Mídia, economistas e alienação sobre a crise do capitalismo
Oito anos após o seu início, a crise global continua sem solução,
aproxima-se de sua quarta onda de manifestação, mas o tema nem sequer é
considerado pelas instituições multilaterais do planeta.
Por Marcio Pochmann*, no
portal Vermelho
Segue
impressionante o grau de subordinação ideológica dos analistas e comentaristas
econômicos e da mídia em geral na produção e difusão de análises acerca do
curso atual da mais grave crise do capitalismo desde a década de 1930. Oito
anos após o seu início, a crise de dimensão global continua sem solução,
aproximando-se para a sua quarta onda de manifestação e sem que o tema nem
sequer seja considerado nas previsões das mais importantes instituições
multilaterais do planeta.
Aliás,
cegueira situacional – como a recentemente demonstrada pelo FMI – se mostra
imutável no tempo presente. Não foram capazes de prever a crise de global em
2008, muito menos as suas ondas subsequentes de manifestações. Agora, um
relatório daquela instituição sobre o panorama mundial para os anos de 2016 e
2017 atribui a culpa pela péssima situação econômica mundial ao Brasil e à
China, principalmente.
O grau
de alienação não tem limite. Não se pode esquecer que a primeira onda da crise
global se deu entre os anos de 2008 e 2009, tendo por origem a insolvência dos
contratos habitacionais (subprime) dos Estados Unidos. Até hoje não houve
correção significativas dos erros resultantes das políticas neoliberais de
desregulamentação adotadas naquele país e que foram ocasionadoras da própria
crise.
Abordagem
nesse sentido pode ser vista, por exemplo, tanto no livro de M. Lewis (The Big
Short, de 2010) como no filme de 2015 dirigido por A. McKay, A Grande Aposta
(ou A Queda de Wall Street, em Portugal).
Apesar
da gravidade dos fatos, praticamente nada de relevante mudou nas regras
especulativas do capitalismo, assim como as denominadas agências de risco
seguem vendendo avaliações de acordo com o perfil do comprador e, portanto,
distante da realidade (seria o Brasil um péssimo comprador das chamadas
avaliação de riscos por parte destas agências?).
Apesar
de mais de oito milhões de trabalhadores estadunidenses terem sido
desempregados, da queda significativa na renda salarial, do aumento da pobreza
e da desigualdade e da quebra em série de empresas e bancos desde 2008, Wall
Street continua a ser referenciada e dominante, inclusive na lógica partidária
estadunidense. Depois a mídia submissa estranha quando o senador Bernie
Sanders, o candidato socialista e opositor de Hillary Clinton no Partido
Democrata, avança com discursos críticos a Wall Street.
Para
além dos EUA, lembremos que a segunda onda de manifestações da crise global
transcorreu nos anos de 2011 e 2012, na Europa, frente à exposição das finanças
públicas degeneradas por ajudas aos setores privados combalidos, após estes
últimos entesourarem recursos públicos recebidos, sem reaplicá-los na produção.
Por
fim, a terceira onda, que envolve os Brics e vem desde 2015. Justamente eles,
que adotaram políticas anticíclicas na expectativa de que a crise capitalista
fosse de curta duração, conforme verificado na Rússia, China e Brasil.
No
Brasil, a sequência da política econômica de apoio com recursos públicos
"de pai para filho" não se mostrou suficiente para reanimar o
paciente do setor privado, motivando-o ao investimento produtivo. Pelo
contrário, a injeção de mais de 100 bilhões anuais de recursos públicos no
setor privado alimentou mais a especulação nos mercados financeiros e à
dependência à importação.
A
partir da decisão do banco central dos Estados Unidos, de recentemente retomar
a trajetória de elevação da taxa de juros, caminha-se para uma quarta onda de
manifestação da crise de dimensão global. O acelerador dessa crise permanece
sendo a enorme e crescente assimetria entre o ritmo dos ganhos do setor
financeiro, sem contrapartida na economia real.
Os
ativos financeiros não se constituem enquanto riqueza propriamente dita, sendo
muito mais um acesso à riqueza real. Esta discrepância se mantém dialeticamente
sob a grave ameaça de continuidade da própria trajetória do capitalismo neste
início do século 21.
* Professor do Instituto de Economia e pesquisador
do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho, ambos da Universidade
Estadual de Campinas.
Fonte: Rede Brasil Atual
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