13 outubro 2022

Qual polícia?

Que tipo de polícia o resgate do Brasil exigirá?

Quem é a delegada goiana, única policial de esquerda eleita para o Congresso. O que propõe diante do sequestro da segurança pública pela ultradireita. Por que mudança passa pelo combate ao racismo e nova relação com as comunidades
Adriana Accorsi em entrevista a Jeniffer Mendonça na
Ponte Jornalismo

 

Ponte mostrou, nesta terça-feira (5/10), que o número de policiais eleitos à Câmara dos Deputados aumentou para 37 nas eleições de 2022 em relação aos 25 que conseguiram uma cadeira no pleito de quatro anos atrás. Dentre eles, um nome se destaca pela divergência na posição ideológica e pelo partido: Delegada Adriana Accorsi (PT-GO). Ela é a única do campo da esquerda que se elegeu a deputada federal em relação aos colegas provenientes de legendas de extrema-direita e direita.

Não é novidade que, historicamente, existam menos policiais no espectro político que a delegada compartilha. Para uma perspectiva eleitoral, de acordo com levantamento do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, das 1.888 candidaturas de policiais e membros das Forças Armadas em todo o Brasil, 3,8% tinham posição de centro-esquerda e 1,4% de esquerda. De 56 policiais eleitos nas assembleias estaduais, cinco são de centro-esquerda: Delegado Inacio (PDT-AP), Delegada Gleide Angelo (PSB-PE), Delegada Martha Rocha (PDT-RJ), Leonel Radde (PT-RS) e Moisemar Marinho (PSB-TO).

“O Congresso já tinha uma composição extremamente de direita e eu acho que eles conseguiram se fortalecer para essa nova legislatura”, lamentou a delegada em entrevista à Ponte. “Ainda tem um resquício da ditadura militar que trouxe todo um pensamento de que a esquerda, os movimentos sindicais, são subversivos, que eles são contra o governo e que a polícia tem o dever de combater esses movimentos sociais e movimentos sindicais”, diagnostica.

“A gente também suscita um ódio maior dos extremistas de direita porque eles acreditam que é inadmissível uma pessoa ser policial e ser de esquerda, o que eu discordo totalmente. A segurança pública é um direito humano, é um direito das pessoas. É totalmente possível você ser policial e defensor dos direitos humanos, ser legalista, cumprir e defender a Constituição Federal.”

Antes de ser delegada, Adriana foi militante do PT desde cedo. Seu pai, o professor e ex-prefeito de Goiânia Darci Accorsi, foi um dos fundadores do partido no estado, o que, para ela, já trouxe uma consciência da condição da profissão enquanto classe trabalhadora, ponto que ela reforça ser essencial para dialogar com a categoria.

“É toda uma construção que a gente precisa refazer, de diálogo, de respeito à segurança pública como uma área imprescindível à vida das pessoas, de incluir os trabalhadores da segurança como classe trabalhadora. Isso tanto da parte da esquerda, mas também por parte dos próprios agentes de segurança pública se verem como classe trabalhadora”, afirma.

Há 23 anos da Polícia Civil, Adriana foi delegada-geral da corporação em 2011, ocupou a pasta da Secretaria Municipal de Defesa Social de Goiânia em 2013 e, no ano seguinte, foi eleita pela primeira vez deputada estadual, sendo a quinta mais votada entre os 41 que ocupam a assembleia. Está no segundo mandato e decidiu disputar a Câmara a fim de “ter mais influência para a gente ter uma segurança pública que proteja a vida das pessoas”. Entre os 17 deputados federais de Goiás, foi a sexta com a maior votação.

O estado é o terceiro com a maior taxa de letalidade policial por 100 mil habitantes em 2021, de acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública. A polícia de Goiás matou 8 pessoas por habitante no ano, atrás apenas de Amapá (17,1) e Sergipe (9), e próximo do Rio de Janeiro (7,8). Cerca de 30% de todas as mortes violentas no estado foram praticadas pelas polícias. Além disso, o atual governador Ronaldo Caiado (União Brasil), alinhado ao governo do presidente Jair Bolsonaro (PL), foi reeleito no 1º turno com 51,1% dos votos.

Ela aponta como positivo o aumento da bancada do PT na Câmara, de 54 para 68 deputados, mas se esquiva de pautas que colegas de partido, como o do investigador e vereador de Porto Alegre Leonel Radde, eleito a deputado estadual do Rio Grande do Sul, defendem, como a desmilitarização das polícias, e que a ideia é reforçar o diálogo e valorização profissional de outras formas. “Não há um radicalismo do plano de governo do presidente, do Partido dos Trabalhadores, dos partidos que compõem a coligação contra as forças de segurança ou desmonte de força de segurança”, sentencia.

Leia a entrevista.

Ponte — Você é a única policial no campo da esquerda que foi eleita entre os 37 integrantes vindos da segurança pública para o Congresso Nacional. Como vê esse resultado?

Delegada Adriana Accorsi — É de fato é um grande desafio. O Congresso já tinha uma composição extremamente de direita e eu acho que eles conseguiram se fortalecer para essa nova legislatura. Mas nós também nos mobilizamos. A esquerda também se mobiliza, o Partido dos Trabalhadores também conseguiu aumentar bastante a bancada [de 54 para 68] e, dentre essas vitórias, nós temos a nossa vitória no Congresso Nacional. Em âmbitos estaduais, outros policiais que venceram também, policiais da esquerda, como o Leonel Radde [do PT, na assembleia do Rio Grande do Sul]. É um movimento que existe e que vem se fortalecendo em todo o país.

Desde a ditadura militar, as forças de segurança brasileiras têm se identificado muito com o espectro de direita, contra as mobilizações de esquerda. Como [se a esquerda] fosse algo ilícito, algo subversivo, os próprios movimentos sindicais. E a gente vem trabalhando essa questão com uma visão de uma polícia cidadã, democrática, que defende os direitos das pessoas, né? De proximidade com o cidadão, comunitária. E tivemos várias experiências nesse sentido no Brasil, inclusive eu fui chefe da Polícia Civil de Goiás e também chefe da Secretaria de Defesa Social e chefe da Guarda Civil Metropolitana [de Goiânia].

Então a gente defende uma política de segurança pública democrática e defensora dos direitos humanos. Isso é perfeitamente possível e nós temos um movimento grande no Brasil. E eu vejo a minha vitória como vitória desse movimento, desse pensamento, e acredito que será uma grande luta no Congresso Nacional. De toda a forma, esse novo mandato de presidente, de deputados e deputadas, de parlamentares será uma grande luta porque o acirramento político no Brasil vai continuar. Mas eu acredito que a eleição do presidente Lula pode iniciar um processo de pacificação no país, de diminuição dessa política de ódio tão grande. E isso influencia na questão da segurança pública que tem um papel fundamental nessa paz social, de ter também instituições que trabalhem na garantia de direitos. Acho que esse é um grande diferencial que nós colocamos: entre os policiais que defendem o governo Bolsonaro e os policiais que defendem a democracia e um governo democrático.

Ponte — Inclusive, você sofreu ameaças durante a campanha deste ano, em agosto, nas redes sociais.

Delegada Adriana Accorsi — Isso. Na verdade, desde o início da ascensão desse movimento bolsonarista, eu tenho sido alvo de ameaças. Fui candidata a prefeita pelo Partido dos Trabalhadores aqui em Goiânia na capital de Goiás. Fui a terceira mais bem votada e fui ameaçada e a minha família também. Destaco que sou delegada há quase 23 anos e já fui ameaçada muitas vezes, mas nunca a minha família. As minhas filhas foram ameaçadas nesse contexto político de ódio que a gente vive. E a gente precisa trabalhar no sentido de superar essa política de tanto ódio, de morte, de desejar a morte das pessoas que pensam diferente da gente.

Ponte — Essas pessoas que fizeram ameaças já foram identificadas e responsabilizadas?

Delegada Adriana Accorsi — Nesse caso da ameaça direta às minhas filhas, sim, o processo inclusive encontra-se [em fase de] finalização, fase de julgamento final, e foi uma ação muito eficiente da polícia aqui em Goiás. Mas são inúmeros os casos, nem todos a gente tem como identificar. Eles acontecem nas redes sociais, acontecem diretamente. Não só eu, né? No Brasil todo, sobretudo mulheres que participam da política vem sendo alvos dessas ameaças, dessas agressões. É muito grave isso e a gente espera poder começar 2023 com uma política diferente.

Ponte — Nesse levantamento que fizemos sobre os policiais eleitos no Congresso, o presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública analisou que mudou o perfil desses policiais, que deixaram de ter uma pauta mais corporativista, sindicalista, para um alinhamento mais bolsonarista, pró-armas, pela ampliação do excludente de ilicitude. Como dialogar com os policiais nesse espectro e que pautas você defende em relação à segurança pública e aos policiais?

Delegada Adriana Accorsi — Eu concordo plenamente com essa com essa análise eu vi isso acontecer, por exemplo, com parlamentares aqui de Goiás, como o Delegado Waldir que não se reelegeu nessa última eleição e foi um dos fenômenos de votação em Goiás justamente por isso, desse alinhamento a um governo que retira direitos dos trabalhadores, que se desfaz do movimento sindical e das conquistas históricas trabalhistas e se afasta da defesa dos trabalhadores. A gente vê que o governo Bolsonaro na história toda do Brasil foi o que mais retirou direitos, prerrogativas, condições de trabalho, recurso pra segurança… De uma forma geral, é uma destruição de políticas públicas de segurança. E o armamento da população é justamente isso, é o contrário de política pública para a segurança, né? É dizer ‘não teremos políticas públicas de segurança, se você tiver como, você proteja aí sua família’, é justamente dizer que não terá política pública.

A nossa defesa é o contrário, é a defesa dos direitos dos trabalhadores, dos servidores e servidoras públicas. A previdência foi duramente afetada também depois do golpe contra a presidenta Dilma (PT) [a reforma da previdência foi proposta em 2016, sob Michel Temer (MDB), e sancionada em 2019, sob o governo Bolsonaro], com perdas para a grande maioria dos trabalhadores da segurança, sobretudo nós mulheres trabalhadoras da segurança. A defesa de salário digno, a defesa de políticas públicas de segurança pública, de prevenção. A gente vê que vai ser uma grande luta porque a gente acredita num país que protege o seu povo e numa polícia que não está em guerra com seu povo.

Muito importante a gente destacar o símbolo do aparelhamento das forças de segurança pelo governo Bolsonaro que foi o assassinato daquele homem jogado dentro da viatura [Genivaldo, em Sergipe, que morreu asfixiado, em maio, ao ser preso no porta-malas de uma viatura da PRF em que os policiais jogaram gás lacrimogêneo dentro]. A viatura é um símbolo do nosso trabalho, é um instrumento de trabalho na proteção da vida das pessoas e foi usada como a câmara de gás para matar um cidadão por trabalhadores da segurança. É a política do ódio e da morte que infelizmente levou também uma grande parte das forças de segurança para essa atuação desvirtuada da lei brasileira, da Constituição Federal, do próprio Código de Processo Penal e do Código Penal.

Esse alinhamento ao bolsonarismo é extremamente danoso para os nossos direitos, para os servidores públicos de uma forma geral. Se você verificar, por exemplo, todas as estruturas de fiscalização, como a fiscalização do combate ao trabalho escravo, do combate ao trabalho infantil, a extração de minérios, os danos dos crimes ambientais, todas essas estruturas de fiscalização que são aliadas da segurança pública também foram destruídas, foram desmontadas. É uma destruição de todas as políticas públicas que dizem respeito à proteção da nossa vida e isso que nos preocupa muito, principalmente, em haver a possibilidade de continuidade desse governo Bolsonaro.

Ponte — E que falta para que esse campo da esquerda se aproxime desses policiais? Pergunto porque as principais propostas nesse sentido versam sobre a desmilitarização…

Delegada Adriana Accorsi — Acredito ser um fenômeno complexo que nós temos estudado. Como eu disse, tem ainda um resquício da ditadura militar que trouxe todo um pensamento de que a esquerda, os movimentos sindicais são subversivos, que eles são contra o governo e que a polícia tem o dever de combater esses movimentos sociais e movimentos sindicais. É toda uma construção que a gente precisa refazer, de diálogo, de respeito à segurança pública como uma área imprescindível à vida das pessoas, de incluir os trabalhadores da segurança como classe trabalhadora. Isso tanto da parte da esquerda, mas também por parte dos próprios agentes de segurança pública se verem como classe trabalhadora. É todo um movimento que tem que ser feito e que vinha acontecendo.

Veja: Agora é que fica mais claro que foi uma tremenda demonstração de fraqueza https://bit.ly/3lRLcVT

Por exemplo, no governo presidente Lula, principalmente sob a coordenação do ex-secretário nacional de segurança Ricardo Balestreli [entre 2008 e 2010], nós tivemos um grande investimento na segurança, um grande investimento na capacitação, na estruturação das forças de segurança. Aqui, em Goiás, nós construímos nos governos do PT a mais bem estruturada Academia da Polícia Civil do país, que é a primeira escola superior da Polícia Civil. Tudo com recurso federal nos governos Lula.

Fizemos centros de tecnologia e videomonitoramento em todo o país. Investimos muito na polícia técnica, na prova pericial. Foi um investimento imenso na qualificação, na capacitação, na estrutura da segurança pública e, infelizmente, nesse momento de acirramento político, acredito que o bolsonarismo capturou, a partir de pautas morais, muita fake news e muita mentira, essa maior parcela das forças de segurança, sobretudo os militares. Talvez uma seja uma parcela única de trabalhadores que não teve tantas perdas, né? Os militares, o Exército principalmente, foram beneficiados nesse governo, mas as demais forças de segurança, não. E eu acho que a gente precisa retomar esse diálogo.

Essa pauta da desmilitarização não está no plano de governo do presidente Lula. Isso não faz parte. Eu fiz parte desse diálogo. Existem algumas pessoas que levantam essa questão. Mas essa não é proposta do presidente Lula. A proposta é investimento nas forças de segurança, é qualificação, é combate ao racismo institucional, uma intensificação da necessidade de sermos legalistas, de sermos os guardiões e defensores da Constituição Federal.

É um plano de governo de muita qualificação e valorização dos trabalhadores para que possam prestar um bom trabalho. E uma proposta de alinhamento nacional com as políticas públicas de segurança, com um investimento muito grande nas políticas sociais, de geração de emprego e renda, que têm um impacto verdadeiro na prevenção da violência, se a gente estudar as políticas de segurança no mundo todo. O combate à impunidade, a prevenção à violência doméstica. São muitas propostas nesse sentido. A desmilitarização não está no plano de governo do presidente Lula. Não há um radicalismo do plano de governo do presidente, do Partido dos Trabalhadores, dos partidos que compõem a coligação contra as forças de segurança ou desmonte de força de segurança.

Ponte — Pergunto sobre isso porque o próprio Leonel Radde, agora deputado eleito pelo PT, defende e existe um movimento de Policiais Antifascismo que reivindica…

Delegada Adriana Accorsi — Tem pessoas que defendem, mas não está no plano de governo do presidente Lula. Eu, por exemplo, acredito que nós precisamos discutir isso mais profundamente. Eu defendo a valorização dos trabalhadores da segurança, qualificação, o Sistema Nacional de Segurança Pública, tanto no que se refere aos recursos ao salário dos trabalhadores, mas também às políticas públicas, né? Políticas de prevenção, políticas de qualificação, política de segurança pública comunitária, combate ao racismo institucional, combate ao preconceito social que muitas vezes permeia a nossa atuação. E, principalmente, políticas de uma ligação forte com a população, com as comunidades, das forças de segurança.

Ponte — A sua militância no PT vem antes de entrar na polícia. O que a fez ingressar na carreira policial?

Delegada Adriana Accorsi — Eu sou filha de fundadores do Partido dos Trabalhadores. Professores que vieram das comunidades eclesiais de base. Começo a minha atuação política e social na Pastoral da Juventude, que luta pelos direitos das crianças, adolescentes e jovens no Brasil. Vou para o movimento estudantil onde também me destaquei. Fui cara pintada na época do impeachment do presidente Collor [1992]. Depois, eu consigo passar no concurso para policial civil, que era um sonho de infância. O que me moveu e o que me fez lutar por esse sonho de ser policial? Porque eu cresci numa comunidade muito carente, necessitada de políticas públicas sociais, de extrema vulnerabilidade social, onde a violência fazia parte do cotidiano das crianças, das mulheres e eu queria ser delegada para proteger as crianças.

Para proteger as crianças como as que estudavam comigo, como as que conviviam comigo que eram vítimas de violência tanto doméstica, violência urbana, violência institucional por não ter acesso à educação como eu tinha. Meus pais sendo professores, eu tinha uma condiçãozinha um pouquinho melhor. E conseguia ver, né? Que tinha amigos que não conseguiam estudar, que não tinham acesso a saúde não tinham uma moradia digna e por isso eu queria ser delegada.

Me tornei delegada e fui uma das primeiras chefes da uma das primeiras delegacias de proteção à criança e adolescente do Brasil. A primeira de Goiás onde trabalhei por uma década e tive destaque nacional. Dali, eu fui convidada para ser a primeira superintendente de Direitos Humanos [na Secretaria da Segurança Pública, em 2011] do estado de Goiás e depois a primeira delegada geral da Polícia Civil. Esse é o último estágio, último cargo que você pode chegar na instituição. Eu fui uma. Na época, só cinco mulheres no Brasil tinham conseguido alcançar esse cargo.

Veja: Bolsonaro, os militares e a democracia https://bit.ly/3NwQssg

Então, resolvi lutar de outra forma, continuar as minhas causas pelos direitos humanos, o combate à violência contra crianças e mulheres, a valorização das políticas sociais que eu acredito que tem uma ligação muito grande com combate à violência. Eu me candidatei a deputada estadual [em 2014] e fui a mulher mais votada de Goiás, a quinta entre todos, e fui reeleita em 2018. Fui candidata a prefeita [de Goiânia], em 2016, e eleita agora deputada federal mais votada do PT no estado. Então, para mim, a segurança pública é um espaço de defesa dos direitos humanos, é um espaço de garantia dos direitos das pessoas, em que o poder do Estado é usado para proteger as pessoas, sobretudo as pessoas que mais precisam.

Eu construí a minha a minha carreira policial nesse sentido e atuo assim como parlamentar. Meus projetos são todos nesse sentido de valorização das forças de segurança. Tive uma atuação muito grande agora para garantir a paridade quando o policial civil aposenta, que tinha sido retirado aqui pelo governo do estado e é alinhado ao governo Bolsonaro. Mas também ter criado delegacias especializadas no atendimento à mulher com meus recursos emendas da minha autoria e estão sendo construída em todo o estado. As salas lilás que é um espaço para atendimento das mulheres e meninas vítimas de violência.

Tenho feito emendas pra criar os espaços de depoimento especial das crianças vítimas de abuso, né? Em todos os municípios do estado. Então, a minha atuação é voltada para uma segurança pública cidadã e próxima das pessoas. E combato de forma veemente os desvios de autoridade, as ilegalidades das forças de segurança, os abusos de autoridade e combati de forma muito forte isso como chefe da Polícia Civil.

Ponte — E você não sofreu nenhum tipo de resistência por ser alinhada à esquerda dentro da polícia?

Delegada Adriana Accorsi — Para começar, a gente ser mulher dentro de força de segurança já é muita luta, sabe? As forças de segurança por muito tempo foram exclusivamente masculinas e existe uma ligação muito grande entre segurança ser força física e virilidade masculinas. Provar a minha competência no meio policial, assim como todas as outras mulheres policiais, é um grande desafio. E, além disso, ser de esquerda no estado de Goiás que é um estado coronelista mais alinhado à direita, onde a direita é muito forte, também se tornou um desafio muito grande.

Mas eu tenho respeito da maioria dos colegas aqui pelo meu trabalho como policial, pela minha luta como parlamentar pelos direitos desses trabalhadores, o que também é reconhecido. A gente também suscita um ódio maior dos extremistas de direita porque eles acreditam que é inadmissível uma pessoa ser policial e ser de esquerda, o que eu discordo totalmente. A segurança pública é um direito humano, é um direito das pessoas. É totalmente possível você ser policial e defensor dos direitos humanos, ser legalista, cumprir e defender a Constituição Federal.

Nós vamos conseguir demonstrar isso com o governo Lula que vai atuar na segurança pública de uma forma muito profunda, com muitas ações que vão unificar a atuação da segurança no país, junto com os governadores, com investimento, salário digno. O que começou a acontecer nos governos Lula, mas que foi tímido. E como em todo o mundo, essa pauta da segurança anda junto com os medos que as pessoas têm, e muitas vezes é capturada e sequestrada pelos movimentos de direita.

Nós podemos demonstrar que, por exemplo, o governo Bolsonaro não fez nada para a segurança das pessoas. Nenhuma política pública, nenhum investimento. O armamento da população é o contrário de uma política pública. A prova é o imenso aumento da violência contra as mulheres, que é um processo plenamente possível de ser controlado com políticas. Ao contrário, esse governo cortou todos os recursos para o combate à violência contra as mulheres e meninas, desmontou as políticas públicas que existiam e resultou nesse grande aumento da violência. Isso mostra como o governo Bolsonaro e a extrema-direita não tem competência nem capacidade de trabalhar por uma segurança pública melhor para a população.

Ponte — De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, Goiás foi o terceiro estado com a maior taxa de letalidade policial por 100 mil habitantes em 2021. Com a reeleição do governador Ronaldo Caiado (União), qual a sua perspectiva para os próximos quatro anos no estado?

Delegada Adriana Accorsi — Infelizmente Goiás reelege o governo Caiado, que tem também uma política alinhada ao governo Bolsonaro nas destruições de direitos dos trabalhadores, no corte de investimentos em políticas sociais e políticas relacionadas a educação. Por exemplo, no ensino médio foram fechadas escolas, não é feito concurso [para professores], foi retirado recurso da universidade estadual, que é a possibilidade dos filhos dos trabalhadores, das pessoas que vivem no interior do estado, fazerem o curso superior… É um governo que não investe no desenvolvimento do estado. Nessa questão da segurança, além da retirada de direito dos trabalhadores, a gente não vê um investimento nas políticas públicas de prevenção, de combate à violência contra mulheres, crianças, pessoas idosas.

Nós criamos aqui, com um projeto da minha autoria, o grupo especial de combate aos crimes de intolerância religiosa, de racismo e em relação à orientação sexual porque isso é gravíssimo em Goiás e nós conseguimos até agora criar só dois grupos em todo o estado. Eu destinei emenda para equipar essa delegacia. A gente vai continuar nessa luta e espero como deputada federal ter mais influência para a gente ter uma segurança pública que proteja a vida das pessoas.

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