Racismo estrutural
Ainda temos amarras estruturais no atual sistema econômico, que não
valoriza o trabalho e consequentemente despreza o valor de milhões de
trabalhadores que constroem tudo que vemos ao nosso redor
José Bertotti*
Dois fatos terríveis chamam a atenção pela sua crueldade e torpeza, o espancamento até a morte de Moise Kabagambe (imigrante Congolês assassinado no Rio de Janeiro), e o assassinato de Durval Teófilo Filho, morto ao chegar em casa do trabalho com três tiros desferidos por seu vizinho, todos dois negros e trabalhadores. Não podemos mais ignorar que existe uma grave distorção na construção da nossa nação relacionada ao racismo, oriundo certamente do processo de ocupação feito a ferro e fogo pelos colonizadores que continuamente, após o processo de dizimação dos povos originários, arrastaram a força milhões negros da África para serem escravos aqui no Brasil e que até hoje sofrem as consequências desses atos brutais.
Mesmo após a abolição da escravatura e da Constituição Brasileira outorgar o reconhecimento aos povos originários, indígenas e quilombolas da propriedade de suas terras como forma de perpetuar suas culturas e tradições que fazem parte da identidade e da cultura do povo brasileiro, ainda temos amarras estruturais no atual sistema econômico, que não valoriza o trabalho e consequentemente despreza o valor de milhões de trabalhadores que constroem tudo que vemos ao nosso redor. O salário-mínimo constitucional que deve manter uma família provendo todos os seus bens e serviços, está estabelecido em R$ 1.212,00 para o ano de 2022. O teto do funcionalismo público, pago com os impostos recolhidos do recebedor de salário-mínimo está definido em R$ 39.200,00. Os juros do cartão de crédito pago pelo recebedor de salário-mínimo, passa de 300% anuais e transforma o setor financeiro brasileiro em um dos mais lucrativos do mundo, quando esse setor deveria financiar a produção econômica.
Fatos como esse me lembram de uma conversa que tive tempos atrás com meu querido amigo Eufrásio Elias, hoje com 98 anos, um histórico militante do PCdoB, reconhecido por seu compromisso na luta por infraestrutura urbana para o seu Bairro, foi Presidente da Associação de Moradores da Mustardinha. Isso lhe deu prestígio para numa disputa no voto e ser eleito Conselheiro Tutelar. Nessa época entre 2001 e 2008 eu trabalhava na Prefeitura da capital pernambucana, na construção da estrutura municipal do Sistema Único de Assistência Social do Recife, da qual faziam parte todos os Conselhos Tutelares, distribuídos nas seis regiões político administrativas de Recife (RPAs).
Um certo dia, tratando das demandas diárias, resolvi perguntar para Eufrásio qual sua impressão do trabalho que ele vinha desenvolvendo. A resposta foi surpreendente, ele me disse, “você sabe que sou um homem do povo, nossa vida nunca foi fácil. Temos visto ao longo da vida muitas dificuldades e problemas dos mais variados tipos, mas ao me deparar com problemas concretos que envolvem situações de espancamento, exploração sexual, falta de condições mínimas de habitabilidade das casas das famílias das crianças que sou chamado para verificar in loco a violação de seus direitos, eu chego à conclusão de que somente o socialismo pode trazer soluções duradouras.”
Penso que Eufrásio já nos adiantava a solução que precisamos para esses que são problemas estruturais, no qual incluo o racismo como um dos problemas explicitados na profunda desigualdade social, perpetrada pelo sistema capitalista que tem uma necessidade intrínseca de constante acumulação de riquezas na mão de poucos. Riqueza essa transferida da imensa massa de trabalhadores que colocam em movimento toda a economia. O socialismo pode ser sim uma alternativa, com experiências bem-sucedidas no passado e no presente, como demonstra hoje a China com sua economia baseada no socialismo de mercado, país que ao mesmo tempo que se torna a maior economia do mundo em 2022, consegue eliminar a pobreza e a fome de sua sociedade e ainda dá exemplo de combate a Covid-19 e demonstra toda sua solidariedade para com os povos mais necessitados do mundo. Podemos e devemos abrir o debate para construção de um caminho próprio alternativo para o Brasil que se mostre viável para superar o capitalismo, pois esse sim já mostrou que deu o que tinha que dar.
O socialismo pode ser sim uma alternativa, como demonstra hoje a China com sua economia baseada no socialismo de mercado. É o que Elias Jabbour comenta no seu livro “China Hoje – Projeto Nacional Desenvolvimento e Socialismo de Mercado”.
*Secretário de Meio Ambiente de Pernambuco
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