos
tratamentos para induzir a morte de quem buscou e pagou por
socorro não é um desvio enlouquecido nos costumes, na moralidade mediana ou
mesmo na violência já brutal.
As
antimedicações e a falsificação da causa de mortes, combinadas pela Prevent,
integram a corrente de efeitos lógicos da campanha de Bolsonaro contra
as proposições da ciência para combate da Covid-19.
Assim como foi
a exclusão dos ministros Mandetta e Teich, como foram a recusa da
grande oferta de vacinas da Pfizer, a entrega da Saúde a um general
impensável, a recusa à compra de Coronavac, a produção de milhões de remédios
ineficazes no laboratório do Exército, as terríveis mortes por asfixia pela
falta de oxigênio em Manaus, e, além do mais, a continuada pregação da
medicação criminosa por Bolsonaro —isto, com testemunho do
plenário mundial da ONU.
Esses fatos
são decorrência direta da entrega da Presidência a Bolsonaro. Têm em comum a
contrariedade à salvação de doentes da Covid. Estão no núcleo do mais característico
em Bolsonaro, que é sua obsessão pela morte alheia, e na vocação que imprimiu
em seu governo destrutivo (apesar de mais usado, negacionista diz pouco,
sugerindo ideias, sem alusão às práticas ruinosas).
A nenhum
governante civil seria permitido sequer aproximar-se, ainda que só como ideia
de governo, de algo semelhante ao que a Bolsonaro e seus negocistas criminosos
é mais do que permitido: é até apoiado por metade dos empresários, pela maioria
dos deputados federais, pela porção ignara ou fanatizada da massa.
Sem Bolsonaro,
sem o esteio da cúpula do Exército e sem a aceitação de grande parte da riqueza
privada com seus servos políticos, a corrente trágica inflada pelos crimes
monstruosos da Prevent não seria possível.
Continua
possível, no entanto. Nada do horror que tem acontecido foi engano ou acaso. A
articulação eleitoral em torno da Lava Jato deu-se entre conscientes
do que significavam Bolsonaro, seu círculo e seu uso do poder.
A mesma
combinação de fatores que levou ao horror começa a sua repetição. Os mesmos de
ontem querem outra vez fabricar um presidente à sua feição. Não permitem que a
escolha seja um processo natural, espontâneo, cultural, do exercício político
da democracia.
Fatos como a CPI da Covid no
Senado, a exibição ali do palhaço extremista Hang,
de numerosos criminosos do negocismo com o governo e, sobretudo, o desvendar de
tantos horrores de desumanidade são, também, aproveitável ironia.
Essa desgraça
nacional vem a ser mais do que oportuna para acabar com a fantasia de um país
de gente afável, de índole pacífica, generosa. Se assim fomos um dia —e não
fomos—, na atualidade não somos. Ou desde muito, na maior escravatura
ocidental, nos morticínios de populações como em Canudos, na esquecida guerra
do Contestado, no vencido Paraguai, na favelização, no genocídio incessante dos
invadidos habitantes originais desta terra.
O Brasil
atual é o mesmo de sempre e é outro.
Veja:
Mais do que nunca vale o diálogo sem preconceitos https://bit.ly/3kbDHqq
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