Política cultural, processo permanente de construção
Marcelino
Granja*
Nos recentes debates sobre o
financiamento da cultura, aspecto fundamental da política cultural – como de
resto para qualquer política pública -, em meio a uma maioria de propostas que
entram no debate e sugerem caminhos, surgiram algumas ideias que, no meu
entendimento, podem ser consideradas como de negação do real.
Primeiramente, porque parecem
negar a crise do capitalismo e seus reflexos sobre a gestão dos governos. As
dificuldades do presente não passariam, então, da “falta de vontade política”.
Em segundo lugar, porque há uma
mistura de todos os tipos de problemas, entre momentâneos e crônicos. É preciso
analisar a história, perceber a evolução dos fenômenos e como os desafios estão
sendo enfrentados hoje. Não há como negarmos o legado fundamentalmente positivo
dos últimos dez/doze anos. O que precisamos é atualizar a pauta. Diante da
crise – que é real, sim! – o desafio é garantir as conquistas e nos prepararmos
para novo ciclo de crescimento que, mais dia, menos dia, virá!
E em terceiro, creio que devemos
evitar argumentos que parecem querer confundir ou encerrar a discussão, não
amadurecê-la. Aqui faço referência às ideias de que “não existe política
cultural”, ou de que “o financiamento do Estado à cultura é baseado em parcerias
privadas”, ou ainda de que “o entretenimento cultural é que pauta a política
pública”. Nada disto é verdade!
Hoje, não existe recurso privado
para a política cultural em curso no estado (não confundir com financiamento da
cultura em geral). Assim como não é o entretenimento – que sempre existirá e o
que devemos fazer é lutar pela sua qualidade de valores – que orienta esta
política.
Dizer que falta política cultural
hoje em Pernambuco é negar, por exemplo, o Funcultura, com apoio de R$ 40
milhões anuais à produção independente. É fechar os olhos para as Convocatórias
do Ciclo Carnavalesco e do São João que, historicamente, têm garantido a
presença da nossa cultura popular e a participação de uma esmagadora maioria
dos artistas pernambucanos nas festividades.
Na minha opinião, compartilhar
tais informações por tomá-las como verdade é negar conquistas importantes como
o Prêmio Pernambuco de Literatura, os editais do Ciclo das Paixões, os
novíssimos prêmios Ariano Suassuna de Cultura Popular e Dramaturgia e o Prêmio
Ayrton de Almeida Carvalho de Preservação Cultural. É negar a instalação do
novo Conselho de Preservação do Patrimônio Cultural e o processo em curso para
eleição do igualmente novo Conselho de Políticas Culturais, ambas instâncias
paritárias, de controle e participação social.
É não considerar o esforço que
estamos fazendo na busca por alternativas de financiamento à cultura, como
prova o debate em torno das mudanças do Sistema de Incentivo à Cultura. É
desconsiderar ações estruturantes, que não são meros eventos, que deixam marcas
na formação cultural da nossa gente, como o Festival de Cinema de Triunfo e o
Festival de Inverno de Garanhuns, por exemplo.
É diminuir a enorme conquista que
foi a aquisição, pelo Governo do Estado – em pleno cenário de crise financeira
-, dos equipamentos digitais de som e projeção do Cinema São Luiz.
É negar ainda a política estadual
de valorização dos nossos Patrimônios Vivos e a existência de uma agenda
permanente de ocupação dos nossos equipamentos culturais, como a Torre
Malakoff, o Teatro Arraial, a Casa da Cultura, o Museu do Trem, o Espaço
Pasárgada e tantos outros espaços que seguem abertos aos moradores e turistas.
Além, claro, de tantas outras ações governamentais que dialogam com as
políticas de Cultura, como as ações da Cepe Editora, do Programa de Artesanato
Pernambucano, do Cais do Sertão, entre outras.
Negar tudo isso é muito perigoso.
Compreendemos a Cultura como um espaço de luta pelo progresso social.
Desvalorizar o que temos, especialmente neste momento, é mais que uma tentativa
de impingir uma visão negativista, é perder a oportunidade de unir as forças
progressistas da sociedade num momento crucial da vida do Brasil. E isto, nós
que tanto lutamos pela cultura brasileira, não podemos deixar acontecer.
*Secretário
estadual de Cultura
Ilustração: olhardovale.com.br
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