As 9 acusações contra Bolsonaro no relatório da CPI - e a
manobra governista para tentar blindá-lo
Leandro Prazeres, BBC Brasil
Após o relatório da CPI da Covid no Senado acusar o
presidente Jair Bolsonaro de nove crimes durante a pandemia, um senador da
bancada governista tentou uma manobra para "blindar" o chefe do
Executivo e impedir que o documento sugerisse o indiciamento de Bolsonaro.
A
manobra, porém, foi rechaçada pelo presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM).
"O presidente cometeu muitos crimes e vai pagar por eles", disse
Aziz.
A
manobra foi tentada pelo senador Marcos Rogério (DEM-RO) na sessão desta
quarta-feira (20/10), na sessão da CPI em que o relator, Renan Calheiros
(MDB-AL), leu o relatório que acusa o presidente de ter cometido nove crimes.
Em
evento no Ceará, após a leitura, Bolsonaro negou ter cometido qualquer
irregularidade: "Como seria bom se aquela CPI tivesse fazendo algo de
produtivo para o nosso Brasil. Tomaram tempo de nosso ministro da Saúde, de
servidores, de pessoas humildes e de empresários. Nada produziram, a não ser o
ódio e o rancor entre alguns de nós. Mas nós sabemos que não temos culpa de
absolutamente nada. Sabemos que fizemos a coisa certa desde o primeiro
momento".
Marcos Rogério fez um pedido a Aziz para que
o relatório não pudesse propor o indiciamento de Bolsonaro. Ele argumentou que,
na medida em que a Constituição Federal isentaria presidentes da República de
prestar depoimentos à comissões do Congresso Nacional, a CPI não teria
competência para propor o indiciamento de Bolsonaro.
"Se
este colegiado não tem competência sequer para ouvir o presidente da República
e investigá-lo por infração penal, obviamente não pode indiciá-lo. Não pode
imputar a ele a prática de infração", afirmou o senador.
Omar
Aziz, porém, negou o pedido de Marcos Rogério.
"Nenhum
cidadão está acima da lei e isso vale inclusive para o presidente Jair Messias
Bolsonaro […] O presidente vai ser investigado, sim, porque tem provas muito
grandes da conduta dele", afirmou o presidente da CPI.
Crimes contra humanidade e epidemia
O relatório final da
CPI da Covid no Senado sugere o indiciamento do presidente Jair Bolsonaro por nove
tipos de crimes diferentes entre eles: crimes contra a humanidade,
charlatanismo e epidemia. O documento foi divulgado nesta quarta-feira (20/10).
Além de Bolsonaro, o
relatório sugere o indiciamento de outras 65 pessoas e duas empresas. Entre os
citados estão ministros, ex-ministros, políticos como os filhos de Bolsonaro e
empresários.
Ao todo, Jair
Bolsonaro é acusado de nove crimes: epidemia, charlatanismo, incitação ao
crime, falsificação de documentos, uso irregular de verbas públicas,
prevaricação (quando um servidor pública deixa de agir diante de uma
irregularidade), crimes contra a humanidade, violação de direito social e crime
de responsabilidade.
O documento final
traz significativas diferenças em relação à versão entregue aos senadores do
chamado G7 (grupo majoritário da CPI) na terça-feira. Nele, Renan Calheiros
sugeria o indiciamento de Bolsonaro por mais dois crimes: genocídio e homicídio
qualificado.
A
imputação desses dois crimes ao presidente causou um racha no grupo e fez com
que o grupo se reunisse na noite de terça-feira com Renan. Parlamentares como
Alessandro Vieira (Cidadania-SE) afirmavam que haveria problemas técnicos em
classificar os atos de Bolsonaro como genocídio contra povos indígenas pois não
haveria indícios de que ele tomou ações direcionadas ao extermínio de povos
originários.
Ele
também questionava a possibilidade de enquadrar Bolsonaro no crime de homicídio
qualificado uma vez que o crime requer a identificação específica das vítimas.
Ao
final da reunião, Renan cedeu à pressão do grupo e retirou do seu relatório as
imputações de genocídio e homicídio qualificado contra o presidente.
Na
manhã desta quarta-feira, Renan Calheiros explicou que fez a troca atendendo ao
pedido dos parlamentares.
"O
genocídio não foi retirado, foi trocado por mais um indiciamento de crimes
contra a humanidade [...] Nós nos rendemos aos argumentos técnicos do senador
Alessandro Vieira", afirmou.
Ele
será indiciado por crimes contra a humanidade na questão da Prevent Senior, de
Manaus e dos povos indígenas. O que foi retirado foi o crime de homicídio.
Ainda
segundo o relator, ele pede o indiciamento de Bolsonaro por crimes contra a
humanidade em três episódios: os estudos e tratamentos à base de medicamentos
sem eficiência comprovada pela operadora de saúde Prevent Senior, na condução
da crise de saúde em Manaus e nas ações voltadas aos povos indígenas.
Entre
os demais nomes, estão os três filhos mais velhos de Bolsonaro, o senador
Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ), o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e
o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ). Eles são acusados de incitação
ao crime por terem incentivado o descumprimento de medidas sanitárias.
O
relatório também sugere o indiciamento de ministros como Walter Souza Braga
Netto (Defesa), Marcelo Queiroga (Saúde) e Onyx Lorenzoni (Secretaria-Geral da
Presidência da República). Ex-ministros como Eduardo Pazuello (Saúde) e Ernesto
Araújo (Relações Exteriores) também estão no documento.
O
relatório foi elaborado por Renan Calheiros ao longo dos seis meses de trabalho
da comissão. Depois de lido, o documento precisa ser votado pelos integrantes
da CPI. Se aprovado, o relatório, depois, será encaminhado à Procuradoria Geral
da República (PGR) e outras instâncias do Ministério Público, que ficará
responsável por instaurar ou não processos baseados no relatório.
Em
entrevista à BBC News Brasil, Renan confirmou que irá apresentar uma denúncia
contra Bolsonaro no Tribunal Penal Internacional (TPI), em Haia, na Holanda.
Veja: Congresso aponta rumos para
salvar o Brasil da crise https://bit.ly/3m3IpbJ
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