Na cruzada contra as pesquisas, o capitão ladra
e o governo morde
Bolsonaro
usa a máquina para constranger e intimidar institutos antes do segundo turno
Bernardo de Mello Franco, O Globo
Após meses de ataques à Justiça Eleitoral, Jair Bolsonaro escolheu um
novo alvo: os institutos de pesquisa. A realidade impôs a mudança de discurso.
Afinal, ficaria difícil contestar as urnas que lhe deram 51 milhões de votos.
Na noite do primeiro turno, Bolsonaro começou a girar a metralhadora.
Disse que os institutos estariam “desmoralizados” e previu o fechamento de
empresas do setor. “Isso vai deixar de existir, até porque eu acho que não vão
continuar fazendo pesquisa”, provocou.
A declaração atiçou a tropa governista. O ministro Ciro Nogueira,
campeão de previsões furadas sobre a corrida presidencial, acusou os institutos
de errarem “criminosamente” contra o chefe. O ministro Fábio Faria incentivou
os eleitores de direita a boicotarem os próximos levantamentos. “Deixem dar
Lula 100 a 0”, ironizou.
No Congresso, o deputado Eduardo Bolsonaro começou a coletar assinaturas
para abrir uma CPI contra os institutos. O líder do governo, Ricardo Barros,
apresentou um projeto para punir com cadeia pesquisadores e estatísticos. O
presidente da Câmara, Arthur Lira, manobrou para acelerar a votação do texto.
Enquanto o capitão ladra, a máquina do governo morde. A mando do
ministro Anderson Torres, a Polícia Federal abriu inquérito para constranger e
intimidar diretores de institutos. Ontem o Conselho Administrativo de Defesa
Econômica instaurou outra investigação a pretexto de apurar se houve “conduta
coordenada entre as empresas”. O presidente do Cade foi indicado pelo ministro
Nogueira, que costuma se referir a ele como “meu menino”.
No fim da noite, o ministro Alexandre de Moraes suspendeu os dois
inquéritos para interromper o abuso de poder político.
Bolsonaro só gosta de um tipo de levantamento: aquele que confirma seus
desejos. Se dependesse dele, os eleitores só veriam os números do Paraná
Pesquisas, que mantém contratos milionários com o governo federal e com o PL.
A cruzada contra os institutos une dois traços do bolsonarismo: a
nostalgia da censura e a aposta na desinformação. O capitão gostaria de proibir
a divulgação de toda pesquisa que apontasse a liderança do adversário. Enquanto
ainda não consegue fazer isso, age para minar a credibilidade das empresas.
Os
ataques não são casuais. Bolsonaro precisa convencer seus seguidores de que é
vítima de um grande complô, que iria dos juízes em Brasília ao papa no
Vaticano. Se a mentirada não garantir sua vitória no dia 30, ele voltará a
contestar a urna eletrônica. [Ilustração: Gilmar]
Leia também: Razão e emoção no segundo turno https://bit.ly/3rNUTq9
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