PEC 11/2020: a revolução da erradicação da pobreza
infantil
Rogério Morais*
Os efeitos da pandemia afetam
diretamente o desenvolvimento infantil. Considerando o período da Primeira
Infância - do zero aos setenta e dois meses -, o tempo em quarentena é
substancial em qualquer dos cenários.
Aqui em Recife ainda não temos datas
para as medidas de relaxamento, no entanto, como fomos uma das primeiras
capitais a tomar as medidas de distanciamento, já estamos a mais de 35 dias em
quarentena.
O isolamento social é sob todos os
prismas a melhor estratégia. Não apenas sob o prisma sanitário ou econômico,
mas também no social. Quanto mais rápido entramos, quanto mais disciplina
tivermos, mais rápido sairemos e com menor impacto no atraso escolar, na
pobreza e na desigualdade.
Isto se torna mais importante, porque
uma boa parte das intervenções para minimizar os impactos durante a pandemia
terá efeitos limitados. As mensagens mais simples tendem a ser as mais
efetivas, diante do contexto das famílias em situação de vulnerabilidade
socioeconômica. A realidade nas periferias apresenta diversas restrições como
acesso à água potável, disponibilidade de internet e moradias pequenas;
portanto boa parte das orientações precisa ser customizada para ter aderência.
Melhores reações a períodos como este só serão possíveis se tivermos planos de
longo prazo para o desenvolvimento destas infraestruturas básicas. O retorno
pós-pandemia será fundamental para o combate às desigualdades. A retomada deve
ter no investimento social um dos seus pilares basilares.
Foi assim nos países que obtiveram
sucesso em processos semelhantes no pós-guerra. Assim, será um erro muito caro
para o Brasil se mantivermos um olhar de austeridade no campo econômico e não
percebermos que o melhor investimento é nas pessoas. Se investir na Primeira
Infância já era o melhor investimento que poderíamos fazer antes desta crise,
agora se torna um imperativo.
Para tanto, teremos que trabalhar para
inverter as pautas pré-pandemia que convergiam para a flexibilização dos gastos
constitucionais na educação e na saúde, revisando inclusive a PEC 95/2019, que
congela por 20 anos os gastos das despesas primárias do governo. Urge também um
novo olhar sobre a discussão do FUNDEB (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento
da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação), priorizando
uma maior participação da União e uma ponderação ainda maior para a Educação
Infantil. Propostas anticíclicas de controle da pobreza infantil também serão
importantes.
Neste sentido, a PEC 11/2020 surge
como uma nova prioridade. Inspirada em modelos do Reino Unido, Canadá e Nova
Zelândia, cria um fundo financiado pelos lucros dos bancos com a finalidade de
estabelecer um teto para o percentual de famílias com crianças que vivam em
extrema vulnerabilidade. Uma emenda que pode ser revolucionária se redistribuir
renda de forma mais efetiva do que o Bolsa Família, justamente pela capacidade
de proporcionar isso no começo da vida, no momento da maior janela de
oportunidade de desenvolvimento humano, a Primeira Infância. A PEC 11/2020
iniciou sua tramitação no Senado Federal neste mês de abril.
Ainda percorrerá um longo processo de
tramitação e certamente sofrerá ajustes, será melhorada, azeitada. Os bancos
não podem ser vistos como inimigos do sistema, mas, sem dúvida alguma, podem
colaborar para um equilíbrio que, no futuro, também eleva as taxas de
bancarização e renda, trazendo retornos aos negócios. Com recursos,
planejamentos de longo prazo e foco são elementos primordiais.
Aqui continuaremos fortes na
elaboração do Plano Municipal para a Primeira Infância do Recife, com prazo
decenal, de maneira a seguir esta trajetória. Neste momento, estamos compilando
as sugestões enviadas pela sociedade, através dos mais de dois mil
participantes da consulta pública digital. Considero, assim, um passo a frente
do Recife na reconstrução social pós-pandemia.
*Rogério Moraes é Secretário Executivo da
Primeira Infância na Prefeitura do Recife
[Ilustração: Portinari]
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