Mais de 60
entidades acusam “impropriedade jurídica” no veto de Bolsonaro ao PL da
dignidade menstrual
Bolsonaro vetou distribuição
gratuita de absorventes alegando falta de previsão orçamentária e violação à
autonomia das instituições de ensino
Cintia Alves, Jornal GGN
Mais de 60 entidades que lutam pela criação de uma política pública que garanta a dignidade menstrual no Brasil assinam um manifesto que repudia e acusa “impropriedades jurídicas” no veto de Jair Bolsonaro ao PL 4.968/2019. Aprovado pela Câmara e Senado, o projeto de lei tinha como objetivo a distribuição gratuita de absorventes menstruais para mulheres e pessoas que menstruam. Bolsonaro barrou a medida alegando não haver previsão orçamentária e por suposta violação à autonomia das instituições de ensino.
“As razões
apresentadas pelo Presidente da República para o veto não se sustentam e sua
derrubada, pelo Congresso Nacional, é medida que se impõe”, diz a nota.
“A alegação de que a
criação do Programa em referência conflita com a Lei de Responsabilidade Fiscal
– a Lei Complementar nº 101/2000, é absolutamente descabida. Os artigos 2º, §
2º e 6º do PL nº 4.968/2019 preveem, de modo expresso, as fontes de custeio que
farão frente às despesas públicas decorrentes da criação do Programa. Além
disso, o relatório apresentado pela Comissão de Defesa dos Direitos da
Mulheres da Câmara dos Deputados apresentou a estimativa do impacto
orçamentário financeiro da medida, em plena observância dos dispositivos da Lei
de Responsabilidade Fiscal.”
“A previsão de
distribuição gratuita de absorventes por instituições de ensino não conflita
com a autonomia de tais estabelecimentos, pois se trata de medida de saúde
pública e preservação da dignidade da pessoa humana, que prefere à eventual
interesse da administração pública em particular”, acrescentaram.
“É inaceitável que o Brasil não possua uma medida
pública sequer para combater a situação de pobreza menstrual que afasta
meninas, mulheres e outras pessoas que menstruam do ambiente escolar e de
atividades laborais”, defenderam.
O projeto beneficiaria mulheres e demais pessoas
que menstruam, as estudantes de baixa renda matriculadas em escolas públicas;
as pessoas em situação de rua; em situação de vulnerabilidade social extrema; e
apreendidas e presidiárias, recolhidas em unidades do sistema penal ou
internadas em unidades para cumprimento de medida socioeducativa. O PL ainda previa
a inclusão dos absorventes higiênicos como item essencial das cestas básicas.
POBREZA MENSTRUAL TAMBÉM É QUESTÃO RACIAL
No manifesto, as entidades apontam que meninas
negras são as mais atingidas pela pobreza menstrual, “sendo essas as que mais
sofrem com os impactos acumulativos da ausência das demais políticas públicas,
políticas essas que poderiam impactar positivamente a saúde menstrual, como o
acesso à água, a saneamento básico, à coleta de lixo e à energia elétrica”.
“Este cenário torna o problema ainda mais agudo ao
dificultar o acesso à educação para a população negra, além de repercutir em
uma imobilidade social ainda mais exacerbada para um grupo já fortemente
oprimido, que vivencia, de forma histórica, condições sanitárias que
intensifica, ainda mais, o estado de vulnerabilidade social e economicamente. A
pobreza menstrual também é, de fato, uma questão racial.”
A carta ainda frisa que ter acesso a absorventes é
essencial para dignidade humana. “A ausência de políticas públicas que
assegurem a distribuição gratuita desses bens a mulheres e pessoas que
menstruam em situação de vulnerabilidade social e econômica ofende valores
constitucionais básicos: a integridade física é colocada em risco, na medida em
que se valem de substitutos inadequados para a contenção do fluxo menstrual,
como miolo de pão, jornal e tecidos.”
EVASÃO ESCOLAR
No Brasil, ao menos quatro entre 10 estudantes
deixam de frequentar a escola em razão da falta de acesso a produtos de higiene
menstrual. Como resultando, perdem, por ano, em média, 45 dias de aula. De
acordo com o estudo “Pobreza Menstrual no Brasil: desigualdade e violações de
direitos”, divulgado pelo Unicef e pelo UNFPA, mais de 4 milhões de estudantes
frequentam colégios com estrutura deficiente de higiene, como banheiros sem
condições de uso, sem pias ou lavatórios, papel higiênico e sabão.
Desse total, quase 200 mil meninas e mulheres não
contam com nenhum item de higiene básica no ambiente escolar e 713 mil não têm
acesso a nenhum banheiro (com chuveiro e sanitário) em suas casas.
O PL é de autoria da deputada Marília Arraes e foi
relatado por Natália Bonavides. Foi aprovado na Câmara em agosto de 2021, com a
criação do Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual. Ato contínuo, em
setembro, foi aprovado no Senado, para garantir a “oferta gratuita de
absorventes higiênicos femininos e outros cuidados básicos de saúde menstrual”.
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Veja: A caminho de conflitos incontornáveis https://bit.ly/3E1XhhF
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