05 maio 2020

Caminho a explorar


PEC 11/2020: a revolução da erradicação da pobreza infantil
Rogério Morais*

Os efeitos da pandemia afetam diretamente o desenvolvimento infantil. Considerando o período da Primeira Infância - do zero aos setenta e dois meses -, o tempo em quarentena é substancial em qualquer dos cenários.
Aqui em Recife ainda não temos datas para as medidas de relaxamento, no entanto, como fomos uma das primeiras capitais a tomar as medidas de distanciamento, já estamos a mais de 35 dias em quarentena.
O isolamento social é sob todos os prismas a melhor estratégia. Não apenas sob o prisma sanitário ou econômico, mas também no social. Quanto mais rápido entramos, quanto mais disciplina tivermos, mais rápido sairemos e com menor impacto no atraso escolar, na pobreza e na desigualdade.
Isto se torna mais importante, porque uma boa parte das intervenções para minimizar os impactos durante a pandemia terá efeitos limitados. As mensagens mais simples tendem a ser as mais efetivas, diante do contexto das famílias em situação de vulnerabilidade socioeconômica. A realidade nas periferias apresenta diversas restrições como acesso à água potável, disponibilidade de internet e moradias pequenas; portanto boa parte das orientações precisa ser customizada para ter aderência. Melhores reações a períodos como este só serão possíveis se tivermos planos de longo prazo para o desenvolvimento destas infraestruturas básicas. O retorno pós-pandemia será fundamental para o combate às desigualdades. A retomada deve ter no investimento social um dos seus pilares basilares.
Foi assim nos países que obtiveram sucesso em processos semelhantes no pós-guerra. Assim, será um erro muito caro para o Brasil se mantivermos um olhar de austeridade no campo econômico e não percebermos que o melhor investimento é nas pessoas. Se investir na Primeira Infância já era o melhor investimento que poderíamos fazer antes desta crise, agora se torna um imperativo.
Para tanto, teremos que trabalhar para inverter as pautas pré-pandemia que convergiam para a flexibilização dos gastos constitucionais na educação e na saúde, revisando inclusive a PEC 95/2019, que congela por 20 anos os gastos das despesas primárias do governo. Urge também um novo olhar sobre a discussão do FUNDEB (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação), priorizando uma maior participação da União e uma ponderação ainda maior para a Educação Infantil. Propostas anticíclicas de controle da pobreza infantil também serão importantes.
Neste sentido, a PEC 11/2020 surge como uma nova prioridade. Inspirada em modelos do Reino Unido, Canadá e Nova Zelândia, cria um fundo financiado pelos lucros dos bancos com a finalidade de estabelecer um teto para o percentual de famílias com crianças que vivam em extrema vulnerabilidade. Uma emenda que pode ser revolucionária se redistribuir renda de forma mais efetiva do que o Bolsa Família, justamente pela capacidade de proporcionar isso no começo da vida, no momento da maior janela de oportunidade de desenvolvimento humano, a Primeira Infância. A PEC 11/2020 iniciou sua tramitação no Senado Federal neste mês de abril.
Ainda percorrerá um longo processo de tramitação e certamente sofrerá ajustes, será melhorada, azeitada. Os bancos não podem ser vistos como inimigos do sistema, mas, sem dúvida alguma, podem colaborar para um equilíbrio que, no futuro, também eleva as taxas de bancarização e renda, trazendo retornos aos negócios. Com recursos, planejamentos de longo prazo e foco são elementos primordiais.
Aqui continuaremos fortes na elaboração do Plano Municipal para a Primeira Infância do Recife, com prazo decenal, de maneira a seguir esta trajetória. Neste momento, estamos compilando as sugestões enviadas pela sociedade, através dos mais de dois mil participantes da consulta pública digital. Considero, assim, um passo a frente do Recife na reconstrução social pós-pandemia.
*Rogério Moraes é Secretário Executivo da Primeira Infância na Prefeitura do Recife
[Ilustração: Portinari]

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