Maioria
dos indicadores piora após 2 anos e meio de Bolsonaro e com pandemia
Economia, educação, saúde, social e
ambiente passam por retrocesso, e não houve avanço significativo em nenhuma
área; metade do período transcorreu sob a Covid-19
Transcrição
parcial de reportagem da Folha de S. Paulo
Dos
indicadores analisados pela Folha, 63 tiveram piora,
28 melhoraram e 10 permaneceram estáveis.
Metade
desse período transcorreu sob a pandemia de Covid-19 —que não teve a gestão
analisada por não haver parâmetros de comparação fora do atual governo—, mas já
era mais negativo do que positivo o saldo do primeiro ano sob
Bolsonaro, 2019, antes da chegada da doença.
Dos
12 indicadores de meio ambiente e das áreas social, agrária e indígena
analisados, 11 apresentaram piora. Os números mostram um cenário de destruição das florestas e de desmonte de órgãos responsáveis
pela fiscalização, em especial o Ibama.
A
política de paralisação da reforma agrária e de demarcação de terras indígenas
também foi uma tônica. O Incra não emitiu nenhum decreto de desapropriação de
terras e não houve terra indígena identificada, declarada ou homologada.
"Aumento do desmatamento, da grilagem de terras e do
garimpo ilegal. O governo tem combinado medidas administrativas com restrição
orçamentária, além de articulação com bancada ruralista e centrão, para aprovação
do desmonte dos direitos socioambientais", diz Alessandra Cardoso,
assessora política do Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos).
Aumentaram
também a desigualdade e a pobreza, apesar do pagamento de auxílio emergencial.
"Quando saiu do auxílio pleno para a suspensão [no
início de 2021], a pobreza foi triplicada. O auxílio atual, menor, não
compensou toda contração trabalhista", afirma Marcelo Neri, diretor do
centro de estudos FGV Social.
Dois dos principais programas sociais do governo passaram
por momentos de esvaziamento. Um deles, o Minha Casa Minha Vida, foi rebatizado
de Casa Verde e Amarela e abandonou o seu cerne, que era subsidiar até 90% do
valor da casa própria para famílias de baixa renda.
O Bolsa Família, que foi criticado por
Bolsonaro durante boa parte de sua carreira, voltou a ter fila de
espera e sofreu com restrição orçamentária. Atualmente, voltou a superar a casa
dos 14 milhões de famílias atendidas e, sob o nome Auxílio Brasil, está em fase
de reformulação.
No
recorte econômico, os levantamentos do início do governo mostravam equilíbrio,
mas agora o quadro é de deterioração —33 indicadores pioraram e 20 melhoraram.
Parte
do desempenho é explicado pela pandemia, com fechamento de empresas, aceleração
do desemprego e alta no endividamento das famílias. Ao mesmo tempo, o governo
foi forçado a adotar medidas emergenciais, o que impactou as contas públicas.
Tudo
isso em meio à alta da inflação, com disparada dos preços dos combustíveis e da
cesta básica.
Diretora
da IFI (Instituição Fiscal Independente, ligada ao Senado), a economista Vilma
da Conceição Pinto afirma que a análise fica parcialmente nublada pela
pandemia, mas ressalta que há pontos críticos, como desemprego, já alto antes
da pandemia, e a inflação. Ela ressalta que o governo não tem conseguido
cumprir normas fiscais sem propor alterações, mesmo que temporárias, das
regras.
“A
condução da política fiscal do governo nesses anos foi um pouco aquém daquilo
que o próprio governo propôs e não houve grande avanço no ajuste fiscal”,
disse.
Do
lado positivo, houve melhora na balança comercial e forte expansão da Bolsa de
Valores de São Paulo.
Na
marca de seis meses de governo, em 2019, o então subsecretário do ministério
Vladimir Kuhl Teles havia afirmado que a economia mostraria sinais positivos
com medidas como a reforma da Previdência, aprovada naquele ano, o acordo
comercial entre Mercosul e União Europeia, o programa de
barateamento do gás natural e as privatizações.
Dois
anos depois, nenhuma estatal foi privatizada, o acordo com a União Europeia
está travado e o novo marco regulatório do mercado de gás ainda não resultou no
prometido "choque de energia barata".
Economista-chefe
do Credit Suisse Brasil e colunista da Folha, Solange Srour afirma
que o governo assumiu em um cenário de lenta recuperação econômica e
pró-reformas estruturantes. A partir da pandemia, no entanto, a batalha passou
a ser para evitar contrarreformas.
Ela
defende uma retomada sustentada, com reformas, zelo com os gastos públicos,
revisão de despesas e reforço de programas sociais. No entanto, diz, governo e
Congresso sinalizam outra direção.
“Não
estamos discutindo uma reforma administrativa séria, uma reforma tributária que
vai trazer progressividade, estamos indo para um caminho que vai ser restritivo
para a atividade porque trará falta de confiança e aumento de juro real.”
Na saúde,
o balanço considerou indicadores usados em momentos anteriores sobre
estrutura da rede e alguns serviços, além de informações sensíveis a questões
de assistência, caso da mortalidade materna e mortes prematuras por doenças
crônicas, com dados recentes. Destes, 5 indicadores apresentam piora, 2 estão estáveis
(com sinais de alerta) e 2 têm melhora.
Apesar
de ter havido aumento no número de médicos na atenção básica, houve redução no
número de agentes comunitários de saúde e queda no número de atendimentos nesse
nível de atenção à saúde.
Outro
ponto que chama a atenção são novas quedas na
taxa de cobertura vacinal de rotina para crianças, revertendo um
cenário de melhora em 2018.
"Conseguimos
uma boa cobertura vacinal quando as pessoas vão até unidades básicas e equipes
trazem pessoas para vacinar. Se tem uma redução, isso quer dizer que o sistema
pode não estar chegando às pessoas", afirma Adriano Massuda, pesquisador
da FGV Saúde.
Na
atenção especializada, os dados mostram aumento no número de leitos
hospitalares e de UTI, situação que mostra a capacidade de expansão do sistema
em momentos de crise.
Um
dos dados mais alarmantes refere-se ao aumento no número de mortes maternas,
por complicações durante a gravidez, parto ou pós-parto. Só de janeiro a abril
de 2021 ocorreram casos que representam quase 50% do total de 2020.
Os
registros indicam fatores além da Covid, aponta Fátima Marinho, especialista
sênior da Vital Strategies, que monitora esses dados. "É uma piora imensa.
Isso mostra um problema de assistência."
Massuda
concorda. "A pandemia exacerba fragilidades do sistema."
O
Ministério da Educação foi palco de grandes turbulências e Bolsonaro já está
com seu terceiro ministro. O pastor Milton Ribeiro manteve o perfil ideológico
de seus antecessores (Ricardo Vélez Rodriguez e Abraham
Weintraub) e também a falta de liderança dos rumos da educação.
Dos
13 indicadores analisados, 8 apresentaram piora.
Estados
e municípios, que concentram as matrículas, não contaram com apoio federal para
a manutenção do ensino remoto ou para o retorno seguro às escolas. Ações para
infraestrutura das escolas não ocorreram.
Em
2020, a educação representou 5,2% dos gastos totais do governo —era de 6% em
2018.
A
redução geral do orçamento atinge também a educação básica, elencada como
prioridade do governo. Em 2020, a etapa teve pior orçamento em uma década, com
a redução de investimentos para construção de creches e ampliação do tempo
integral.
Sob
Bolsonaro, a meta do Plano Nacional de Educação de ter ao menos 25% das
matrículas da educação básica em tempo integral até 2024 fica mais distante.
Esse percentual caiu para 13% no ano passado -- em 2015, era 18%.
Lucas
Hoogerbrugge, do Movimento Todos pela Educação, ressalta que os governos
estaduais e municipais também têm sua parcela, mas destaca a responsabilidade
federal.
"O
governo Bolsonaro não tem projeto para a educação brasileira, e as pautas do
MEC, como o ensino domiciliar [única matéria legislativa prioritária para o
governo neste ano], estão muito longe daquilo que é importante para melhorar
acesso e equidade na educação", diz. A aposta em escolas cívico-militares
também é vista como ineficaz diante dos desafios educacionais.
A
queda de orçamento também atinge o ensino superior. O ProUni e o Fies vivem
fortes reduções. O Enem, principal porta de entrada para a universidade, teve o menor
número de inscritos desde 2005.
A
área de segurança tem como maiores responsáveis os estados, mas o governo
buscou protagonismo ao patrocinar o Em Frente Brasil, um choque de segurança
pública em cinco cidades violentas, piloto que seria expandido para todo o
país, mas que fracassou.
Os
homicídios voltaram a subir em 2020, assim como a letalidade policial, isso em
plena pandemia. Houve ainda explosão no registro de armas nas mãos de civis.
"Continuam
os problemas de violência, mais armas em circulação e um investimento muito
maior do governo em flexibilizar o controle de armas do que implantar políticas
de segurança pública mais eficientes", diz a diretora-executiva do
Instituto Sou da Paz, Carolina Ricardo.
Veja:
Uma breve palavra sobre nossa conversa com o ex-presidente
Lula https://bit.ly/3kbDHqq
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