Renda média atinge menor nível em quase 10 anos nas metrópoles do Brasil
Quadro reflete
desempenho frágil do mercado de trabalho, dizem pesquisadores
Leonardo Viecele, Folha de S. Paulo
No
segundo trimestre de 2021, a renda domiciliar per capita do trabalho foi
estimada em R$ 1.326 nas regiões metropolitanas, uma baixa de 0,1% em relação
aos três meses anteriores.
Um
valor inferior a esse só foi verificado no começo da série histórica do estudo,
no primeiro trimestre de 2012: R$ 1.323.
O
boletim utiliza microdados da pesquisa Pnad
Contínua, do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
A renda domiciliar per capita corresponde ao rendimento total do trabalho
dividido pela quantidade de pessoas em cada residência.
Os
números levam em conta a inflação e
refletem apenas os ganhos com atividades profissionais. Ou seja, recursos de
benefícios sociais, como auxílio emergencial e aposentadorias, não entram no
cálculo.
O
estudo é produzido em parceria entre PUCRS (Pontifícia Universidade Católica do
Rio Grande do Sul), Observatório das Metrópoles e RedODSAL (Observatório da
Dívida Social na América Latina).
Na visão dos responsáveis pela pesquisa, os dados deixam
claro que a atividade econômica e o mercado de trabalho ainda não ganharam a tração desejada nas regiões metropolitanas. O segundo trimestre de 2021
foi o sexto consecutivo de queda na média de rendimentos.
Conforme
o boletim, os mais pobres
perderam mais renda, em termos relativos, durante a pandemia. Nessa
camada, até houve um esboço de melhora nos últimos trimestres, mas ainda
distante de reverter completamente os prejuízos da Covid-19.
Os mais ricos,
por sua vez, tiveram uma perda menor de rendimento ao longo da crise. Porém, ao
contrário dos mais pobres, continuam registrando baixa nos ganhos do trabalho.
Em
conjunto, esses fatores acabaram resultando em um rendimento baixo, na média
geral, para os padrões da série histórica.
No
segundo trimestre de 2021, a renda dos 40% mais pobres foi estimada em R$ 177
nas regiões metropolitanas. O valor até representa uma alta de 7,5% frente aos
três meses imediatamente anteriores (R$ 165).
A
marca, contudo, está 22,1% abaixo do patamar do primeiro trimestre de 2020. À
época, a pandemia ainda não impactava tanto o mercado de trabalho.
Já
os 10% mais ricos viram o rendimento médio cair 2,6% entre o primeiro e o
segundo trimestre de 2021, para R$ 6.430. A perda de renda em relação ao começo
do ano passado foi de 8,3% –inferior à dos mais pobres.
Entre
os 50% intermediários, o rendimento subiu 2,4% entre o primeiro e o segundo
trimestre deste ano, para R$ 1.254. No entanto, ainda está 5,1% abaixo do
começo de 2020.
O
professor do programa de pós-graduação em Ciências Sociais da PUCRS André
Salata, um dos coordenadores do boletim, chama atenção para o quadro dos mais
pobres. Uma crise prolongada como a do coronavírus, aliada à recuperação lenta
da renda, pressiona
principalmente quem tem menos recursos, sublinha o professor.
“A
retomada da renda dos mais pobres tem sido muito tímida. As reservas deles vão
se esgotando com o passar do tempo, e a situação vai
ficando mais grave.”
O
pesquisador do Observatório das Metrópoles Marcelo Ribeiro, que também coordena
o estudo, vai na mesma linha. Segundo ele, o mercado de trabalho ainda não dá
sinais de melhora consistente.
Isso
faz com que os trabalhadores, especialmente os mais pobres, busquem
“estratégias de sobrevivência”, como os populares bicos, diz Ribeiro.
Essas
tarefas até podem elevar a renda de quem ganha menos, como ocorreu no segundo
trimestre, mas não criam condições para uma recuperação robusta nos
rendimentos.
“O
aumento da renda no segmento mais baixo não se dá pela reativação da economia.
Está mais vinculado à necessidade dessas pessoas, que precisam construir
estratégias de sobrevivência”, afirma Ribeiro.
O boletim contempla 22 metrópoles brasileiras. O maior rendimento
médio foi registrado na região metropolitana de Florianópolis (R$ 2.129), e o
menor, na Grande São Luís (R$ 699).
O
estudo ainda traz dados sobre a desigualdade na
renda do trabalho medida pelo Coeficiente de Gini. O indicador
varia de zero a um.
Quanto
mais próximo de um for o índice, maior é a desigualdade de renda do local em
questão. Quanto mais próximo de zero, mais igualitária é a divisão da renda.
No
conjunto das metrópoles, a média de Gini recuou de 0,632 para 0,626 entre o
primeiro e o segundo trimestre deste ano. Contudo, permaneceu acima da
verificada no início de 2020: 0,610.
Isso
significa que a desigualdade ficou maior durante a pandemia. Segundo os
responsáveis pelo estudo, o recuo no trimestre mais recente só ocorreu porque a
renda dos mais ricos seguiu em baixa, enquanto a dos mais pobres teve uma
elevação, ainda insuficiente.
“O
cenário ideal seria de crescimento para todos, com aqueles na base da pirâmide
ganhando mais”, aponta Salata.
“A
desigualdade até recuou no último trimestre, mas a renda média também ficou
menor”, completa Ribeiro.
.
Veja: Quem semeia o caos colhe o quê? https://youtu.be/yLfPBPiRBik
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